Primeiro-ministro australiano admite derrota nas eleições

Resultado marca o fim de uma quase uma década de conservadorismo na Austrália. Trabalhistas poderão governar com ecologistas.

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O trabalhista Anthony Albanese deverá ser o próximo primeiro-ministro da Austrália Reuters

O primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, reconheceu a sua derrota depois da divulgação de resultados provisórios das eleições, marcando o fim de quase uma década de governos conservadores no país. A dúvida era ainda, segundo os resultados provisórios, se o Partido Trabalhista, na oposição, tinha uma maioria absoluta ou teria de procurar aliados.

A eleição de sábado mostrou duas coisas: primeiro, uma rara vitória do centro-esquerda - segundo o diário norte-americano The New York Times, Anthony Albanese é apenas o quarto líder trabalhista a derrotar um governo de direita desde a II Guerra Mundial. Segundo, um fortalecimento de partidos que não os dois maiores (Liberal e o Trabalhista), com os Verdes a obter o seu melhor resultado de sempre e eleger pelo menos dois deputados, e com uma série de candidatos do partido de Morrison a ser derrotados por candidaturas independentes com preocupações ecologistas.

“Vimos na nossa própria política um grande grau de disrupção”, disse Morrison, apontando o número baixo dos primeiros votos (o sistema australiano tem dois) para os principais partidos. Morrison anunciou ainda que iria demitir-se na sequência dos resultados.

“Quero unir o país”, disse pelo seu lado Albanese, descrito pela Reuters como um líder pragmático de uma família de classe trabalhadora. “Penso que as pessoas querem unir-se, procurar os nossos interesses comuns, e ter um sentimento de objectivo comum”, declarou. “Penso que as pessoas estão fartas de divisão.”

Scott Morrison admitiu que o seu estilo de governação, “bulldozer” como diz de si próprio, ou “pugilista”, como o classifica o diário norte-americano The Washington Post, não agrada a todos.

Vários analistas tinham dito que a grande questão nas eleições não era qual o principal partido a gerar entusiasmo, mas sim qual o partido que conseguiria sobreviver melhor à desilusão generalizada.

“Não acredito que haja um grande entusiasmo em torno de Albanese”, disse Paul Strangio, historiador dedicado a política da Universidade de Monash, em Melbourne, ao Post. “Mas ele tem conseguido convencer o eleitorado que não é uma ameaça, que representa a mudança segura e cautelosa, e por isso é uma alternativa tolerável.”

O slogan de campanha de Albanese foi precisamente “renovação, não revolução”.

As candidaturas chamadas “independentes azul-esverdeados”, que fizeram campanha com base em políticas de integridade, igualdade e na resposta à emergência climática, tiveram bons resultados e venceram em pelo menos cinco círculos candidatos conservadores, o que quer dizer que o novo Parlamento será menos céptico em relação às alterações climáticas do que o que apoiou o Governo pró-carvão de Morrison, diz pelo seu lado a agência Reuters.

Estas candidatas – são na maioria mulheres – são assim chamadas pelas cores que usam na campanha e que também simbolizam a sua posição ideológica: azul, pela sua posição conservadora em termos económicos como o partido de Morrison, e um toque de verde, pelas maiores preocupações ecológicas do que o partido tem mostrado.

O senador liberal Simon Birmingham disse em declarações à ABC que o género foi “claramente um factor” no resultado eleitoral azul-esverdeado. Entre vários escândalos do Governo esteve uma acusação de violação de uma assessora da coligação liderada por Morrison contra um colega. A acusação levou a grandes manifestações, e pedidos de mais acção do Governo, que não foram atendidos.

A antiga ministra Julie Bishop disse que estas candidaturas foram apelativas para pessoas que sentiam que o Partido Liberal estava cada vez mais no extremo, à imagem de Morrison e o seu número dois, Barnaby Joyce, e que as vozes moderadas dentro do partido não estavam a ser ouvidas.

Muitos eleitores terão expressado a sua frustração com a falta de acção sobre as alterações climáticas após a ocorrência, nos últimos anos, de algumas das piores catástrofes naturais de sempre no país – como os incêndios de 2019 e de 2020 e as cheias de 2022.

A eleição ocorreu numa altura tensa na Austrália, comentava o Washington Post, notando a mudança nos australianos, habitualmente dos mais optimistas no mundo, mas que estão a ficar, segundo sondagens recentes, cada vez mais preocupados com a sua vida e o futuro.

Não só por causa da emergência climática, mas por “coisas como uma China cada vez mais assertiva, a guerra na Ucrânia, a crise do custo de vida”, disse Mark Kenny, professor de política na Australian National University, em Camberra, ao jornal norte-americano, tudo contribuiu para uma disposição de “cansaço, incerteza, um pouco de medo”.

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