Ucrânia não desiste de Severodonetsk enquanto espera as armas prometidas
Ucranianos dizem ter conseguido recuperar parte da cidade, russos contrapõem que empurraram os defensores para longe. Em Kiev, a sugestão de Macron de que “não se deve humilhar a Rússia” não foi bem recebida.
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Uma reviravolta ou apenas mais um episódio dos avanços e recuos que caracterizam uma guerra? É difícil aferir o que se passa realmente em Severodonetsk, onde a batalha pelo controlo da cidade está a ser feita rua a rua com baixas pesadas para ambos os lados.
As forças russas conseguiram durante a semana conquistar praticamente todo o território urbano, mas este sábado a Ucrânia anunciou que um contra-ataque da sua tropa tinha feito recuar o invasor.
“Neste momento, os nossos soldados detiveram-nos e os russos estão a sofrer enormes baixas”, declarou o governador da região de Lugansk, Sergii Gaidai. “Pelo que percebemos, o Exército russo está a pôr todos os seus esforços, a lançar todas as suas reservas nesta direcção”, acrescentou, acusando o inimigo de destruir pontes em redor da cidade para evitar que cheguem reforços ucranianos.
Severodonetsk é o último bastião da Ucrânia na região de Lugansk, que se encontra quase totalmente sob domínio russo e das milícias separatistas da autoproclamada República Popular de Lugansk, reconhecida somente por Moscovo. Para Kiev, segurar Severodonetsk significa atrasar ou impedir o avanço russo no restante Donbass, onde as importantes cidades de Sloviansk e Kramatorsk se mantêm em mãos ucranianas.
Tal como no campo de batalha, cada ataque é seguido por um contra-ataque. Foi o que o Kremlin fez ao fim do dia, dizendo que “as unidades do Exército ucraniano tiveram perdas críticas nos combates por Severodonetsk e recuaram para Lisichansk”, a cidade vizinha, do outro lado do rio Donets.
Os intensos combates no terreno têm levado à morte de 60 a 100 soldados ucranianos todos os dias, admitiu Volodymyr Zelensky esta semana, mas a convicção de Kiev é que a situação mudará de figura assim que as armas ocidentais chegarem à frente. “Sim, as perdas são significativas. Mas com a ajuda dos nossos aliados poderemos minimizá-las e avançar para ofensivas bem-sucedidas. Isto vai requerer armas pesadas”, disse à Associated Press o general Viktor Mujenko, que foi chefe de Estado-maior das Forças Armadas.
Macron irrita Kiev
A mesma ideia foi defendida por Mikhailo Podoliak, assessor de Zelensky e chefe da delegação ucraniana às rondas de negociações com a Rússia em Fevereiro e Março. “Até recebermos todas as armas, até que fortaleçamos as nossas posições e até que os façamos recuar o mais possível até às fronteiras da Ucrânia, não faz sentido ter negociações”, disse na televisão.
Podoliak respondia assim a Emmanuel Macron, que numa entrevista com jornais regionais, a propósito das legislativas francesas, defendeu que “não se pode humilhar a Rússia para que no dia em que os combates terminem seja possível percorrer um caminho de saída pelas vias diplomáticas”. A frase foi recebida com irritação em Kiev, de onde o ministro ucraniano dos Negócios Estrangeiros escreveu, num tweet, que “os pedidos para não humilhar a Rússia apenas humilham França e todos os outros países que os fazem”.
Macron diz-se “convencido de que o papel de França deve ser o de mediador” e não se arrepende de ter passado “centenas de horas” ao telefone com Vladimir Putin nos últimos meses – “a pedido de Volodymyr Zelensky”, faz questão de sublinhar.
Numa guerra que se está a prolongar muito para lá das expectativas iniciais, a batalha da paciência ganha relevância e a unidade demonstrada até agora pelo Ocidente é posta à prova a um ritmo diário. A atitude francesa, mas também a alemã e a italiana, tem gerado exasperação na Ucrânia e noutros países europeus, como a Polónia e os bálticos, que estão empenhados numa derrota militar total da Rússia, por oposição aos governantes que defendem uma via dialogante com o Kremlin.
Depois da conversa telefónica de quase hora e meia entre Macron, Olaf Scholz e Putin na semana passada, o vice-primeiro-ministro lituano acusou os líderes francês e alemão de terem “uma necessidade de auto-humilhação” e de terem “um total alheamento da realidade política”.
Além dos combates em Severodonetsk, este sábado registaram-se bombardeamentos numa dezena de localidades da região de Donetsk e ainda em Mikolaiv e Odessa, a Sul, em Sumi, a Norte.
Em Sviatohirsk, na região de Donetsk, a Ermida de Todos os Santos ardeu em resultado de ataques. Trata-se de um edifício construído no século XVI que integra um mosteiro de grande importância tanto para ortodoxos ucranianos como russos. Ambos os lados da contenda se acusaram mutuamente pelo incêndio.