Bloco de Esquerda faz queixa a Provedoria sobre desocupações no bairro Padre Cruz
Mães com filhos do bairro Padre Cruz foram despejadas na quinta-feira. Moradoras dizem que Santa Casa ofereceu pela primeira vez no dia seguinte apoio a rendas.
O deputado municipal do Bloco de Esquerda e advogado Vasco Barata enviou uma queixa à Provedoria de Justiça sobre as desocupações no Bairro Padre Cruz, em Lisboa, onde acusa a Câmara Municipal de Lisboa de violar o direito à habitação da Constituição e a lei de bases da Habitação, que prevê a disponibilização de apoio judiciário e alternativas aos despejos.
“A desocupação e demolição não foi precedida de um prazo (justo, atempado, proporcional) para saírem e surpreendeu as pessoas porque tinha sido garantido pelo executivo municipal, designadamente pela vereadora da Habitação, que nenhuma pessoa ficaria em situação de carência habitacional”. Acrescenta: “Esta decisão do Município de Lisboa atira as pessoas que estão nesta situação para um beco sem saída, ou vão para agregados familiares de onde fugiram, ou para agregados sobrelotados, ou viver para a rua, uma chantagem que nenhuma família deveria ter de passar. Estas pessoas tinham-se candidatado aos programas municipais de habitação, encontrando-se, há anos, a aguardar resposta.”
Na quinta-feira, depois de destruir três casas que desocupou, reduzindo-as a escombros, a Gebalis afirmou que nos próximos dias seriam desocupadas seis casas. Justificou a medida com o facto de as casas terem sido ocupadas de forma ilegal e de estarem, segundo a protecção civil, em risco. Afirmou que as pessoas já tinham sido notificadas. Segundo os moradores contabilizaram, foram mais de uma dezena de pessoas afectadas, entre elas oito crianças e uma mulher grávida. A Gebalis não soube dar o número certo de pessoas. Há anos que está planeado que aquela zona de alvenaria do Bairro de Padre Cruz vá abaixo para se construir nova habitação social - só que este é um projecto iniciado em 2010 e, como ficaram muitas casas devolutas durante anos, houve várias famílias com filhos que ocuparam as casas.
Cassandra Ferreira, com quatro filhos, um deles com três semanas, é uma das ocupantes despejadas. Passou estas noites em casa da sogra, um apartamento já sobrelotado. Afirmou que foi contactada na manhã de sexta-feira pela SCML, que se disponibilizou para ajudar no pagamento da renda de uma casa, que tinha de procurar. Cassandra enviou sugestões à SCML e esta segunda-feira estava à espera de resposta. Não a informaram de quanto era o apoio, apenas que teriam que avaliar de acordo com os seus rendimentos.
Também Sónia Moreno, mãe de três filhos a quem a Gebalis disse que iria desocupar da sua casa, diz que recebeu contacto da SCML a oferecer o mesmo apoio mas durante o fim-de-semana não tinha conseguido encontrar nenhuma casa. Tanto Cassandra Ferreira como Sónia Moreno afirmaram que aquela foi a primeira vez que a SCML se ofereceu para apoiar a renda. No local, na quinta-feira, foi oferecido um abrigo de emergência temporário, por 72 horas (normalmente pensões), aos moradores despejados.
Ao PÚBLICO, sem especificar quando é que ofereceu o apoio e que tipo de apoio, a SCML diz apenas que “dentro das suas competências providenciará apoio transitório de forma a proporcionar autonomia dos agregados em causa, sendo as famílias apoiadas de acordo com as suas necessidades e avaliação da condição de recurso, associado ao cumprimento de um plano de intervenção”.
Cassandra Ferreira recebe o Rendimento Social de Inserção (RSI) e os abonos dos filhos; o marido vai fazendo biscates. Está inscrita no concurso para apoio camarário à habitação há mais de quatro anos, ainda não lhe atribuíram casa. A mãe foi realojada e a Gebalis queria que Cassandra, o marido e quatro filhos partilhassem casa, conta. Mas isso não é possível, afirma: “Saí de casa aos 16 anos, mas não vou dizer mais”, explica a chorar. Outra alternativa que deram seria partilhar casa com a sogra, o companheiro desta, os seus três filhos e netos, tudo num T4. Ela há anos que está em lista de espera nas casas camarárias, afirma.
Já a vereadora Filipa Roseta na reunião da Assembleia Municipal de Lisboa durante a tarde de quinta-feira garantia que o processo estava a ser “acompanhadíssimo”, pela Gebalis, CML e SCML. “Cinco dos seis agregados são habitantes ou co-habitantes de alguma maneira noutra casa da Gebalis. E por questões de casamentos e para ter nova casa optaram por esta situação que obviamente não é a mais segura. Nós queremos resolver a situação, há regras e vamos seguir estas regras.”
Ao PÚBLICO a vereadora acrescentou que a solução de “longo prazo passa por uma eventual atribuição de habitação, no âmbito das candidaturas submetidas pelas famílias em igualdade de circunstâncias com os demais candidatos com carência habitacional”.