A emancipação da geração XXI no FC Porto

A influência que quatro jogadores da formação estão a ter na caminhada dos “azuis e brancos”.

Foto
Vitinha LUSA/JOSE COELHO

Apenas dois começaram como titulares, mas a época 2021-22 do FC Porto ficará indubitavelmente assinalada como a temporada da emancipação da geração XXI. Diogo Costa, João Mário, Vitinha e Fábio Vieira, jogadores formados no Olival e nascidos na viragem do século, afirmaram-se ao longo dos últimos meses como trunfos decisivos para Sérgio Conceição e, após mais de uma década sem referências formadas no clube, este quarteto trouxe ao FC Porto um upgrade face ao que, nos anos 80 e 90 do século XX, os adeptos “azuis e brancos” definiam como um “jogador à Porto”.

Desde que, em 2017-18, chegou ao FC Porto com a missão de tentar impedir que o Benfica conquistasse o pentacampeonato, Sérgio Conceição ganhou dois títulos nacionais (e está muito perto de fechar o terceiro). Nunca de forma consecutiva, sempre com contextos bem diferentes.

Se, na primeira época, o técnico conseguiu, num clube intervencionado pela UEFA e com uma equipa reforçada apenas com o regresso de atletas que tinham sido emprestados, deixar o Benfica a sete pontos, em 2019-20, com contratações cirúrgicas (Uribe e Luis Díaz) e prestações extraordinárias de Corona e Alex Telles, Conceição protagonizou uma histórica recuperação, conquistando o título após ter estado, a meio da temporada, a sete pontos do Benfica.

Desta vez, a caminhada do FC Porto em 2021-22 está, pela primeira vez, repleta de ADN do Olival. A aposta em jogadores da formação não foi, no entanto, definida como prioritária ou estratégica pela estrutura portista. A ascensão de Diogo Costa, João Mário, Vitinha e Fábio Vieira — sendo mais jovem, Francisco Conceição está num patamar de afirmação inferior —, deveu-se a uma equação com algumas variáveis (lesões, lacunas no plantel e, acima de tudo, qualidade do quarteto) que criaram a oportunidade perfeita para estes jovens.

O primeiro a acumular jogos consecutivos como titular foi João Mário. Há cerca de um ano, na Luz, o jogador de São João da Madeira entrou aos 69’ e, cinco minutos depois, assistiu Uribe para o golo que garantiu ao FC Porto um empate. A partir daí, a posição na direita da defesa, carente de qualidade desde a saída de Layún, Maxi e Ricardo Pereira, passou a ser do “23”.

O internacional sub-21, no entanto, nunca escondeu que chegou a torcer o nariz ao recuo no terreno: “Num primeiro momento, não me agradou, pois sempre joguei mais à frente. Adaptei-me, comecei a assimilar processos e agora sinto-me adaptado.”

Janela de oportunidade na baliza

Se a falta de opções foi o gatilho para a afirmação de João Mário, o senhor que se seguiu (Diogo Costa) teve que esperar pelo infortúnio de um colega. Titularíssimo durante duas épocas e consensualmente elogiado pelos adeptos, Marchesín participou em apenas um jogo da pré-temporada depois de ter integrado a selecção da Argentina que conquistou a Copa América.

Com Diogo Costa a dar uma boa resposta, Conceição apostou no jovem no arranque do campeonato. Pouco depois, acabando com as dúvidas sobre quem seria o dono da baliza, o argentino foi operado ao joelho. O resto da história é a confirmação do que já se sabia: com uma maturidade invulgar e um excelente jogo de pés, Diogo Costa afirmou-se primeiro no seu clube, destronando mais tarde Rui Patrício como o n.º 1 de Portugal.

O percurso de Fábio Vieira é o que tem mais altos e baixos. Com qualidade para jogar em várias posições do meio-campo e ataque, o potencial do criativo canhoto, o mais irreverente e imprevisível da “geração XXI”, é conhecido há muito, mas, em Fevereiro do ano passado, houve um jogo que colocou um travão à sua afirmação.

No derby no Dragão, com o Boavista, o médio foi substituído ao intervalo quando o FC Porto perdia por 0-2. No final, Conceição, visivelmente incomodado, deixou uma mensagem dura: “A primeira parte foi desastrosa. Entraram as camisolas, mas elas não jogam. É preciso correr, ter dinâmica e depois da perda da bola reagir. Para jogar no FC Porto não basta ter contrato. Não basta ser da formação ou ser bonito nas redes sociais.” O nome de Fábio Vieira não foi referido pelo treinador, mas o médio só voltou a jogar cinco semanas depois… na equipa B.

Apesar deste episódio e de a aposta de Sérgio Conceição em Vieira não ser constante, é indiscutível que o capitão da selecção de sub-21 é um dos mais talentosos jogadores da nova geração do futebol português e os seus números desta época na I Liga reflectem isso mesmo: seis golos e 13 assistências.

Se o percurso de Diogo Costa, João Mário e Fábio Vieira nas camadas jovens portistas já fazia antever uma carreira de sucesso e teve como um dos pontos altos a vitória na Youth League em 2018-19, Vitinha é o que mais tem surpreendido pela forma como se tem afirmado.

Nem sempre titular nas camadas jovens, o médio de Santo Tirso foi suplente nessa final da Youth League contra o Chelsea (Fábio Vieira, Baró e Ndiaye formaram o trio de meio-campo), e, na época passada, com os “dragões” a precisarem de liquidez financeira, Vitinha foi emprestado ao Wolverhampton, com uma cláusula de opção de compra de 20 milhões de euros.

Para alívio dos adeptos, os ingleses não accionaram a cláusula e o rendimento actual do médio comprova que o Wolverhampton deixou fugir uma pechincha. Agradece Sérgio Conceição e a SAD portista, que já deverá ter em carteira ofertas bem superiores pelo mais recente internacional “A” português.

Num clube em que, até ao final do século XX, os símbolos do FC Porto eram portugueses e tinham como imagem de marca a combatividade e a raça (são exemplos João Pinto, André, Paulinho Santos, Fernando Couto ou Jorge Costa), Diogo Costa, João Mário, Fábio Vieira e Vitinha recuperaram essas características do “jogador à Porto” formado no clube, mas trazem um upgrade a essa marca: acrescentam talento, qualidade técnica e uma maturidade invulgar para a idade.

Sugerir correcção
Comentar