110 Histórias, 110 Objectos: o primeiro betão armado
Neste 51.º episódio do podcast, regressamos aos tempos dos primeiros edifícios construídos em betão armado em Portugal. O podcast 110 Histórias, 110 Objectos, do Instituto Superior Técnico, é um dos parceiros da Rede PÚBLICO.
No podcast 110 Histórias, 110 Objectos, um dos parceiros da Rede PÚBLICO, percorremos os 110 anos de história do Instituto Superior Técnico (IST) através dos seus objectos do passado, do presente e do futuro. Neste 51.º episódio do podcast, descobrimos a história do primeiro edifício em betão armado do país.
Tudo começa num incêndio. A 10 de Junho de 1897, as chamas avançaram impiedosamente sobre a Fábrica de Moagem do Caramujo, em Almada, destruindo-a quase por completo. A urgência da sua reconstrução, e com materiais que pudessem evitar que o desastre voltasse a acontecer, colocou a então Fábrica Aliança na história dos edifícios em Portugal. Foi a primeira vez que um edifício foi reconstruído integralmente em betão armado no país e uma das raras vezes no mundo.
A técnica tinha sido patenteada em França, por François Hennebique, poucos anos antes. “Precisavam de reactivar rapidamente a actividade, decidiu isso e passado um ano e tal a fábrica estava a funcionar”, explica José Manuel Gaspar Nero. O antigo docente do Instituto Superior Técnico foi o responsável por levar para o IST e para o Museu de Civil um testemunho dessa construção, no início dos anos 1990. “Um aluno meu de mestrado estava a fazer um trabalho sobre a fábrica do Caramujo. Fui lá e encontrei essa peça degradada num dos pisos e trouxe-a”, recorda.
Falamos de um pedaço desse primeiro betão armado da fábrica, com cerca de um palmo, produzido em Portugal com um pedaço de varão de aço e cimento da primeira fábrica de cimento em Portugal - a Cimentos Tejo, hoje Cimpor -, constituída alguns anos antes em Alhandra.
A definição de betão armado é-nos dada por Júlio Appleton, professor aposentado do IST, e pode ser resumida numa “composição de betão e de armaduras”. O betão é um compósito feito por um ligante, actualmente o cimento, no tempo dos romanos a cal, e por agregados como areia ou brita, assim como por outros produtos químicos, em pequena quantidade, que permitem controlar a sua composição, torná-lo por exemplo mais fluido, mais compacto, etc. As armaduras geralmente são fornecidas em varão, sendo resistentes à tracção e à compressão.
Apesar desta construção ainda no século XIX, os edifícios em betão armado apenas começariam a ser introduzidos sistematicamente em força nos anos 1920, em Portugal. Depois de períodos com recurso à gaiola pombalina, com estruturas em madeira, e com recurso a tabique noutro período apelidado de “Gaioleiro”, chegava o tempo do betão armado, com a introdução de novos elementos, um dos mais significativos assentava na substituição das madeiras por vigas metálicas.
Com um arranque tímido – “muitas construções eram feitas em betão a imitar a pedra, não havia ainda o assumir do betão. Muitas casas parecem de alvenaria”, recorda Júlio Appleton -, o betão armado foi até usado como material de construção de barcos de mais de 100 metros de comprimento, durante a 1.ª Guerra Mundial.
Muito rapidamente se tornaria na técnica preferencialmente usada pelo Estado Novo e até o campus do Técnico na Alameda recorreu ao betão armado (apoiado em paredes de alvenaria). Também pelo IST passou “o grande engenheiro projectista do século XX em betão armado”, Edgar Cardoso, onde foi também uma das grandes referências no ensino de Pontes e Estruturas.
Este pedaço do primeiro betão armado em Portugal testemunha a importância daquele que se assumiu como “o material do século XX”, nas palavras de José Manuel Gaspar Nero. “Foi o material que fez progredir a rapidez e a estabilidade dos níveis de construção. É muito importante e ainda não está em decréscimo, embora se esteja a introduzir elementos secundários de aligeiramento das estruturas”, aponta.
O podcast 110 Histórias, 110 Objectos é um dos parceiros da Rede PÚBLICO. É um programa do Instituto Superior Técnico com realização de Marco António (366 ideias) e colaboração da equipa do IST composta por Filipa Soares, Sílvio Mendes, Débora Rodrigues, Patrícia Guerreiro, Leandro Contreras, Pedro Garvão Pereira e Joana Lobo Antunes.
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