Portugal não teria nenhuma dificuldade em fechar a torneira do gás ou do petróleo russo?

A afirmação foi proferida pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho.

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João Gomes Cravinho, ministro dos Negócios Estrangeiros Daniel Rocha

A frase

“Aquilo que está a dificultar não é nada do campo político, mas sim do campo técnico e económico [porque] há uma assimetria de impacto das sanções. Portugal, por exemplo, não teria nenhuma dificuldade em fechar amanhã a torneira do gás ou do petróleo russo”.

Afirmação do ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, citado pela Agência Lusa.

O contexto

No final da reunião informal dos ministros dos Negócios Estrangeiros da NATO, que se realizou este domingo em Berlim, João Gomes Cravinho afirmou que Portugal poderia “fechar amanhã a torneira do gás ou do petróleo russo”, numa altura em que a União Europeia tenta negociar um embargo ao petróleo russo. “Aquilo que está a dificultar não é nada do campo político, mas sim do campo técnico e económico [porque] há uma assimetria de impacto das sanções”, afirmou o ministro, com alguns países a terem maior dependência do que outros.

“Esses países [mais dependentes] pedem apoios, pedem períodos transitórios, pedem que haja, da parte da Comissão Europeia, um investimento forte no desenvolvimento de outras soluções, nomeadamente gasodutos, oleodutos e, isso, naturalmente, não se faz de um momento para o outro”, acrescentou.

Os factos

A invasão da Ucrânia pela Rússia fez accionar sanções por parte da União Europeia e de vários outros países, como os EUA. Está em curso uma tentativa de acordo entre os 27 para colocar um ponto final às importações de petróleo vindo da Rússia, e a estratégia mais abrangente é tornar o bloco europeu independente da energia russa.

Nesse contexto, e ao contrário de outros – como a Alemanha, Países Baixos, Hungria, Eslováquia e Itália –, Portugal está de facto mais bem posicionado para se libertar tanto do petróleo como do gás russo.

Depois de ter sido, por razões de preço, o principal abastecedor de Portugal de petróleo em 2017 e 2018, a Rússia acabou por desaparecer da lista de fornecedores de crude em 2020 e em 2021, cabendo a primazia, no ano passado, ao Brasil, seguido pela Nigéria (os EUA também tiveram uma presença relevante), segundo os dados da Direcção Geral de Energia e Geologia (DGEG).

No caso do gás natural, ainda há poucos dias chegou um novo carregamento russo ao terminal de Sines, mas as importações deste país representaram 6% do total no primeiro trimestre, abaixo dos 10% de 2021 (a primeira vez que Portugal importou gás natural da Rússia foi em 2019, correspondente a 2% do total), de acordo com as informações mais recentes da DGEG. A Rússia tem-se afirmado como o terceiro maior abastecedor de gás natural do país, mas está muito longe dos fornecimentos dos dois principais mercados, a Nigéria e os EUA (83% do total em 2021).

No entanto, nem tudo é positivo. Há a questão dos derivados do petróleo, e apesar de o anterior executivo socialista ter afirmado que os “produtos intermédios que se importaram” representarem “uma pequena fracção do total”, e que há alternativas no mercado, em 2021 compraram-se à Rússia 348 milhões de euros destes produtos, segundo o INE (foi a principal categoria de importações vindas da Rússia).

A Galp, que já anunciou que ia deixar de comprar produtos petrolíferos de origem russa, também afirmou que a Rússia é responsável por metade da produção mundial de gasóleo de vácuo, uma das matérias-primas utilizadas para a produção de gasóleo na refinaria de Sines. No início de Março, a petrolífera portuguesa explicou que estava à procura de fornecedores alternativos, podendo também “operar a refinaria a um ritmo limitado, embora assegurando sempre o fornecimento de gasóleo ao mercado português”.

Depois, há a questão dos efeitos do corte de compras energéticas à Rússia, com aumento de preços e impactos negativos na economia, aos quais Portugal não fica imune.

Em suma

O ministro João Gomes Cravinho tem razão em relação à dependência directa de Portugal do petróleo e do gás natural russo em termos de abastecimento energético – seria a isso a que o ministro se referia – , mas o país não está imune aos impactos negativos da dependência dos produtos energéticos russos por parte de vários países da União Europeia.

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