Escolha do novo director executivo do Mecanismo Europeu de Estabilidade adiada para Setembro

Com a desistência do candidato italiano, o ex-ministro das Finanças, João Leão, é agora o favorito na corrida pelo cargo ocupado pelo alemão Klaus Regling. Mas nem o apoio da Itália, França e Espanha é suficiente: para a eleição é preciso o acordo da Alemanha.

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Nem João Leã, nem o luxemburguês Pierre Gramegna, conseguiram os votos necessários para a eleição, esta segunda-feira. Rui Gaudencio

Os ministros das Finanças da zona euro adiaram para Setembro a escolha do próximo director executivo do Mecanismo Europeu de Estabilidade (ESM, na sigla em inglês), depois de nenhum dos dois candidatos finais ao cargo — os ex-ministros das Finanças de Portugal e do Luxemburgo, João Leão e Pierre Gramegna — ter conseguido obter os votos necessários para a eleição, esta segunda-feira.

“São ambos excelentes candidatos, os dois têm muitos apoios, mas nenhum conseguiu atingir a fasquia dos 80% necessários e por isso voltaremos ao assunto em Setembro”, informou o presidente do Eurogrupo, Paschal Donohoe, no final de uma reunião extraordinária do conselho de governadores do ESM, em Bruxelas, convocada para tentar concluir o processo de substituição do Klaus Regling, que conclui o seu mandato no próximo dia 7 de Outubro.

“Não há problema nenhum, eu continuarei a trabalhar por mais três meses”, minimizou o alemão, que dirige o organismo responsável pela emissão de dívida europeia nos mercados para financiar os programas de empréstimos concedidos a países em dificuldades (sucedeu ao Fundo de Estabilização Financeira Europeu, que geriu os programas de resgate a Portugal, Grécia, Irlanda e Espanha) desde a sua criação, em 2012.

Esta foi a terceira vez que os ministros das Finanças da zona euro, que por inerência compõem também o conselho de governadores do ESM, não conseguiram obter o consenso necessário para a selecção do próximo director executivo. Em Maio, perfilaram-se quatro candidatos ao cargo, entre os quais João Leão.

Entretanto, o processo de selecção tornou-se uma corrida a dois, opondo um candidato do Sul contra o veterano candidato do Norte, Pierre Gramegna, que no final de 2017 já tinha perdido para Mário Centeno a presidência do Eurogrupo (e outra vez em 2020, para o irlandês Paschal Donohoe).

O antigo secretário de Estado das Finanças dos Países Baixos, Menno Snel, retirou-se do processo após a primeira discussão entre os ministros, depois de ficar claro que não dispunha de apoios suficientes. Esta segunda-feira, foi a vez do candidato avançado pela Itália, Marco Buti, que foi director-geral dos Assuntos Económicos e Financeiros da Comissão Europeia até ser chamado para chefe de gabinete do comissário da Economia, Paolo Gentiloni.

Com a desistência de Buti, a Itália confirmou que apoiava João Leão, que assumia assim o favoritismo, uma vez que a candidatura de Portugal contava com o voto da Espanha e da França. À entrada para a reunião do Eurogrupo, o ministro das Finanças, Fernando Medina, salientava o “conjunto importante de apoios” à candidatura “forte” apresentada por Portugal, quer “pelo mérito de João Leão” como também “pelo reconhecimento do país”.

O desempenho de Leão como nas Finanças, como responsável político pelo desenvolvimento da estratégia orçamental desde 2015 e como o ministro que conseguiu a maior descida da dívida pública nas últimas décadas, foi um dos argumentos invocados por Portugal para defender a candidatura do ex-governante. Lisboa destacou ainda o rigor de João Leão na aplicação das regras orçamentais, lembrando que em 2021 o défice nacional ficou nos 2,8% do Produto Interno Bruto, bem abaixo dos 4,3% projectados por Bruxelas.

Mas o acordo de três das maiores economias da zona euro (e três principais accionistas do ESM) não foi suficiente para garantir a eleição de João Leão, que precisa ainda de ganhar o apoio da Alemanha para poder ocupar o cargo. Segundo o PÚBLICO apurou, o ex-ministro das Finanças foi o candidato mais votado, com 55,3%, contra 47,7% do candidato luxemburguês.

Como explicou Fernando Medida, a eleição assenta num modelo “muito sensível”, em que é preciso compatibilizar o apoio dos países numa chave de distribuição de votos em função do capital que cada um subscreve no ESM: só com 80% do capital é declarado um vencedor. “É uma fasquia muito elevada e que exige um diálogo muito intenso entre os vários membros da zona euro”, considerou.

O presidente do Eurogrupo acredita que esse diálogo, que vai prosseguir nas próximas semanas, produzirá um bom resultado e um dos dois “excelentes candidatos” que restam será o escolhido em Setembro — Donohoe afastou o cenário de apresentação de uma terceira candidatura para ultrapassar o impasse na votação.

O ESM tem um chamado “poder de fogo”, isto é, uma disponibilidade para empréstimos, na ordem dos 410 mil milhões de euros. O Mecanismo utiliza as garantias dadas pelos Estados-membros para obter nos mercados os fundos que depois são disponibilizados aos países da zona euro que estejam a ter dificuldades em financiar-se autonomamente.

Em discussão entre os membros da zona euro está um possível reforço do papel do ESM, com a sua eventual transformação numa espécie de “FMI europeu”, que além de assegurar o financiamento dos países em dificuldades, assumiria também um papel fulcral no desenho dos programas de ajustamento exigidos aos respectivos governos.

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