Kherson: onde fica e porque é que Rússia e Ucrânia a consideram estratégica?
Ucrânia diz já ter reconquistado 44 localidades na região, que garante acesso ao mar Negro, alberga portos importantes e é relevante para a produção agrícola.
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A Ucrânia diz estar em marcha um contra-ataque para reconquistar a região ocupada de Kherson, que foi uma das primeiras a ser tomadas pela Rússia na actual guerra.
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Onde fica Kherson?
Situada no Sul da Ucrânia, na margem direita do Dnieper, Kherson é a última cidade antes de o rio desaguar no mar Negro, a sensivelmente 25 quilómetros de distância. É também a capital de uma vasta região ucraniana que engloba ambas as margens do rio e faz fronteira com a Crimeia, anexada pela Rússia em 2014, e com as regiões de Mikolaiv e Zaporijjia, esta última actualmente sob controlo russo em grande parte.
Kherson começou por ser uma fortaleza construída pelo Império Russo no século XVIII para proteger a saída para o mar Negro, mas foi crescendo em importância e população devido ao seu porto e à indústria de construção naval, que ainda hoje são fundamentais para a economia regional. Em 2021, a cidade tinha aproximadamente 290 mil habitantes.
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Porque é que a conquista de Kherson foi importante para a Rússia?
Todo o Sul da Ucrânia, desde Odessa até Lugansk, pertenceu ao Império Russo e depois à república soviética da Ucrânia. No discurso com que lançou a “operação miliar especial” contra o país vizinho, Vladimir Putin referiu-se aos “territórios históricos” da Rússia na Ucrânia e lamentou o “desabamento do país unido” que era a União Soviética, em 1991.
Este contexto histórico colocou Kherson no caminho das forças russas logo nos primeiros dias da invasão, em Março, quando os soldados saíram da Crimeia e procuraram dirigir-se para Mikolaiv e Odessa, sem contudo terem conseguido até agora tomar qualquer uma dessas cidades.
Kherson tornou-se então uma base importante para o lançamento de ataques militares russos nas redondezas. O controlo da região deu à Rússia o controlo sobre a desembocadura do rio Dnieper, que atravessa toda a Ucrânia (passa junto a Kiev, Dnipro e Zaporijjia) e é uma via de transporte comercial e civil fundamental para o país. Além disso, o rio é navegável por embarcações militares não muito profundas.
A conquista da cidade e da região permitiu igualmente tomar o controlo sobre um extenso canal que abastece a Crimeia de água potável – e cujo fluxo tinha sido interrompido depois da anexação da península.
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Porque é que a reconquista de Kherson é importante para a Ucrânia?
As circunstâncias em que se deu a queda de Kherson, ao fim da primeira semana de invasão, são consideradas suspeitas por muitos ucranianos e este foi um dos poucos assuntos que levaram a oposição a criticar Volodymyr Zelensky em tempo de guerra. A elite política do país acredita que agentes russos e colaboracionistas foram responsáveis por actos de sabotagem que facilitaram o avanço russo.
Reconquistar Kherson teria, assim, uma importância simbólica de demonstração das capacidades militares ucranianas e aumentaria o moral entre os soldados.
Mas há questões mais práticas a considerar. A Ucrânia só tem actualmente acesso a um grande porto marítimo no mar Negro, o de Odessa, e a reconquista de Kherson permitir-lhe-ia retomar o controlo sobre dois portos que antes da guerra movimentavam cerca de três milhões de toneladas de carga por ano. Além disso, a região é um importante centro de produção agrícola no país, com cerca de dois milhões de hectares cultiváveis onde se plantam uma variedade de cereais (trigo, centeio, aveia, cevada), girassóis, soja e outros produtos fruto-hortícolas.
É também em Kherson que se situam as maiores centrais de produção de energia solar e eólica da Ucrânia, bem como a barragem de Nova Kakhovka, cuja central hidroeléctrica é uma das maiores do país, com uma potência instalada de 357 MW (para comparação, é o dobro da de Castelo de Bode).
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O que está a acontecer no terreno?
A Ucrânia anunciou em meados de Julho que estava a preparar um contra-ataque à região de Kherson e até agora terão sido recuperadas 44 localidades. Com os repetidos ataques de artilharia à ponte Antonovskii, as forças ucranianas terão conseguido deixar inutilizável ou pelo menos a precisar de grandes reparações a única travessia rodoviária entre Kherson e a outra margem do Dnieper. Nesse caso, as forças russas na cidade ficam praticamente isoladas, sendo bastante mais complicado receberem reabastecimentos ou reforços de soldados.