Montepio abateu dezenas de árvores de grande porte no centro do Porto

Associação Mutualista Montepio está a construir empreendimento numa área onde escasseiam espaços verdes. Câmara diz que árvores estavam em mau estado.

PP - 27 JUNHO 2022 - PORTO - NOVO EMPRRENDIMENTO  HABITACIONAL DO MONTE PIO GERAL COM CORTE DE ARVORES CENTENARIAS
Fotogaleria
Depois da intervenção, sobraram apenas dois tulipeiros, dois ciprestes de grande porte e algumas camélias Paulo Pimenta
PP - 27 JUNHO 2022 - PORTO - NOVO EMPRRENDIMENTO  HABITACIONAL DO MONTE PIO GERAL COM CORTE DE ARVORES CENTENARIAS
Fotogaleria
No terreno resta entulho, um amontoado de cepos e máquinas a laborar.
PP - 27 JUNHO 2022 - PORTO - NOVO EMPRRENDIMENTO  HABITACIONAL DO MONTE PIO GERAL COM CORTE DE ARVORES CENTENARIAS
Fotogaleria
Antiga escola Académica vai dar lugar a empreendimento imobiliário de 117 apartamentos
PP - 27 JUNHO 2022 - PORTO - NOVO EMPRRENDIMENTO  HABITACIONAL DO MONTE PIO GERAL COM CORTE DE ARVORES CENTENARIAS
Fotogaleria
Está prevista a plantação compensatória de 117 árvores, refere a autarquia do Porto Paulo Pimenta

Para avançar com a operação de urbanização da Quinta do Pinheiro, no centro do Porto, a Associação Mutualista Montepio (AMM) abateu dezenas de árvores de grande porte, numa área da cidade onde há poucos espaços verdes. Quem ali vive lamenta o desaparecimento da mancha verde. O Montepio diz que vai transplantar algumas árvores e plantar outras. A Câmara Municipal do Porto (CMP) diz que a maior parte do arvoredo estava em mau estado.

Em Março, a associação mutualista anunciou que iria avançar para a construção de um empreendimento de seis edifícios com capacidade para 117 apartamento e 192 lugares de estacionamento, numa operação destinada ao arrendamento a custos controlados. Apesar de o processo ter um longo historial – a operação de loteamento arrancou em 1997 e só em 2020 foram aprovados os projectos para a construção dos seis edifícios, depois de vários anos em tribunal com a autarquia – o arranque das obras e consequente desaparecimento da mancha verde apanhou os moradores de surpresa.

No terreno da antiga Escola Académica, que também já foi casa do Teatro Experimental do Porto, foram abatidas dezenas de árvores de grande porte. Apenas foi mantido um pequeno grupo, junto ao acesso à quinta que dá para a rua do Pinheiro, ao topo das escadas do Largo de Mompilher. Resta entulho, um amontoado de cepos e máquinas a laborar.

O alerta foi dado pelo designer Christian Haas, que vive e trabalha na Rua do Almada desde 2014 e cujo logradouro e jardim estão virados para o terreno onde está a decorrer a intervenção. Diz que o abate começou a meio de Maio e terminou já em Junho. Juntamente com o arquitecto Ricardo Saraiva, também morador, procuraram esclarecimentos junto da autarquia e da Quercus. Como o conjunto de árvores não estava classificado, não havia nada a fazer.

A CMP confirma esse dado, pelo que o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas não foi chamado a pronunciar-se. Como a operação de loteamento foi aprovada com base num pedido de informação prévia de 2001, este processo também “não foi apreciado à luz do Plano Director Municipal (PDM) actual, nem do anterior”. Nos levantamentos sobre a estrutura ecológica e biodiversidade que servem de base à mais recente versão do PDM do Porto, aquele miolo do quarteirão está identificado como sendo um “espaço verde com valor patrimonial”, estimando-se que albergaria entre 15 a 29 espécies.

Podas originaram problemas

Através do Google Maps, é possível perceber que o terreno tinha dezenas de árvores de grande porte. Ao PÚBLICO, o Montepio não especifica quantas árvores foram abatidas, mas refere que foi elaborado um “Plano de Reordenamento e Protecção das árvores da Quinta do Pinheiro”, tendo o projecto de espaços exteriores sido aprovado pela autarquia depois de “apreciado pelos serviços da CMP e ajustado nos termos solicitados”. Na resposta enviada por email, a associação explica também que tanto o projecto de arquitectura como o dos espaços exteriores foram aprovados em 2020, “seguindo as normas e regulamentos em vigor”.

A informação avançada pela CMP é mais detalhada: a autarquia diz que condicionou o pedido de construção à obtenção de informação adicional sobre as árvores ali presentes, “nomeadamente o estado fitossanitário das espécies arbóreas existentes, com registo fotográfico e o conjunto de medidas de protecção às espécies a manter”. O Montepio enviou a informação pedida, mas, explica a autarquia, “constatou-se que a generalidade do arvoredo se apresentava em mau estado, com graves problemas biomecânicos resultantes de podas de rolagem”, ou seja, de anteriores cortes de ramos de grande calibre. Foram apenas preservados dois tulipeiros, dois ciprestes de grande porte e algumas camélias.

Christian Haas não duvida da legalidade da operação, mas fala de “falta de sensibilidade”, principalmente no centro do Porto, onde a malha urbana é apertada e os espaços verdes são muito raros. O Montepio escreve que o dito plano de reordenamento prevê “o abate de algumas árvores, mas também o transplante e manutenção de outras, além da plantação de novas árvores”. Está prevista a plantação compensatória de 117 exemplares, refere ainda a câmara. Entre as espécies a plantar estão camélias, carvalhos alvarinhos e liquidâmbares.

O miolo do quarteirão é pouco visível para quem passa pelas ruas do Almada, do Pinheiro, dos Mártires da Liberdade ou pela Praça da República, que o rodeiam. Isso terá feito com que a operação não tenha atraído grande atenção e feito com que apenas a vizinhança se tenha apercebido, refere Ricardo Saraiva. Em meados de Junho, o Bloco de Esquerda questionou a autarquia sobre o abate, mas ficou sem resposta.

Sugerir correcção
Ler 7 comentários