Primeiro-ministro do Sri Lanka ordena aos militares que façam “o que for preciso para restaurar a ordem”
Chefe de Estado fugiu num avião militar e promete formalizar demissão em breve. Manifestantes que protestam nas ruas da capital há vários meses entraram no gabinete oficial do primeiro-ministro, exigindo a sua demissão.
O primeiro-ministro do Sri Lanka declarou o estado de emergência em todo o país, esta quarta-feira de manhã, depois da notícia de que o Presidente cingalês, Gotabaya Rajapaksa, fugira num avião militar para as Maldivas. A multidão que se foi formando à volta do gabinete oficial do primeiro-ministro, Ranil Wickremesinghe, que está a tomar decisões na qualidade de Presidente interino, acabou por conseguir invadir o seu complexo, em Colombo.
Os manifestantes exigem agora a demissão do chefe do Governo, que também prometera abandonar o cargo.
Segundo os correspondentes da BBC, os polícias que protegiam o edifício foram atacados com pedras e garrafas, e temia-se uma repetição do que aconteceu no último sábado, quando milhares de manifestantes invadiram o palácio presidencial. Pelo menos 30 pessoas ficaram agora feridas junto ao gabinete do primeiro-ministro, diz a agência de notícias NewsWire. Centenas de manifestantes ocuparam ainda a sede da televisão nacional pública e as instalações de uma rádio.
De acordo com a Al-Jazeera, Wickremesinghe “nomeou um comité com os três comandantes das Forças Armadas, e com o ministro da Defesa, encarregando-o de restaurar a lei e a ordem”. Ao mesmo tempo, ordenou às forças de segurança que façam “tudo o que for preciso” para travar os protestos. A jornalista Minelle Fernandez explica que isto está a “alarmar as pessoas, que não percebem a legitimidade com que Wickremesinghe está a tomar estas decisões”.
O presidente do Parlamento diz que foi Rajapaksa a nomear o primeiro-ministro como Presidente interino, na sua ausência, mas a população quer ver uma carta oficial de demissão do chefe de Estado.
Rajapaksa, de 73 anos, fugiu do país na madrugada desta quarta-feira num avião militar, a partir do principal aeroporto de Colombo. Segundo a Reuters, estava acompanhado pela mulher e por dois guarda-costas, e partiu em direcção às Maldivas, sendo ainda desconhecido o seu destino final.
A fuga do Presidente do Sri Lanka põe fim à influência da família Rajapaksa no país, depois de o seu irmão, Mahinda Rajapaksa, ter sido forçado a demitir-se em Maio passado.
No meio de uma situação potencialmente explosiva, com milhares de pessoas nas ruas a desafiarem o estado de emergência declarado pelo actual primeiro-ministro e Presidente interino, ainda não é certo que a transição de poder aconteça de forma constitucional.
Segundo a lei, para que o presidente do Parlamento possa começar a formar um Governo provisório, é preciso que o Presidente Rajapaksa lhe envie a carta de demissão oficial. Os media do país dizem que a carta já foi redigida, mas que só será entregue quando Rajapaksa chegar ao seu destino final.
Os protestos no Sri Lanka começaram em Março e agravaram-se nos últimos dias, forçando os dois principais líderes do país a anunciarem a demissão.
Com uma economia assente no turismo e dependente de empréstimos e investimentos externos, o Sri Lanka afundou-se com a pandemia de covid-19 e com a invasão da Ucrânia pela Rússia. A inflação oficial chegou aos 55% em Junho e as estimativas apontam para uma taxa de inflação de 70% nos próximos tempos — uma crise que começa a ser comparada ao colapso da economia do Líbano nos últimos anos.
Agora, a crise política pode dificultar ainda mais as negociações para novos empréstimos do Fundo Monetário Internacional e de países como a China e a Índia.