Preço do trigo recua após atingir novo recorde no mercado europeu

Contratos de entrega futura de trigo atingiram ontem valor de fecho recorde na praça de Paris, depois da decisão do governo indiano de suspender as exportações este fim de semana.

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Anna Costa / Publico

A cotação do trigo de moagem atingiu os 438,25 euros por tonelada no fecho da sessão desta segunda-feira no mercado de commodities de Paris, um recorde para esta matéria-prima agrícola na Euronext Paris, que segue esta manhã a recuar para 431,25 euros por tonelada, menos 1,60%. O preço máximo ontem atingido refere-se a contratos de entrega prevista para Setembro e é, ao fecho, o valor mais alto até agora registado, acumulando subidas desde que a Rússia invadiu a Ucrânia a 24 de Fevereiro último.

“É um recorde absoluto na Euronext [o valor atingido no fecho de 16 de Maio]” declarou o corrector Damien Vercambre, da Inter-Courtage, à Agence France-Presse (AFP), citado pela Lusa. O recorde anterior era do início de Março último.

Segundo produtor mundial de trigo, a Índia anunciou no sábado que ia interditar as suas exportações deste cereal, perante a baixa da sua produção devida nomeadamente a vagas extremas de calor. Nova Deli, que se tinha comprometido a fornecer trigo aos países frágeis dependentes das importações vindas da Ucrânia, quer assegurar a “segurança alimentar” da sua população de 1,4 mil milhões de pessoas.

A decisão vai “agravar a crise” de aprovisionamento em cereais a nível mundial, alarmou-se no sábado o G7.

Contudo, durante uma deslocação à Europa, no início de Maio, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, tinha declarado, ao lado do presidente francês, Emmanuel Macron, que estava determinado “a responder de forma coordenada e multilateral ao risco de agravação da crise alimentar, devido ao conflito na Ucrânia”.

A subida das cotações reflecte também a incerteza quanto às intenções de Nova Deli: “Os contratos já assinados devem ser respeitados, mas não se sabe o que vai acontecer a uma entrega de 500 mil toneladas de trigo ao Egipto, que está a ser negociada”, indicou Damien Vercambre à AFP, durante a abertura da sessão na Euronext.

Esta decisão de proibição é atribuída a estimativas de colheitas abaixo, em cerca de 5%, das 109 milhões de toneladas colhidas em 2021, mas não só.

“Ao contrário da Federação Russa, que tem em vigor desde há anos um sistema de quotas e taxas sobre as exportações, a Índia tem mais problemas a controlar os volumes exportados”, com numerosos produtores a trocarem os operadores públicos em benefício de compradores privados, que pagam mais pelo cereal, explicou Damien Vercambre.

Nos mercados mundiais, o impacto é tanto maior quanto a Índia estava a aumentar a sua importância neste mercado: depois de ter exportado sete milhões de toneladas em 2021, apontava agora para 10 milhões, o que aparecia a amenizar a redução das exportações ucranianas.

A Ucrânia, que estava em vias de se tornar o terceiro exportador mundial de trigo, deve ter a sua produção reduzida em um terço segundo as previsões do Departamento da Agricultura dos EUA, que estima a capacidade de exportação ucraniana em 2022 limitada a 10 milhões de toneladas, o que compara com 19 milhões no ano passado.

O preço do trigo aumentou em 40% desde o início da invasão russa da Ucrânia, incorporando também os riscos actuais de seca no sul dos EUA e Europa Ocidental.

Enquanto o conflito causado pela Rússia na Ucrânia se arrasta e se aguardam as colheitas australianas e canadianas, a promessa do trigo indiano, em fase de colheita, tinha aliviado um pouco os mercados, em particular no Médio Oriente e Ásia, clientes tradicionais da Índia.

Esta proibição indiana sobre o trigo, que se soma à da Indonésia sobre o óleo de palma, em nome da soberania alimentar, promete aumentar a pressão em países importadores, como Marrocos, cuja produção de cereais vai baixar mais de 60%, ou o Iraque, onde a falta de água provocou a redução em mais de metade as superfícies cultivadas.

Para os observadores do mercado, os preços vão continuar sustentados, porque “a procura continua a existir”.