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Associação Zero considera “escandalosa” proposta do Governo de “simplex” ambiental

A associação alerta que estas opções vão permitir que muitos projectos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) se concretizem “sem que sejam avaliados os seus impactes, privilegiando uma visão de curto prazo em detrimento do bem comum do país”.

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A apresentação do "simplex" ambiental foi feita esta quinta-feira, no Jardim Botânico de Lisboa Rui Gaudêncio

A associação ambientalista Zero considera “escandalosa” a proposta do Governo de dispensar a avaliação de impacte ambiental nalgumas circunstâncias e considera que com as novas regras se retrocede décadas na política ambiental. “Com a apresentação do ‘Simplex’ na área ambiental, o Governo prepara-se para retroceder décadas na política ambiental, fazendo tábua rasa dos valores fundamentais que a política ambiental e o instrumento da avaliação de impacte ambiental visam proteger”, refere a Zero em comunicado.

Na quinta-feira, o Governo aprovou um “Simplex” para o ambiente que prevê o fim da avaliação de impacte ambiental para a modernização de linhas férreas ou projectos de loteamento e a dispensa do licenciamento para a reutilização de esgotos tratados. Para a associação ambientalista, com estas decisões, “o mote é: ‘Garantir que o deferimento tácito funciona.”

“A proposta agora apresentada para o Simplex ambiental pretende sacrificar os desígnios da sustentabilidade em prol de um deferimento tácito de processos de licenciamento e de autorizações que apenas defendem interesses de promotores para daí retirar ganhos eleitorais?”, pergunta a Zero.

A associação questiona também o facto de estas propostas resultarem de um grupo de trabalho “onde estiveram presentes aqueles que directamente mais beneficiarão destas alterações à legislação vigente”, sem que tenha sida garantida a presença das organizações não-governamentais de ambiente, sublinhando que tal “demonstra a cultura democrática e de transparência do actual Governo”.

“O Governo está a fazer com a Avaliação Ambiental, aquilo que fez com a conservação da natureza e a protecção da biodiversidade. Desinvestiu, deixou que os procedimentos se burocratizassem para depois ter argumentos de desvalorização deste instrumento, ao contrário de o credibilizar, valorizar e modernizar”, refere a nota.

A associação alerta ainda que estas opções vão permitir que muitos projectos do Plano de Recuperação e Resiliência se concretizem “sem que sejam avaliados os seus impactes, privilegiando uma visão de curto prazo em detrimento do bem comum do país”.

Diz igualmente que este “ataque” à avaliação de impacte ambiental “demonstra desrespeito pelos valores que esta procura salvaguardar (...). A avaliação de impacte ambiental é o mais importante instrumento de política ambiental. É preventivo e participativo. Permite adoptar medidas de protecção ambiental previamente à realização de projectos, melhorar o seu desempenho ambiental e envolver o público interessado”

Entre os vários “atropelos” que aponta às opções anunciadas na quinta-feira, a Zero aponta “a reificação do deferimento tácito”, o retirar a Avaliação de Impacte Ambiental dos processos de loteamento, a redução dos prazos para emissão de pareceres e licenças, o facto de as licenças ambientais serem validadas automaticamente e a “eliminação da participação de entidades e verificadores nos procedimentos ambientais”.

“Essencialmente, o Governo considera aceitável que a verificação por uma terceira parte, por exemplo, do reporte feito por empresas sujeitas ao regime de prevenção e controlo integrada de poluição, seja facultativa. A justificação apresentada é que ‘a utilização de entidades acreditadas significa um custo para as empresas’. Inacreditável!”, lamenta a associação. A Zero considera igualmente que o processo se torna “pouco transparente e participado”.

“Não deixa de ser extraordinário que uma proposta desta natureza tenha sido preparada com o contributo dos interesses privados que dela irão usufruir, mas com a exclusão daqueles que representam o bem comum. Claramente uma nota negativa neste domínio”, afirma.

No que respeita a alguns aspectos a que foi dado relevo na apresentação de quinta-feira, a associação refere que há componentes em que provavelmente estará de acordo, nomeadamente com o facto de a instalação de centrais solares passar a ter por critério a área ocupada em vez da potência.

“Há, porém, que avaliar a dimensão em causa e se há diferenciação entre áreas sensíveis e não sensíveis como actualmente, e acima de tudo a ameaça de termos diversos projectos uns ao lado dos outros, todos eles sem avaliação de impacte ambiental”, alerta.