Bispos encorajam vítimas de abusos sexuais da Igreja a queixarem-se

“Acompanhamos-vos na vossa dor, queremos ajudar a repará-la e tudo faremos para prevenir situações como as que tiveram de enfrentar”, declarou presidente da Conferência Episcopal Portuguesa.

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Daniel Rocha

O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, José Ornelas, reafirmou este domingo “o pedido de perdão, em nome da Igreja Católica” às vítimas de abuso no seu seio, e o “empenho em ajudar a sarar as feridas”.

“Às pessoas que passaram pela dramática situação do abuso reafirmamos o nosso pedido de perdão, em nome da Igreja Católica, e o nosso empenho em ajudar a sarar as feridas. Queremos deixar também uma palavra de profunda gratidão a quem já se aproximou para contar a sua dura história, superando compreensíveis resistências interiores, marcadas certamente por feridas profundas”, declarou o também bispo de Leiria-Fátima.

Ao falar na abertura dos trabalhos da assembleia plenária da Conferência Episcopal, que começou este domingo em Fátima, Ornelas deixou uma palavra de encorajamento aos que “ainda procuram o momento mais apropriado para se referirem ao que nunca devia ter acontecido nas suas vidas, para que o façam”.

“Estamos convosco: acompanhamos-vos na vossa dor, queremos ajudar a repará-la e tudo faremos para prevenir situações como as que tiveram de enfrentar”, garantiu, acrescentando que “este tema terá um lugar de destaque nos trabalhos” da assembleia plenária, “exigindo acompanhamento activo e cuidado para pôr em prática processos e atitudes que defendam a integridade, a dignidade e o futuro de todas as pessoas, particularmente as crianças e aqueles que se encontram em situação de fragilidade, na Igreja e na sociedade”.

“Sentimos o imperativo do Evangelho que anunciamos e que implica a promoção de uma cultura de respeito e dignidade que favoreça o são desenvolvimento de cada pessoa e ajude a sarar as feridas que permaneçam abertas”, frisou, destacando o trabalho feito pela Igreja Católica em Portugal, desde que o Papa Francisco publicou em 2019 a carta apostólica Vós Sois a Luz do Mundo: “Entre 2019 e 2020 todas as dioceses criaram as respectivas comissões diocesanas de protecção de menores e, em Fevereiro de 2022, foi constituída uma coordenação nacional destas mesmas comissões”.

“Paralelamente, e por iniciativa da Conferência Episcopal, foi criada uma comissão independente para o estudo de abusos sexuais na Igreja Católica Portuguesa, com o objectivo de realizar um estudo que vise o apuramento histórico desta questão, assim como o de criar uma estrutura de “escuta” a nível nacional”, recordou.

A 12 de Abril, esta comissão independente revelou ter recebido desde Janeiro 290 testemunhos válidos de vítimas, tendo 16 destes casos sido já remetidos ao Ministério Público. Na ocasião, o coordenador da comissão, Pedro Strecht, afirmou que os primeiros meses de trabalho permitiram confirmar que “houve, no passado, múltiplos casos de abuso sexual” e destacou a posição de fragilidade das vítimas que as levou, na maioria dos casos, a não denunciar atempadamente os crimes.

Quanto aos agressores, a comissão não apontou números concretos, mas admitiu que a maioria dos abusos foi cometida por pessoas directamente ligadas à Igreja Católica. Por outro lado, Pedro Strecht reconheceu que já foi possível identificar situações de ocultação ou encobrimento, incluindo por parte de bispos que continuam no activo.

A metodologia de acesso aos arquivos diocesanos pela comissão liderada por Pedro Strecht deverá ficar definida na reunião que se iniciou este domingo em Fátima.