Morreu Shinzo Abe, ex-primeiro-ministro do Japão, baleado em comício
Shinzo Abe, de 67 anos, participava num comício eleitoral quando foi atingido pelas costas por um ex-membro da força naval do país, tendo entrado em paragem cardiorrespiratória.
Morreu o antigo primeiro-ministro japonês Shinzo Abe, avançou a emissora pública nipónica NHK.
Shinzo Abe foi alvo de um atentado a tiro, nesta sexta-feira, durante um comício na cidade de Nara, e foi hospitalizado em estado considerado muito grave. Foi o primeiro assassinato de um ex-primeiro-ministro japonês desde os dias do militarismo pré-guerra na década de 1930.
Por volta das 11h30 locais (3h30 em Portugal), Abe, de 67 anos, participava num acto eleitoral do Partido Liberal Democrático (PLD) para as eleições parlamentares de 10 de Julho, quando um homem de 41 anos disparou sobre ele, pelo menos duas vezes, com uma espingarda. Um dos tiros terá acertado nas costas do ex-primeiro-ministro japonês, que entrou depois em paragem cardiorrespiratória.
O ex-primeiro-ministro japonês caiu de imediato no chão e foi transportado de helicóptero para um hospital perto da estação Kintetsu Yamato-Saidaiji. Durante este percurso, Abe terá entrado em paragem cardiorrespiratória, segundo o corpo de Bombeiros de Nara, citados pela Europa Press.
O Hospital da Universidade Médica de Nara, que o recebeu na cidade de Kashihara, confirmou que a sua morte foi anunciada às 17h03 locais (9h03 em Portugal). A causa da morte foi a perda excessiva de sangue associada um ferimento de grandes dimensões no coração.
De acordo com a explicação do hospital, o ex-primeiro-ministro tinha um ferimento no coração e dois tiros no pescoço. Foram feitas várias tentativas para estancar a hemorragia enquanto Abe recebia transfusões de sangue, mas cerca de quatro horas e meia depois a morte foi confirmada.
Nenhuma bala foi encontrada dentro do corpo do ex-primeiro-ministro, esclareceu Kimihiko Yoshikawa, director do hospital, que sublinhou: “Lamento muito que o ataque tenha sido tão brutal. O hospital fez tudo o que era possível.”
As centenas de pessoas que assistiam ao seu discurso testemunharam a tentativa de assassinato. Em vídeos divulgados nas redes sociais, pode ouvir-se o choque e os gritos de todos os presentes, bem como o pedido de socorro e a chegada da equipa médica e da segurança que deteve o atirador.
O suspeito do assassinato de Shinzo Abe é um homem desempregado de 41 anos e ex-membro da força naval do país, anunciou na manhã desta sexta-feira a polícia japonesa. Yamagami Tetsuya, natural de Nara, foi detido no local do atentado, enquanto segurava uma arma com a qual terá disparado dois tiros contra o antigo líder japonês. Segundo fontes do Ministério da Defesa japonês, o alegado agressor trabalhou no ramo naval das Forças de Autodefesa por três anos, até 2005.
Shinzo Abe esteve em funções como primeiro-ministro do Japão em 2006, durante um ano, e novamente de 2012 a 2020.
Governo do Japão condena ataque
Depois da morte de Abe ter sido anunciada, o primeiro-ministro Fumio Kishida condenou o tiroteio nos “termos mais fortes”, durante uma conferência de imprensa, enquanto o povo japonês e os líderes mundiais expressaram também o choque com o ocorrido num país onde a violência política é rara e as armas são rigidamente controladas.
“Este ataque é um acto de brutalidade que aconteceu durante as eleições — a base da nossa democracia — e é absolutamente imperdoável”, disse Kishida, citado pela agência Reuters.
“Esta barbárie não pode ser tolerada, independentemente da razão da pessoa, por isso condenamo-la fortemente e faremos o nosso melhor para ajudar”, afirmou o chefe de gabinete do Governo japonês, Hirokazu Matsuno, em conferência de imprensa, quando Abe estava ainda em estado crítico.
A ex-ministra do Interior e das Comunicações do Japão, Sanae Takaichi, também condenou o ataque, dizendo que “não perdoa o terrorismo político”, enquanto que o ministro da Defesa do Governo de Abe, Satoshi Nakanishi, disse que “o terrorismo e a violência não devem ser perdoados”.
O legado de Shinzo Abe
O primeiro-ministro com o mandato mais longo Japão lançou a política económica conhecida como “Abenomics”, para tirar a economia da deflação, fortaleceu as forças armadas e procurou combater a crescente influência da China. O membro do Partido Liberal Democrático (LDP) teve dois governos: entre 2006 e 2007 e 2012 e 2020. Abe abandonou o cargo em Agosto de 2020 por motivos de saúde.
O nacionalista pragmático tinha 52 anos quando se tornou chefe de Governo pela primeira vez em 2006, o mais jovem da história do seu país no período pós II Guerra Mundial, contudo, em Setembro de 2007, renunciou de forma surpreendente depois do seu partido ter perdido as eleições de Julho daquele ano. Quando regressou para o segundo mandato deixou a sua marca através de uma política ousada de recuperação económica do país e uma intensa actividade diplomática, nomeadamente com a China.
O seu mandato não terminou da melhor forma, uma vez que, no Verão de 2020, quando a sua credibilidade e popularidade entre os cidadãos começou a decrescer devido à forma de gestão da pandemia de covid-19 considerada desastrosa pela opinião pública, admitiu que sofria de uma doença inflamatória intestinal crónica e demitiu-se pouco tempo depois. Esta doença tinha já sido uma das razões para o fim abrupto do seu primeiro mandato em 2007.
De forma feral, Shinzo Abe tornou-se conhecido, a nível internacional, sobretudo pela política económica, apelidada de “Abenomics”, lançada no final de 2012 e que combinava a flexibilização monetária, reformas estruturais e estímulos fiscais maciços. Conseguiu aumentar significativamente da taxa de participação das mulheres e dos cidadãos idosos na força de trabalho, bem como um maior recurso à imigração face à escassez de mão-de-obra.
Por outro lado, algumas leis aprovadas por Abe, nomeadamente a expansão das missões das Forças de Auto-Defesa Japonesas, o reforço da protecção dos segredos de Estado, e o reforço da luta contra o terrorismo, causaram controvérsia no Japão, levando inclusivamente a grandes manifestações, raras, no país.
Em termos diplomáticos, ficou marcado por tentar manter sempre ligações cordeais mesmo com líderes que fossem contra a sua forma de liderança, nomeadamente Donald Trump, o ex-Presidente do maior aliado do Japão, os EUA, e com Vladimir Putin. Abe tentou, inclusivamente, não hostilizar o Presidente russo na esperança de resolver a disputa sobre as Ilhas Kuril do Sul, anexadas pela União Soviética no final da II Guerra Mundial, mas nunca foi bem-sucedido.