Visita guiada ao museu do nojo

Como acontece com quase todos os filmes de Cronenberg, o impacto de Crimes of the Future não é imediato, nem linear, nem simétrico. A reacção inicial pode perfeitamente ser de desilusão, ou até (pior ainda) de indiferença.

Entre as muitas vítimas e danos colaterais da gradual transição do analógico para o digital, uma das mais trágicas foi a morte da viscosidade. Um dos grandes triunfos colectivos da espécie humana — ganhando vigor nos anos 1970, e atingindo o seu pico na década seguinte — foi alcançado pela fortuita sinergia entre o cinema e a indústria química, que resultou na adopção de vários lacticínios ou derivados do petróleo exclusivamente aplicados à arte de meter nojo. Durante vinte e poucos anos gloriosos, centenas de aderecistas foram munidos de listas de compras exóticas e enviados a mercearias diversas, com a tarefa de trazer repulsa para os grandes ecrãs. Foi a Era de Ouro da espuma de látex, das borrachas, dos plasmas, das geleias, das maioneses. Como acontece com muitos prazeres terrenos, talvez só depois do fim conseguimos dar valor ao que se perdeu: aquele brilho particular, quando a luz incide no ângulo certo sobre a superfície de um simulacro anatómico besuntado com xaropes por um atarefado assistente de produção.

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