UEFA Youth League. Afinal, o Benfica podia voltar a ganhar finais europeias
Com a goleada frente ao RB Salzburgo, na Suíça, o Benfica conquistou a Youth League pela primeira vez, depois de três finais perdidas. Pelo menos nos “miúdos”, a “maldição” está interrompida.
Reza a lenda que Béla Guttmann disse, na década de 60, que o Benfica nem dali a 100 anos venceria uma prova internacional de futebol. Não se sabe se é verdade ou se um mito construído em cima de uma mentira, mas a profecia do técnico húngaro parece só ainda ser válida para os homens. Nos “miúdos”, o Benfica sabe e pode, afinal, ganhar finais europeias.
A equipa portuguesa conquistou nesta segunda-feira a Youth League, o equivalente à Liga dos Campeões, mas para o escalão sub-19. Com o triunfo (6-0) frente ao RB Salzburgo, em Nyon, na Suíça, o Benfica venceu a competição pela primeira vez, depois de três finais perdidas e juntou-se ao FC Porto como equipas nacionais com este troféu no museu.
Como trivialidade, esta conquista foi também, entre provas de relevância continental, a primeira desde a década de 60 numa prova europeia de futebol, depois de finais perdidas nesta Champions dos miúdos, na dos graúdos e na Liga Europa/Taça UEFA.
O Benfica entrou para este jogo com motivos de confiança em quatro planos diferentes. Internamente, o presidente Rui Costa fez questão de almoçar com a equipa, promovendo um dia diferente para os jovens “encarnados”.
Mas também de fora houve motivação adicional: com uma final na Suíça foram muitos os emigrantes a apoiarem a equipa perto do hotel e, claro, no Centre Sportif de Colovray.
Mas houve mais. Roko Simic, jogador mais renomado do Salzburgo, fez questão de se predispor às sempre perigosas “bocas” de auto-confiança, dizendo que ia ser o melhor marcador da prova – algo que o obrigaria a marcar pelo menos dois golos ao Benfica. Não só não marcou nenhum como passou quase despercebido na partida.
Por fim, o Benfica ainda recebeu uma “prenda”. É certo que não teve o guarda-redes Samuel Soares, suspenso pela expulsão na meia-final, mas isso permitiu ao treinador Luís Castro inscrever mais um jogador acima dos 19 anos (são permitidos três). Henrique Araújo foi “roubado” a Nélson Veríssimo e foi titular nesta final, com três golos marcados.
Entrada a ganhar
A estes quatro prismas de confiança redobrada, o Benfica acrescentou um quinto: um golo no segundo minuto do jogo.
Cher Ndour conduziu a bola pela esquerda, cruzou para Henrique Araújo e a finalização do avançado, defendida pelo guardião dos austríacos, foi parar aos pés de Pedro Santos. O ala assistiu Diego Moreira, que deixou, de primeira, Martim Neto na cara do golo.
Henrique Araújo estava a começar o jogo aos poucos. Aos 2’, teve “dedo” na jogada do golo. Aos 7’, fez, ele próprio, uma jogada individual que o deixou perto do 2-0. Aos 15’, foi a vez de ser ele o finalizador. Martim Neto conduziu pela direita e cruzou rasteiro para o golo de Araújo.
Em poucos minutos, o Benfica desequilibrou um jogo que se manteve igual ao que estava a ser. Frente a um 4x4x2 losango, os “encarnados” sabiam que, sem bola, teriam muitos adversários capazes de jogarem por dentro, mas que, em posse, o sistema do Salzburgo poderia ter fragilidades.
Abrindo muito os laterais, o Benfica obrigava os médios-interiores do Salzburgo a “esticarem” o losango. Por extensão, o Benfica ficava, assim, com algum espaço para colocar passes verticais na zona central do terreno.
Com qualidade técnica nos centrais Tomás Araújo e António Silva, então estava tudo pronto para serem colocadas bolas nos apoios frontais de Henrique Araújo ou mesmo nos médios Martim Neto e Ndour.
Para o Benfica, estava a ser um jogo a roçar a perfeição: pouco ou nada permitia ao Salzburgo, construía com qualidade (e variedade de soluções) e definia ainda melhor.
Só aos 37’ o Salzburgo conseguiu criar perigo e foi numa “oferta” de Jevsenak, que entregou a bola a Simic – valeu a grande defesa de André Gomes, que repetiu a dose minutos depois, num cabeceamento de Wallner.
Aos 45’, Pedro Santos soltou-se na direita e tinha a possibilidade de assistir dois colegas para o golo fácil, mas não resistiu à tentação de tentar o golo, rematando fraco. Do lado oposto, Simic voltou a tentar entrar no jogo – e entrou pouco na primeira parte –, mas André Gomes, de apenas 17 anos, voltou a provar que o estatuto de suplente não faz justiça ao valor individual que mostrou ter.
Tudo fácil
O Salzburgo ia crescendo no jogo e estava mais capaz de jogar, sobretudo porque estava a ter maior variedade de soluções. Incapaz de criar desde trás, foi intercalando saídas curtas com bolas a atacar o espaço ou até mesmo em jogo directo para os avançados, algo que tirou ao Benfica alguma estabilidade de referências nas zonas de pressão.
Mas se os “encarnados” ficaram menos capazes de entender como suster defensivamente o Salzburgo, ficaram, por outro lado, com ainda mais espaço para ferirem o adversário em transições – e isso foi ficando mais claro com o passar dos minutos, pela audácia crescente dos austríacos.
E aos 52’, com o Salzburgo desposicionado, houve espaço para Pedro Santos atacar pelo corredor e cruzar para a finalização de Ndour.
Aparentemente, o jogo estava feito, até porque quanto mais o Salzburgo quisesse reverter o cenário mais espaço abriria para os endiabrados atacantes “encarnados”. Dito e feito. Aos 57’, Diego Moreira teve um pormenor técnico de classe no meio-campo, arrancou por ali fora, isolou Henrique Araújo e o avançado não quis ficar atrás do colega: driblou o guarda-redes com a sola da bota e empurrou para a baliza deserta. Ainda houve tempo para a mão-cheia, por Luís Semedo, com passe de Pedro Santos, e para a meia-dúzia, com penálti de Henrique Araújo.
Nesta altura do jogo, o cenário colectivo era de título garantido e desempenho quase perfeito e o individual era de três golos de Henrique Araújo, duas assistências de Diego Moreira, outras duas de Pedro Santos e um golo e uma assistência de Martim Neto.
Qual o melhor? Talvez nenhum, já que o Benfica venceu, nesta segunda-feira, por ter sido indiscutivelmente melhor do que o Salzburgo no plano colectivo. Depois, o talento individual fez o resto.