“Os atletas podem ter capacidades atléticas acima da média, mas são pessoas”
Paulo Frischknecht, ex-nadador e ex-presidente da Federação Portuguesa de Natação.
A imagem do corpo inanimado de Anita Alvarez a ser resgatado pela sua treinadora do fundo da piscina onde decorrem os Mundiais de Natação, evitando o afogamento da atleta norte-americana de natação artística, correu mundo. Anita Alvarez perdeu os sentidos no final da sua actuação. Soube-se depois que por exaustão. De acordo com Paulo Frischknecht, ex-nadador, o caso não é motivo para que nuvens cinzentas pairem sobre a modalidade.
Até que ponto uma situação destas é admissível num Campeonato do Mundo, tendo em consideração que a família confessou que uma situação idêntica já tinha ocorrido antes?
É difícil emitir opinião por duas razões: não conheço o histórico da atleta e não sou médico. Agora, tenho experiência para já ter assistido a uma situação destas, infelizmente, noutra disciplina da natação, no caso, nas águas abertas no Europeu de Berlim de 2014. O importante a reter é que os atletas são pessoas, são seres humanos. Podem ter capacidades atléticas acima da média, serem desportistas de excepção, mas não deixam de responder aos estímulos positivos e negativos como qualquer pessoa. Mas a precaução deve sempre acontecer e não é por acaso que as piscinas têm de ter nadadores salvadores obrigatoriamente presentes.
Que tipo de acompanhamento médico é que um atleta destes, de alta competição, tem? São-lhe feitos exames antes do começo da prova? São apresentados os resultados de testes feitos nos clubes onde competem?
O quadro de exigências varia de país para país. Não tenho dúvidas, por exemplo, de que todos os atletas nacionais, antes de participarem nestas competições, são avaliados e acompanhados. O que não invalida que não deixam de ser pessoas como qualquer outra e um quadro de excepção pode sempre acontecer.
A nadadora terá sofrido de um quadro de exaustão. Isto deve-se a quê? Excesso de treinos? Desgaste psicológico acrescido devido ao quadro competitivo?
Não lhe consigo responder. É óbvio que, para suceder um desmaio e um início de afogamento, tem de haver uma exaustão profunda, porque há uma perda de consciência. Havendo uma perda de consciência é porque se atingiu o limite.
Acha normal que, depois do que sucedeu, a atleta tenha voltado a competir?
Não vou emitir juízos de valor por desconhecer a situação.
Tem conhecimento de algum desfecho mortal na modalidade?
Tenho conhecimento, na disciplina de águas abertas, de um desfalecimento não detectado de um atleta que por sinal liderava o ranking mundial e que faleceu numa etapa da Taça do Mundo de águas abertas no Dubai, [o norte-americano Fran Crippen]. Os atletas são acompanhados por embarcações, mas este atleta, por ir no meio de um pelotão ou por ter havido uma desatenção pontual, acabou por se afogar sem que ninguém se tivesse apercebido, quando liderava a competição. Só se aperceberam quando, no final da prova, porque os atletas levam um cartão de controlo, faltava um, que era do atleta em questão. E a partir daí passou a ser obrigatório que os atletas que participam em provas da Taça do Mundo sejam acompanhados por um dirigente, um treinador e de preferência também um médico, mas não podem participar nas provas por mote próprio. Porque o que tinha acontecido com este atleta é que ele se tinha inscrito na prova e foi sozinho. Portanto, não tinha ninguém a acompanhá-lo em permanência.
Esse caso fatídico levou à alteração dos regulamentos e neste caso a FINA também já anunciou a alteração das normas que regulam os procedimentos dos nadadores salvadores. É preciso casos limite para que as regras sejam mudadas?
É como tudo. Não há nenhum quadro regulamentar que abarque todas as situações possíveis e imaginárias. Podemos pensar que temos todas as situações cobertas até acontecer um imponderável. E depois é fundamental adequar os regulamentos a essas situações.