“Papagaio afugentador” tentou mitigar a pesca acidental na Berlenga — e agora ganhou um prémio

O projecto MedAves Pesca, no âmbito do qual a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves estudou a captura acidental de aves marinhas nas águas que rodeiam a ilha da Berlenga e criou um dispositivo para combater o problema, é um dos vencedores da sexta edição do Prémio Natura 2000.

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Luna Milatovic, que integrou o júri do galardão, elogiou um dispositivo "muito original, simples, barato e que pode facilmente ser utilizado em qualquer parte do mundo" Elisabete Silva

Os vencedores da sexta edição do Prémio Natura 2000, que distingue a “excelência” na “gestão” de territórios da Rede Natura 2000,​ foram conhecidos esta quarta-feira, numa cerimónia em Bruxelas que a Comissão Europeia (CE) também transmitiu no seu site. Um deles é o projecto de conservação marinha MedAves Pesca, da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA). A organização não-governamental (ONG) tentou identificar as espécies de aves marinhas mais susceptíveis à captura acidental nas águas que rodeiam a ilha da Berlenga, ao largo de Peniche, e procurou ajudar a mitigar o problema, desenvolvendo, com pescadores locais, uma espécie de espantalho marítimo.

Espantalho marítimo ou “papagaio afugentador”. É esse o nome que a SPEA dá à sua criação. O dispositivo, que é acoplado aos barcos de pesca e vai oscilando consoante o movimento do vento — e, naturalmente, da própria embarcação —, simula a presença de um predador.

Luna Milatovic, da CEEweb for Biodiversity — rede de 53 ONG voltadas para a conservação da biodiversidade —, foi quem, na cerimónia de entrega dos prémios, anunciou o vencedor da categoria a que concorria o MedAves Pesca (conservação marinha, uma categoria inédita). Lembrou que o projecto já havia feito parte do lote de finalistas na edição de 2020 do Prémio Natura 2000. E aplaudiu o facto de a SPEA ter concorrido novamente, elogiando um dispositivo “muito original, simples, barato e que pode facilmente ser utilizado em qualquer parte do mundo”.

Luna Milatovic, que também integrou o júri do galardão, disse que o “papagaio afugentador” ajudou a reduzir a taxa de “mortalidade das aves marinhas” na ilha da Berlenga. E destacou que “os pescadores também adoraram”​ o engenho. Com o seu uso, afirmou, eles já não têm de “perder tempo a retirar aves mortas das suas redes”.

Ana Almeida, técnica de conservação marinha na SPEA, juntou-se à cerimónia de forma virtual. Descreveu o prémio como uma validação do trabalho que a ONG vem a desenvolver há uma década. “Isto é um grande incentivo para darmos continuidade ao nosso trabalho de conservação e levarmos esta e outras medidas de mitigação até outras áreas”, acrescentou.

A licenciada em Biologia Marinha e Pescas pela Universidade do Algarve sustentou que o “papagaio afugentador” não impede os pescadores de pescar as espécies pretendidas. E revelou também que a SPEA está a “trabalhar com parceiros” para levar o dispositivo até “outras áreas europeias” — e até mesmo outros continentes.

Entre a protecção do falcão-da-rainha e uma app para monitorizar as cavernas

Os vencedores das restantes categorias do galardão (conservação terrestre, comunicação, benefícios socio-económicos e cooperação transfronteiriça) foram, respectivamente, os projectos ElClimA (Grécia), New Horizons (Bulgária) e LIFE Stop Cortaderia (Espanha) e, ainda, a aplicação CaveLife (Alemanha).

O ElClimA visou melhorar os habitats do falcão-da-rainha (Falco eleonorae), uma ave rara e migratória que, pode ler-se no site da CE, é “particularmente susceptível às alterações climáticas”. O projecto New Horizons foi uma campanha de comunicação através da qual a Green Balkans — organização dedicada à conservação de animais e ecossistemas raros na Bulgária — e três organizações mediáticas sensibilizaram a população para a necessidade de conservação dos habitats.

A iniciativa LIFE Stop Cortaderia resultou de uma colaboração entre a Sociedade Ornitológica Espanhola e, em Portugal, a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia e o Instituto Politécnico de Coimbra. No seu âmbito, pessoas com diferentes tipos de incapacidades foram contratadas para tentar erradicar a erva-das-pampas (Cortaderia selloana) de cinco zonas Natura 2000 na Cantábria. Já a app CaveLife foi desenvolvida pela Federação Alemã de Espeleologia e procura monitorizar o estado dos habitats subterrâneos (e das espécies que os habitam), para tal dando tanto a especialistas como a espeleólogos amadores a possibilidade de contribuírem com informação relevante para a base de dados.

Houve ainda um prémio adicional: o Citizens’ Award, que se tratava do galardão cujo vencedor podia ser determinado pelo público. Foi distinguido o projecto com mais votos, o programa FLORA (Áustria).

Três dos 21 finalistas da sexta edição do Prémio Natura 2000 eram projectos portugueses: o MedAves Pesca, o Todos na Rede (categoria: comunicação) e o Migra Miño-Minho (categoria: cooperação transfronteiriça).