Foi com um projecto pensado durante a pandemia que Jan Kamensky fez das fotografias das ruas vazias da sua cidade natal, Hamburgo, a sua tela branca e redesenhou um espaço público pensado para os peões e ciclistas. Em vez de sons de buzinas surge o chilrear dos pássaros e no lugar de semáforos estão árvores É assim que o designer gráfico alemão ilustra nas suas animações, o processo da transformação das cidades em lugares mais sustentáveis. Agora, em visita a Lisboa, o “utopista visual” quer ajudar os lisboetas a pensar em “soluções para o futuro”.
Sempre com entusiasmo e uma ponta de humor, Jan Kamensky coloca aspectos locais que sejam facilmente reconhecidos pelos habitantes das cidades por onde passa. Num vídeo da cidade de Múrcia, em Espanha, o designer gráfico colocou limões - considerados um símbolo de saúde - na animação a rodopiar para dentro da cena. As reacções das pessoas foram positivas e, na sua opinião, tornaram-se mais receptivas às ideias que queria transmitir à população espanhola.
A oportunidade de visitar Lisboa surgiu após um convite feito pelo colectivo Lisboa Possível, constituído após uma manifestação na Avenida Almirante Reis, em Outubro de 2021, e da associação Zero, que se quis juntar à parceria. Assim, estas duas entidades contribuíram para as despesas do designer gráfico que irá realizar uma animação com uma zona da capital como plano de fundo. Neste projecto pretende-se abordar várias questões: criar uma zona de interacções sociais e espaços verdes, onde se pode repensar a mobilidade, tendo como prioridade os peões e as pessoas com mobilidade reduzida, que são várias vezes esquecidas nas medidas implementadas nas cidades, refere o designer.
Reflectir sobre a prioridade da mobilidade na cidade
Como bom exemplo a seguir, menciona a Lei da Mobilidade de Berlim, implementada em 2018. Aqui, os transportes públicos, as bicicletas e os peões têm prioridade sobre os automóveis. Relativamente aos transportes públicos, há uma maior oferta de serviços para viagens de grande distância e os preços são mais baixos, o que torna a mudança para este meio de deslocação mais fácil e acessível a todos.
No entanto, “em Lisboa, o que se verifica, é o oposto. Os carros têm prioridade”, analisa Ksenia Ashrafullina, uma das responsáveis pelo movimento Lisboa Possível. E, por isso, Jan Kamensky apela a uma mudança do mindset das pessoas. Na sua primeira passagem por Lisboa, o designer reconhece que é urgente a capital repensar o seu futuro. “A baixa da cidade é barulhenta” e, como explica, o silêncio é importante para que exista um espaço de reflexão e harmonia. Por essa razão, o som é outro componente importante nas suas animações. Por isso tenta auxiliar o público a imaginar uma cidade sem o barulho sonoro que os veículos provocam.
O objectivo da Lisboa Possível, da Zero e de Jan é de que “os líderes pensem globalmente”. Com a realização do vídeo e a criação de uma realidade alternativa, esperam que os autarcas da Câmara Municipal vejam a animação como um exemplo a seguir, “tomem iniciativa” e inspirem outros países. Por outro lado, apontam que a animação que irá ser realizada em Lisboa tem uma “qualidade intercontinental'’, porque as ruas dos diversos países têm mais em comum do que diferenças. Portanto, afirmam que o trabalho realizado a nível local tem um impacto global. “As cidades grandes funcionam como um role model que inspiram os restantes lugares”.
Sobre o feedback que tem recebido nas redes sociais, o designer afirma que a maioria das reacções tem sido positiva. Mas refere a necessidade de sair “da bolha” dos seus seguidores, de forma a receber mais críticas construtivas que ajudam a melhorar a qualidade do seu trabalho.
Para já, as opções ainda estão em aberto enquanto Jan Kamensky conhece os cantos e recantos de Lisboa, em visita guiada pela Ksenia. Um dos locais mencionados ao PÚBLICO foi a Praça Marquês de Pombal, por ser uma zona importante da cidade, facilmente reconhecida por todos, o que facilita a tarefa de “envolver vários grupos de pessoas” nesta nova visão. O resultado será depois publicado no canal de Vimeo e no site do designer.
Texto editado por Ana Fernandes