Universidade de Coimbra desenvolve projecto para combater má nutrição no mundo
O projecto passa pela produção de microcápsulas em compostos bioactivos extraídos de moringa oleifera, conhecida como a planta da vida, que serão incorporadas em determinados alimentos (pão, iogurtes e sumos), para crianças em idade escolar.
O combate à desnutrição infantil em países em vias de desenvolvimento é o principal objectivo do projecto “Morfood”, uma investigação em curso na Universidade de Coimbra (UC), que também reúne investigadores da Universidade do Porto e da Universidade Agostinho Neto (em Angola). O trabalho explora mais ainda o potencial de uma planta, a moringa oleifera, uma planta muito nutritiva e que já é usada para tratar algumas doenças.
O “Morfood” passa pela produção de microcápsulas “em compostos bioactivos extraídos de moringa oleifera, conhecida como a planta da vida, que serão incorporadas em determinados alimentos (pão, iogurtes e sumos) para crianças em idade escolar, entre os quatro e os dez anos”, explicou a UC, em nota enviada esta quarta-feira. O projecto, que vai buscar o nome à “microencapsulação de extractos de moringa oleífera e sua aplicação em alimentos funcionais”, é liderado pelo investigador Licínio Ferreira, da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCTUC), e engloba investigadores da Faculdade de Farmácia (FFUC), PRODEQ - Associação sem fins lucrativos do Departamento de Engenharia Química (DEQ) da FCTUC, Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e Universidade Agostinho Neto (UAN).
A moringa oleífera é uma espécie nativa do norte da Índia, Paquistão e Afeganistão, e muito cultivada em países tropicais e subtropicais de África, Ásia e América Latina. “É umas das plantas mais nutritivas do mundo, muito rica, por exemplo, em proteínas, vitaminas e minerais, como cálcio e potássio. É uma planta que já é utilizada pelas populações africanas para combater um conjunto alargado de patologias, tais como asma, bronquite, hipertensão, diabetes, entre muitas outras. O nosso estudo centra-se nos extractos das folhas, a parte da planta mais rica em nutrientes”, explicou, citado no comunicado, Licínio Ferreira.
A equipa liderada pelo também investigador do Centro de Investigação em Engenharia dos Processos Químicos e dos Produtos da Floresta (CIEPQPF) “apostou na microencapsulação para enriquecer os alimentos”, porque, segundo Licínio Ferreira, é “uma tecnologia que apresenta muitas vantagens”. “Protege a actividade biológica de alguns compostos que são extraídos da planta e que de outra forma se degradariam. Por exemplo, no caso do pão, um dos alimentos que seleccionámos, as microcápsulas podem ser introduzidas na própria farinha, e se os compostos não estiverem incorporados dentro destas microcápsulas, as suas propriedades iriam degradar-se e desaparecer durante o fabrico do pão, daí a importância das microcápsulas”, revelou o docente da FCTUC.
Apurar a fórmula
Nesta primeira etapa do projecto, os investigadores estão a caracterizar as amostras de folhas de moringa provenientes de Angola, de modo a obter a composição fitoquímica e nutricional das folhas. Após essa caracterização, “que é fundamental”, seguem-se os estudos de extracção de compostos e selecção dos mais adequados ao objectivo do projecto, ou seja, compostos importantes para combater a desnutrição infantil, frisou a UC.
Ainda antes da fase da microencapsulação, os extractos serão seleccionados, “porque, eventualmente, haverá compostos indesejáveis que têm de ser removidos”. “Desta selecção, obteremos fracções enriquecidas de macronutrientes e micronutrientes que são benéficos para combater a desnutrição infantil, nomeadamente hidratos de carbono, vitaminas, sais minerais, entre outros”, esclareceu. No final do projecto, os alimentos funcionais, isto é, enriquecidos “com microcápsulas carregadas de nutrientes extraídos de moringa, vão ser testados junto de crianças angolanas”, referiu a Universidade de Coimbra. “São os chamados testes de aceitabilidade sensorial, para aferir a reacção da população infantil a este tipo de alimentos”.
Natural de Angola e conhecedor da realidade naquele país africano, Licínio Ferreira observou que a desnutrição infantil é um grande flagelo mundial. “Segundo o relatório de 2020 da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), cerca de 8,9% da população mundial estava desnutrida em 2019, o que representa 690 milhões de pessoas. Ainda segundo esse relatório, este número corresponde a um aumento de 60 milhões de pessoas em comparação a 2014. É um flagelo que tende a agravar-se ao longo dos anos”, afirmou.
Se o projecto alcançar os resultados esperados, a equipa irá tentar estabelecer uma parceria com a UNICEF (o Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância), para que os alimentos enriquecidos com extractos de moringa “possam chegar a um maior número de países em vias de desenvolvimento”. O projecto Morfood tem a duração de três anos e foi financiado em cerca de 230 mil euros pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia e ela Fundação Aga Khan, “fundação que apoia projectos nos domínios da saúde e educação, nomeadamente o desenvolvimento científico e tecnológico dirigido ao progresso da qualidade de vida no continente africano”.