Putin antevê uma “nova ordem mundial” liderada por nações “fortes e soberanas”

Discurso em São Petersburgo foi adiado duas horas por causa de ataque informático. Presidente russo garante que a economia nacional não tem sofrido com as sanções ocidentais.

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Discurso de Putin em São Petersburgo foi adiado duas horas MAXIM SHEMETOV / Reuters

O Presidente russo, Vladimir Putin, disse que a humanidade está a entrar numa “nova ordem mundial” e negou que a economia nacional esteja a sofrer com as sanções impostas pelos países ocidentais por causa da invasão da Ucrânia.

Naquele que foi o discurso mais agressivo desde que a Rússia lançou a invasão da Ucrânia, Putin deixou bem clara a forma como encara as relações internacionais, referindo-se às “mudanças tectónicas verdadeiramente revolucionárias” na política mundial “que já não são possíveis de ignorar”.

O discurso no Fórum Económico de São Petersburgo, que começou com duas horas de atraso por causa de um ataque informático que afectou os servidores dos organizadores, serviu para que Putin expusesse a sua visão da ordem geopolítica actual, à luz da invasão lançada pelo Kremlin, ao mesmo tempo em que apresentava a Rússia como um actor indispensável e sólido no novo xadrez mundial.

O alvo principal de Putin foram os EUA e os seus aliados, que, depois do fim da Guerra Fria, se comportaram como “deuses na Terra, sem deveres, apenas interesses”. “Pensam que o domínio do Ocidente sobre a política e a economia globais é uma constante, mas nada é eterno”, declarou.

A ideia de uma nova ordem mundial voltaria a ser aflorada por Putin no final do discurso, garantindo que a Rússia entra nela como uma “nação poderosa e soberana”. “É óbvio que as regras e a essência da nova ordem mundial serão ditadas pelos Estados fortes e soberanos”, afirmou. Todos os restantes estão “condenados a continuar a ser colónias sem direitos”.

Entre os actores que Putin vê como fracos nessa nova ordem mundial está a União Europeia, outro dos grandes alvos do seu discurso, que está “a dançar a música tocada por outros”. O Presidente russo disse que o “blitzkrieg económico” imposto sob a forma de sanções por causa da invasão é “louco e irreflectido” e garantiu que são os países europeus que mais estão a sofrer com esta política.

Prevendo que os países da UE venham a perder 400 mil milhões de dólares por causa das sanções e um aumento da desigualdade no espaço europeu, Putin acredita que o radicalismo vai aumentar, levando a uma “mudança das elites” políticas.

Quanto ao impacto no próprio país, Putin disse que a economia russa se mantém sólida, embora tenha apelado aos empresários russos para investirem no país. “É mais seguro na vossa própria casa. Os que não quiseram ouvir isto perderam milhões no estrangeiro”, afirmou.

O tom combativo do discurso de Putin desta sexta-feira contrastou com o menor entusiasmo da intervenção no Dia da Vitória, a 9 de Maio, um dos mais importantes feriados do calendário político russo. Na altura, as forças russas no terreno estavam a reposicionar-se para intensificar a ofensiva no Donbass, depois de falhado o objectivo mais amplo de tomar Kiev e derrubar o Governo ucraniano. No último mês, o Exército russo tem conseguido progredir no terreno e prepara-se para tomar a cidade de Severodonetsk, na região de Lugansk.

O Presidente russo voltou também a repetir aqueles que têm sido os pilares da narrativa divulgada pelo Kremlin para justificar a invasão do país vizinho, descrita na Rússia como uma “operação militar especial”. Caracterizando a decisão de intervir militarmente na Ucrânia como “difícil”, Putin disse, porém, que foi “forçado” a agir para proteger a população russófona – a que se referiu como “o nosso povo” – do Donbass de um “genocídio”.

A tese de que as autoridades ucranianas estariam a conduzir um genocídio contra a população russófona, maioritária no Leste do país, tem sido usada como justificação para a invasão militar pela Rússia. No entanto, não existem quaisquer provas de que esse genocídio estivesse em curso ou sequer em preparação – nos últimos oito anos, o Donbass foi palco de um conflito entre o Exército ucraniano e grupos separatistas pró-russos e, nesse contexto, mais de três mil civis foram mortos, de acordo com as Nações Unidas.

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