Arte colectiva, inclusiva e “sem fim” em exposição no Parque Nascente
Centro comercial exibe obra colectiva de grande dimensão composta por 50 peças individuais criadas no âmbito do projecto comunitário Mãos Com Vida.
Proporcionar uma experiência única e criativa a pessoas comuns que, de outra forma, dificilmente teriam a oportunidade de explorar a sensibilidade artística - esta seria uma possível introdução ao projecto “Mãos Com Vida”, promovido pelo Parque Nascente no âmbito da política ‘Act For Good’. Mas tal como a peça inaugurada no passado dia 25 de Junho, é bem mais complexo do que parece.
Antes de o pano cair e revelar as formas e cores das 50 peças individuais, Bruno Pereira (Labdesign/Departamento), curador da obra e mentor dos workshops que antecederam a criação da obra final, não escondia a enorme expectativa - apesar de ter composto o ‘puzzle’, não tinha visto ainda a materialização do resultado final. “As coisas ganharem escala, as coisas ganharem verdade, é isso que está a mexer mais comigo”, confessou.
Claramente surpreendida perante os 25 metros de móbile suspenso ao longo dos 6 andares do centro comercial (começa no 2º piso e termina no -3), Paula Padilha, uma das participantes na obra colectiva, disse ter chegado a pensar que as pequenas peças de plasticina que fizeram nos workshops “não iam dar em nada”. Alzira Pinto, outra das participantes, trabalha há 19 anos no Parque Nascente e nunca pensou em participar em algo assim, quer pela expressão artística, quer pela dimensão da obra final. “Estou muito vaidosa”, diz orgulhosa, não só pela sua peça de três metros, fiel ao desenho original, mas por se ter superado. O objectivo principal do projecto é precisamente provar que cada um pode criar algo grande e de forma disjuntiva, que a arte é acessível a todos e que é possível, em conjunto, criar algo grande e com impacto.
Arte sem fim
“A criatividade nasce com todos” mas é preciso explorá-la, explicou Bruno Pereira. Gosta da ideia de “despertar nas pessoas coisas que elas não estão à espera”. Bruno não tinha visto a peça montada, mesmo conhecendo cada pormenor que faz parte da mesma. Dado a sua dimensão e localização estratégica, nunca se consegue contemplar a peça no seu todo. E isso é parte da magia. Está suspensa em móbile, movimentando-se suavemente, e oferece sempre novos ângulos aos espectadores. “Há quem leia a história” - há painéis informativos que contam o processo criativo - “e quem faça a sua leitura”, só por ver a peça, “e essa acaba por ser a magia da Arte”.
Para fazer perdurar a peça no tempo, Stéphanie Lopes convidou alguns artistas de diferentes quadrantes para interpretarem a peça “Azul Cale” através da sua própria expressão artística, durante os meses em que estará em exposição. A ilustradora Clara Não foi uma das artistas a aceitar o desafio: “É muito bom as pessoas terem contacto com a arte, especialmente quando vai buscar memórias associativas”. Esteticamente, é uma obra de “arte moderna que traz referências tradicionais do Porto” e acaba por ser uma oportunidade de “dar às pessoas arte que lhes pode criar uma boa cultura visual”.
Margarida Sampaio, também ilustradora e presente na inauguração, partilha da mesma opinião, destacando o interesse da iniciativa para a comunidade. Sobre o desafio, diz que irá “interpretar a peça e criar uma ilustração que eventualmente possa ser inserida na própria peça”, deixando em aberto, mais uma vez, o conceito de infinitude desta obra de arte.
Reciclar a ideia de centro comercial
António Narciso, 17 anos, é aluno de piano no Conservatório do Porto. Soube da inauguração porque segue o pianista Júlio Resende nas redes sociais. Questionado sobre este “palco inusitado”, - como o próprio Júlio confessava, divertido, antes de começar a tocar -, o jovem acredita que “é uma boa forma de mostrar ao público comum a música do Júlio Resende”. São evidentes as influências portuguesas que inclui na música que cria, integrando elementos de uma forma que “pessoas que não entendam tanto de questões teóricas do jazz, de harmonia e complexidade, ao passar no corredor, no seu caminho para as compras ou para onde quer que seja, acabam por ouvir reminiscências que reconhecem”, disse António Narciso sem esconder a admiração pelo pianista.
Ao longo dos últimos anos, o Parque Nascente tem promovido acções que procuram envolver a comunidade que frequenta o espaço. Proporcionar a oportunidade de contactar com diferentes expressões artísticas, através da criação plástica ou pelo contacto com música mais erudita, são apenas exemplos das muitas iniciativas desenvolvidas com esse intuito. Está na altura de “reciclar a ideia de centro comercial”, acredita Stéphanie Lopes, marketing manager do Parque Nascente. Mesmo durante a pandemia, os projectos comunitários não foram descurados, como o Mãos Com Vida ou a recente horta urbana instalada no centro. No futuro, a aposta é fomentar mais iniciativas que vão ao encontro dos princípios Act for Good, explicou Stéphanie.