Portugal espera que conferência dos Oceanos da ONU produza “declaração robusta”
Vice-presidente da comissão organizadora da conferência global, Alexandre Leitão, diz ser necessário passar a mensagem de que o oceano poderá ser “um conjunto de páginas gloriosas do nosso futuro” e não apenas “um conjunto de páginas gloriosas da nossa história”.
Portugal espera que a conferência das Nações Unidas sobre Oceanos que vai realizar-se em Lisboa produza uma “declaração robusta” em defesa da vida marinha, disse em entrevista à agência Lusa o vice-presidente da comissão organizadora da conferência global.
“Um dos objectivos substantivos é termos uma declaração robusta, negociada por consenso, tanto quanto possível simples e concisa e que ilustre quão importante é dar seguimento ao Objectivo de Desenvolvimento Sustentável 14 [ODS14]”, disse Alexandre Leitão.
Para o representante de Portugal na organização da Conferência dos Oceanos 2022, que decorrerá entre 27 de Junho e 1 de Julho, a concretização do ODS14, referente à protecção da vida marinha, deve “incidir sobre soluções baseadas na ciência, sobre trazer a ciência para bordo deste processo”.
No quadro da ONU, o documento final da conferência terá de ser consensual e está a ser negociado em Nova Iorque, estando actualmente, segundo Alexandre Leitão, na terceira versão provisória.
“A dificuldade destes exercícios consensuais é que basta um país não querer por alguma razão, e temos um contexto internacional que não é propício a acordos consensuais, basta um país não querer para que uma declaração não possa ser aprovada ou então tenha de ficar num menor denominador comum, quase inócuo. Esperemos que não”, disse o vice-presidente da comissão organizadora da conferência da ONU.
Um dos horizontes do ODS14 é conseguir que até 2030 pelo menos 30% da superfície global dos oceanos tenham algum estatuto de áreas protegidas, um objectivo com o qual, afirmou Alexandre Leitão na entrevista à Lusa, Portugal está comprometido – apesar de actualmente ter apenas cerca de 3% das suas águas classificadas – mas que enfrenta as dificuldades inerentes à mobilização de países com interesses próprios, distintos e por vezes conflituantes.
“O processo obviamente está numa fase lenta, de início, que é própria disto, e obviamente que não é fácil conseguir que todas as nações costeiras tomem as mesmas medidas e que 30% das águas estejam protegidas”, disse o representante de Portugal, que adopta a postura de diplomata que gosta de “ver o copo meio cheio em vez de meio vazio” para olhar para as complexidades das negociações.
“Se acharmos que resolvemos os problemas no dia seguinte, sairemos sempre em desespero e com o copo completamente vazio. Mas se quisermos olhar para os processos e percebermos que, como dizia o falecido Presidente (francês, François) Mitterrand, é preciso saber viver com a lentidão da história, os processos vão acontecendo e desde que haja progressos é sempre positivo mesmo que não com a rapidez desejada. Desde que não haja retrocessos, já estamos numa faixa positiva”, afirmou.
Alexandre Leitão reconheceu que “quando há conflitos como na Ucrânia, todo o processo no mínimo trava para não dizer que sofre um retrocesso”, mas adiantou que “por vezes as crises provocam efeitos sistémicos que levam à aceleração de soluções inovadoras”.
Sobre o significado da conferência para Portugal, Alexandre Leitão defendeu que é “uma oportunidade para consciencializar a sociedade portuguesa de que o oceano é algo mais do que uma praia, do que um sítio de onde vêm as sardinhas ou onde andam barcos”.
O representante de Portugal na organização da Conferência dos Oceanos 2022 afirmou que é necessário passar a mensagem de que o oceano “pode ser não só um conjunto de páginas gloriosas da nossa história, mas também um conjunto de páginas gloriosas do nosso futuro”.
“Vamos tentar que os nossos mais relevantes actores tenham ali o seu palco, não apenas políticos, mas da sociedade civil”, adiantou.
Alexandre Leitão apontou também como trabalho central da conferência em Lisboa “fazer um inventário dos compromissos assumidos por Estados e outras entidades desde a primeira conferência em 2017”, que se realizou nas Nações Unidas, em Nova Iorque, área onde há também muito caminho a percorrer.
“Algumas potências estão muito longe de mostrarem um comprometimento efectivo profundo com a preservação da biodiversidade, com a despoluição, desde logo dos plásticos e com a redução de facto das emissões de gases com efeito de estufa” afirmou.
Apesar do reconhecimento da distância a percorrer, “o facto de vários países mundiais, de várias grandes potências emissoras (de gases com efeito de estufa) terem assumido durante o ano de 2021 – a começar pelos Estados Unidos, que voltaram ao Acordo de Paris de 2015 – metas de neutralidade carbónica para 2050 que são ambiciosas” permite ao diplomata defender que o copo está meio cheio.
E para defender a importância da conferência sobre os oceanos que Lisboa irá receber, Alexandre Leitão deixou o alerta de que “não faz sentido estarmos comprometidos com os objectivos de Paris e outros e depois fazer de conta que não existe esse vastíssimo meio que ocupa 71% da superfície do planeta que produz metade do oxigénio que é o maior armazenador de carbono que existe”.