Como é que a crise climática vai afectar as pradarias marinhas

As ervas que compõem as pradarias marinhas são fotossintéticas (transformam dióxido de carbono em oxigénio), pelo que a acidificação do oceano deverá torná-las mais produtivas. Já o aumento da temperatura divide os especialistas.

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Ria Formosa, onde está em curso um projecto de restauro de pradarias marinhas (e protecção de cavalos-marinhos) Rui Santos

Até que ponto a crise climática já está a perturbar as pradarias marinhas, ecossistemas que constituem o refúgio de muitos animais aquáticos e são grandes sequestradores de carbono? O PÚBLICO fez a pergunta a alguns cientistas e as respostas divergem.

Rui Santos, investigador do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve, repara que as ervas marinhas são plantas fotossintéticas, pelo que a desoxigenação do oceano, que tão problemática está a ser para outros animais aquáticos, deverá ser mais benéfica do que prejudicial para as pradarias. “A acidificação acaba por ser vantajosa para as ervas marinhas: consumindo mais dióxido de carbono (CO2), elas fazem mais fotossíntese e, portanto, crescem mais depressa. Isto também se verifica nas plantas terrestres: há um aumento de produtividade, ainda que pequeno”, diz.

O aquecimento dos oceanos também não deverá comprometer as espécies de ervas marinhas, defende Rui Santos. “Com o aumento da temperatura no hemisfério Norte, as espécies que não aguentam temperaturas maiores migrarão para zonas mais frias. Neste momento, elas não conseguem viver no pólo Norte. Mas onde hoje é gélido vai começar a ser menos frio, pelo que elas conseguirão subir em direcção ao pólo Norte”, destaca.

Bernardo Duarte, investigador do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (Mare) na Faculdade de Ciências de Lisboa, também acha que o aumento de CO2 não será problemático, mas, em relação ao aquecimento dos oceanos, tem uma tese discordante. No âmbito de um projecto que visava contribuir para a protecção e o restauro das pradarias no estuário do Sado, o especialista em ecotoxicologia fez experiências para tentar perceber como é que, no futuro, as ervas marinhas reagirão aos efeitos adversos das alterações climáticas. Deixando, durante 20 dias, algumas plantas dentro de recipientes com água a uma temperatura 1,5 graus Celsius mais quente do que a temperatura actual das águas do Sado, percebeu que é possível que o aquecimento dos oceanos venha a condicionar o metabolismo das ervas.

Registou-se uma “perda notória de capacidade fotossintética”, diz Bernardo Duarte, dizendo ainda que “algumas folhas entraram em senescência”. “É o processo a que assistimos no Outono: as folhas das árvores começam a ficar com um tom alaranjado e isso revela que há algum problema.”