Ainda não é Agosto e já se vêem muitas árvores a deixarem cair as suas folhas secas como se fosse Outono. Será natural que este fenómeno aconteça tão cedo? “Não é normal que as árvores percam a suas folhas nesta altura do ano, como tem sido observado nas nossas avenidas e ruas”, responde ao PÚBLICO um grupo de investigadoras do Instituto Superior de Agronomia da Universidade de Lisboa. E está a acontecer por causa da seca e das temperaturas muito elevadas.
Por norma, as árvores de folha caduca só perdem as folhas no Outono, por envelhecimento das folhas – é um processo a que se chama “senescência”. “É um processo lento, ligado à diminuição da duração do dia e à produção de hormonas”, explicam as investigadoras Maria da Glória Esquível, Paula Baptista Santos e Maria da Conceição Caldeira.
Mas, este ano, o fenómeno está a acontecer cedo e é “bem visível”. As três investigadoras têm reparado nesta queda de folhas precoce e dizem que já o têm notado há algum tempo. Nota-se sobretudo em árvores caducifólias, como os plátanos e os bordos. “Estas árvores são muito comuns nas avenidas e ruas das nossas cidades e, como têm muitas folhas, a sua perda torna-se notória”, dizem. Além das cidades, também se tem observado “queda de folhas abundante e precoce” no campo e em árvores que não têm folha caduca, como o sobreiro.
Portugal tem atravessado períodos de temperaturas muito elevadas e todo o território continental está em seca porque choveu menos de metade do normal durante o Inverno. Nestas condições, “a coluna contínua de água, que circula nos vasos condutores (xilema) desde as raízes até às folhas, é quebrada”, esclarecem as investigadoras. É um fenómeno a que se dá o nome de “cavitação” e “é uma espécie de embolia, em que a entrada de ar nos vasos condutores interrompe o transporte de água”.
Como as folhas são estruturas muito sensíveis, morrem mais cedo. Esta queda de folhas precoce pode também representar perigo para as árvores. “O crescimento da árvore cessa mais cedo, acumula menos reservas nutricionais”, explicam. “E se a secura levar à cavitação pode ocorrer morte da parte afectada ou da totalidade da árvore.”
Queda de folhas cada vez mais precoce
Com as alterações climáticas e com episódios de seca e de ondas de calor a tornarem-se mais frequentes, é expectável que este fenómeno se torne “mais recorrente no futuro”, referem ainda as investigadoras especialistas em fisiologia vegetal.
Não é novidade que muitas árvores morrem por causa do calor e da escassez de água. “A mortalidade de árvores tem sido observada em muitas regiões e em várias espécies de árvores devido à seca e às temperaturas elevadas”, notam as investigadoras Maria da Glória Esquível, Paula Baptista Santos e Maria da Conceição Caldeira. E acrescentam: “A morte resulta principalmente pela cavitação que bloqueia o transporte de água na árvore, havendo paragem na transpiração, e desidratação dos tecidos das árvores.”
As três investigadoras do Instituto Superior de Agronomia referem também que a árvore poderá ter um benefício ao deixar cair as suas folhas porque a transpiração se faz pelos estomas, os pequenos poros que existem nas folhas. Quanto menos folhas, menos transpira e menos água se perde. “Por outro lado, ao perder as folhas, deixa de produzir os açúcares em quantidade, pela fotossíntese, para as partes mais jovens da árvore em crescimento e para as raízes”, dizem.
Como a queda das folhas devido ao stress hídrico é muito rápida, “não há tempo para que haja reciclagem de nutrientes” das folhas secas que caem, “havendo paragem no crescimento e menor acumulação de reservas nas raízes”.
O investigador Jorge Marques da Silva também tem notado que as árvores têm perdido as suas folhas mais cedo numa espécie de “Outono prematuro” – mesmo não conhecendo as causas exactas, reparou que o fenómeno começou ainda antes desta última onda de calor. Quando estão em stress, as árvores podem entrar em senescência e deixar cair as folhas, explica o investigador do BioISI (Instituto de Biossistemas e Ciências Integrativas) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL). Estando em stress hídrico por causa da seca, deixam cair as folhas para que não transpirem tanto e assim possam guardar o resto da água de que dispõem, refere.
Mas o que tem acontecido agora não tem a mesma causa do que faz cair as folhas no Outono: “O que faz com que as folhas fiquem amarelas e caiam no Outono é a diminuição de temperaturas, por um lado, mas é sobretudo a diminuição do tempo do dia e das alterações na qualidade da luz”, refere Jorge Marques da Silva. Como é Verão e os dias ainda são grandes, uma possibilidade para este fenómeno precoce é que as árvores tenham tido um choque significativo causado pelo stress térmico ou pelo stress hídrico, o que provocou a queda das folhas.
As árvores conseguem detectar a seca a partir das raízes. “Quando sentem o solo muito seco, emitem determinadas hormonas que partem das raízes e sobem até à folha e provocam a chamada abcisão da folha, que é a queda”, diz o professor no Departamento de Biologia Vegetal da FCUL. Em algumas espécies, é uma resposta para tentar evitar a desidratação.