Monica Medina: “Estamos a trabalhar com o Governo ucraniano para avaliar os danos ambientais da guerra”

Secretária de Estado norte-americana com responsabilidade sobre os oceanos e assuntos ambientais e científicos internacionais diz que os Estados Unidos estão empenhados no combate à pesca ilegal e em proteger a biodiveridade marinha.

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RG Rui Gaudêncio - 30 Junho 2022 - Mónica Medina, secretária de Estado norte-americana para os Oceanos,. Lisboa. Público

A pasta de Monica Medina, secretária de Estado do Governo norte-americano que gere o Gabinete dos Oceanos e Assuntos Ambientais e Científicos Internacionais, é vasta. “O meu gabinete é literalmente vindo do espaço, vai desde Marte até às profundezas dos oceanos”, disse ao PÚBLICO, numa conversa em Lisboa, à margem da Conferência dos Oceanos das Nações Unidas.

Em Lisboa, veio defender prioridades da política para os oceanos dos Estados Unidos: a primeira é a ambição de que mais países se comprometam com o objectivo de proteger 30% do seu território oceânico até 2030 e a segunda uma iniciativa de luta contra a pesca ilegal. “Queremos trabalhar com pequenas comunidades e, mais importante, tirar da água as embarcações de pesca que estão a tirar ilegalmente peixe a outros países”, explicou.

Pode explicar qual é a missão do Gabinete dos Oceanos e Assuntos Ambientais e Científicos Internacionais?
O meu trabalho é sobre os oceanos, ambiente – o que inclui as alterações climáticas –, ciência e espaço. O meu gabinete é literalmente vindo do espaço, vai desde Marte até às profundezas dos oceanos e tudo o que está entre estes extremos. Também apoiamos a diplomacia científica.

Trabalhamos sobre controlo da poluição, todos os acordos multilaterais ambientais e tudo o que tenha a ver com os oceanos, desde as pescas, os leitos marinhos, recursos genéticos marinhos, biodiversidade marinha, conservação e protecção de áreas marinhas, o Árctico.

E quais são as prioridades dos Estados Unidos para os oceanos?
As nossas maiores prioridades são proteger 30% do oceano em todo o mundo até 2030, incluindo na nossa Zona Económica Exclusiva...

Quanto das águas territoriais norte-americanas estão protegidas?
Entre 26% e 27%. Estamos muito perto dos 30%.

Estamos a tentar que mais países se comprometam com esse objectivo. Embora os EUA não façam parte da Convenção sobre a Diversidade Biológica, temos estatuto de observadores e estamos activamente envolvidos nas negociações [para a sua revisão].

A segunda prioridade do Governo norte-americano é a pesca ilegal, não regulada e não notificada [IUU, na sigla em inglês]. Queremos melhorar a gestão das pescas, trabalhar com pequenas comunidades e, mais importante, conseguir tirar da água as embarcações de pesca que estão a tirar ilegalmente peixe a outros países ou no alto mar.

Temos uma grande iniciativa, que lançamos com o Reino Unido e o Canadá, e mais alguns países juntaram-se a nós aqui na Conferência dos Oceanos, para construir uma rede contra a pesca ilegal. Isto é um problema global, não podemos resolvê-lo país a país. Também é um problema de segurança nacional, porque quando estas embarcações de pesca operam a muita distância dos seus países, e apanham o peixe de outras nações, afectam países em desenvolvimento que precisam desse peixe para alimentar a sua população, isto causa instabilidade e claro, temos uma crise de insegurança alimentar.

Também criamos mais sinergia dentro do Governo norte-americano para nos tornarmos mais eficazes a impedir a importação para o nosso país de peixe pescado de forma ilegal.

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"É muito importante não fazermos erros" com a mineração dos fundos marinhos", disse Monica Medina Rui Gaudência

Quais são as principais dificuldades para chegar à meta de protecção de 30% das zonas marinhas até 2030?
Globalmente, atingir este objectivo é um enorme desafio, porque grande parte do oceano fica fora de zonas de jurisdição nacional – está a ser negociado neste momento um tratado nas Nações Unidas para tentar determinar como criar protecção para locais e para os recursos genéticos nas zonas para além da jurisdição dos Estados. Como ninguém tem jurisdição sobre estas áreas, todos temos de concordar, e isso é complicado.

Pensamos nos oceanos como uma vasta área, 70% do planeta, mas quando vemos todo o tráfego marítimo, toda a pesca, todas as estruturas de produção de energia eólica offshore que estamos a pensar construir, e no espaço que as formas de vida marinha precisam para viver, percebemos que algumas zonas dos oceanos estão a ficar muito cheias. E há grandes partes dos oceanos sobre as quais não sabemos grande coisa.

E qual é a posição dos Estados Unidos na negociação deste tratado?
A Administração do Presidente Joe Biden considerou este assunto prioritário, e estamos a fazer grandes esforços para dar apoio às negociações, que estão a chegar a uma conclusão.

Como é que a guerra da Rússia na Ucrânia afectou a cooperação nos oceanos?
Diria que os nossos desafios com a Rússia são grandes. É óbvio que fizeram danos ambientais tremendos na Ucrânia com esta guerra, e estamos a trabalhar com o Governo ucraniano para avaliar esses danos, à água potável, às zonas costeiras, aos terrenos agrícolas destruídos. Estamos a ajudá-los a construir um caso para virem a pedir indemnizações pelos estragos ambientais causados pela guerra.

Também estamos a trabalhar no Conselho do Árctico. A Rússia é quem secretaria este órgão neste momento, e chegamos a um ponto em que não podemos continuar como se nada se passasse. Não estamos paralisados, estamos a fazer investigação oceanográfica, que é uma boa parte daquilo que faz o Conselho do Árctico, com os outros países-membros [além dos Estados Unidos e da Rússia, são membros o Canadá, a Gronelândia, a Islândia, a Noruega, a Suécia e a Finlândia].

Portanto, não há qualquer cooperação com a Rússia no Árctico, neste momento?
Sim.

Há um assunto que não está propriamente na agenda da Conferência dos Oceanos, e há críticas por causa disso, há um movimento que pede uma moratória sobre a mineração nos fundos marinhos. Qual é a posição dos EUA?
É muito importante não fazer erros. Estamos nas últimas fases antes de podermos começar esta actividade, a determinar qual será o quadro legal, quais as protecções ambientais necessárias. Os EUA não são membros da Convenção da Lei do Mar [que enquadra este processo], temos sorte por poder participar como observadores, trabalhamos com Governos parceiros para juntarmos os nossos conhecimentos científicos mais avançados. Seria terrível se houvesse nos oceanos o tipo de resíduos da mineração que vemos em terra. Seriam impossíveis de conter num só sítio, espalhar-se-iam para todo o lado.

A sua agência tem alguma cooperação científica com Portugal?
Com Portugal há cooperação nas áreas do ambiente, saúde e tecnologia. Por exemplo, desde Abril, o Departamento de Florestas e Protecção contra Incêndios da Califórnia e a Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais têm um acordo para partilhar recursos e boas práticas, uma vez que tanto Portugal como a Califórnia estão a atravessar uma seca severa e épocas de incêndios florestais de alto risco.

O Ministério da Saúde português e o Departamento de Saúde dos EUA cooperam na investigação, prevenção e controlo do cancro nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, através de um acordo assinado em Junho.

A embaixada dos EUA em Portugal convidou um especialista em inteligência artificial a desenvolver oportunidades de cooperação bilateral nesta área, num projecto que será coordenado com a Fundação para a Ciência e Tecnologia.

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"os nossos desafios com a Rússia são grandes. É óbvio que fizeram danos ambientais tremendos na Ucrânia com esta guerra", disse Monica Medina