“Somos viciados em plástico” e é preciso encontrar alternativas

“O movimento transfronteiriço de plástico está a tornar-se uma grande preocupação”, diz ministro do Quénia. Há que encontrar substitutos para o plástico, “uma realidade que pode ser conseguida se os governos e ministérios quiserem sair do ciclo”.

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Um porto na província de Shandong, na China. Muitos contentores podem ficar abandonados durante anos e representar perigo, disse a agente Anne-Linn Jensen na Conferência dos Oceanos Reuters/CHINA DAILY

O plástico tem sido protagonista de muitas das conversas da Conferência dos Oceanos. Esta foi mais uma delas: “Somos viciados em plástico”, asseverou na tarde desta terça-feira David Vivas Eugui, responsável jurídico da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). Não se referia aos oradores, mas sim às nações e empresas que ainda não travaram a produção destes materiais sintéticos. “Todos no mundo estão envolvidos, sejam países importadores ou exportadores.”

E deixou a mensagem de que é imperativo encontrar substitutos para o plástico. Que substitutos serão esses? Tudo o que não seja plástico, resumiu o orador. Alumínio, fibras orgânicas, vidro, algodão, papel. “Há materiais que são melhores que outros. Uns são recicláveis ou podem ser usados na compostagem”, explicou, mas é importante que sejam “amigos do ambiente”. Através desta substituição, seria possível “reduzir 17% da produção de plástico que se pode gerar até 2040”. O plástico é a parte mais visível da poluição marinha, correspondendo a mais de 80% do lixo encontrado no mar. Há muito trabalho pela frente, mas “é uma realidade que pode ser conseguida se os governos e ministérios quiserem sair do ciclo do plástico”.

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A Conferência dos Oceanos decorre esta semana no Parque das Nações (e não só), em Lisboa Nuno Ferreira Santos

David Vivas Eugui pediu mais medidas para se conseguir perceber que plásticos são perigosos (os que têm químicos nocivos para os animais ou que funcionam como “esponja” de poluentes) e quais os que podem ser reciclados. E enalteceu ainda o papel das pequenas nações na regulação do plástico, que inclui proibições à produção de plástico e aos aditivos que são acrescentados. “Eles estão a passar da conversa para a acção”, analisou. Ainda assim, os países em desenvolvimento são aqueles em que existe uma pior gestão dos resíduos.

Corredores para navios

“O movimento transfronteiriço de plástico está a tornar-se uma grande preocupação”, afirmou o ministro do Ambiente e das Florestas do Quénia, Chris Kiptoo, durante a abertura da sessão. O oceano é “vital para a vida”, mas enfrenta “inúmeros desafios”. No Quénia, conta, existem corredores oceânicos para navios que viajam entre continentes, mas os oceanos estão cada vez mais propensos à poluição duradoura do plástico.

As declarações foram feitas durante uma conversa lateral que decorreu na tarde desta terça-feira na Conferência dos Oceanos, em Lisboa. Como havia outra palestra a decorrer numa tenda lado a lado, esta era uma conversa “silenciosa”: cada participante tinha um auricular no ouvido para poder ouvir o que estava a ser dito. O intuito era falar sobre como se pode tirar o lixo dos oceanos e como controlar os plásticos e combater o transporte ilegal ao abrigo da Convenção de Basileia. Esta convenção foi criada para regular os milhões de toneladas de resíduos tóxicos e perigosos que atravessam as fronteiras nacionais. Foi negociada em 1989 e ratificada por mais de uma centena de países.

Saber o que é ilegal

Um dos problemas ligados ao controlo destes resíduos transfronteiriços é saber quando são ilegais ou não: quando se encontra droga sabe-se logo que é ilegal, mas quando são “crimes que afectam o ambiente não é assim tão fácil”, disse Anne-Linn Jensen, que faz parte da Agência das Nações Unidas Sobre Drogas e Crime (UNODC). Além disso, “as inspecções levam tempo e recursos e pode haver risco de saúde para os funcionários”, sobretudo em contentores abandonados. “São milhares e milhares de contentores abandonados que estão assim há anos. São um desafio para as comunidades locais. Se existirem químicos, podem ter fugas”, explicou a agente durante a mesma conversa.

É também importante saber quais os contentores que devem ser inspeccionados, já que existe uma “quantidade enorme de contentores que andam pelo mundo todos os dias”. É preciso partilhar informação a nível internacional e tentar que haja “mais controlo dos países exportadores” – e não só nos importadores, disse Anne-Linn Jensen.

Durante a sessão, o secretário-geral da Convenção de Basileia, Rolph Payet, alertou também que o que está nos rios vai parar aos oceanos, incluindo o lixo que é deitado nas cidades. “Muitas comunidades costeiras queixam-se que não foram elas as únicas a poluir assim tanto.”

A Convenção de Basileia é um acordo global que tem como objectivo proteger a saúde humana e o ambiente “dos efeitos adversos resultantes da produção, movimentos transfronteiriços e gestão de resíduos perigosos” e não só. Assim, os Estados que fazem parte deste tratado comprometem-se a “prevenir ou minimizar a produção de resíduos na fonte e a submeter a tratamento e eliminar os resíduos o mais próximo possível do seu local de produção. Desde 2020 e 2021 que os plásticos também estão incluídos nestas categorias de resíduos. Um dos objectivos é impedir “que estes resíduos sejam exportados para países que não dispõem das infra-estruturas adequadas para uma recolha eficaz e para a sua boa gestão ambiental, para apoiar a boa gestão ambiental dos resíduos de plástico”.