Um país rico como a Suíça não alimenta bem os seus refugiados ucranianos
Quem foge da Ucrânia recebe uma verba do Governo suíço que não é suficiente para viver num país com um dos mais altos custos de vida do mundo. Aqueles que vivem com famílias de acolhimento nem sequer têm direito a subsídio.
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Os 40 mil refugiados ucranianos que chegaram à Suíça desde o princípio da invasão russa da Ucrânia enfrentam dificuldades para conseguirem sobreviver. Nem mesmo aqueles que recebem uma verba do Estado suíço, conseguem aguentar sem ajuda num país com um dos custos de vida mais altos do mundo. Isso faz com que muitos tenham de recorrer às entregas de alimentos de organizações não-governamentais ou de beneficência.
Os que recebem uma verba ainda são os felizardos, pois cerca de metade dos ucranianos que chegou ao país, segundo as autoridades, vive com famílias de acolhimento e para esses não há segurança social que lhes acuda com algum subsídio.
Como relatam jornalistas da Reuters em Zurique, este sábado centenas de imigrantes ucranianos faziam fila para receber comida nos bancos de alimentos do centro da cidade. As organizações de beneficência relatam que recebem cada vez mais ucranianos em busca de comida, roupa e tratamento médico.
“Viemos aqui buscar comida porque precisamos”, conta à Reuteres Kristina, de 42 anos, que não quis dar o seu apelido. “A nossa voluntária [a pessoa que os recebeu em sua casa] não nos pode estar sempre a dar comida. Ela está cansada e também não tem muito dinheiro.”
Como explica Ariane Stocklin, da organização cristã Incontro, “alguns refugiados estão com famílias que já não conseguem pagar a comida. Outros estão em centros de refugiados, onde a comida é insuficiente. Estamos a ver muita necessidade.”
Mesmo antes da crise ucraniana, já os subsídios pagos pelo Estado aos refugiados não eram suficientes para viver em determinados locais da Suíça, onde o custo de vista é muito alto. Os suíços votaram em referendo em 2017 para diminuir os subsídios aos refugiados para cerca de 500 francos suíços (484 euros), 30% abaixo dos subsídios normais da segurança social.
Segundo Heike Isselhorst, porta-voz da segurança social de Zurique, os ucranianos alojados pelo Estado tem as suas necessidades básicas garantidas. O mesmo não se pode dizer daqueles que estão alojados com famílias de acolhimento, porque não foi estabelecido nenhum mecanismo de ajuda para eles, explicou à mesma agência.
Sem limites
A ministra da Justiça suíça, Karin Keller-Sutter, afirmou recentemente à televisão pública suíça RTS que o país não tenciona limitar a entrada de refugiados ucranianos no país: “Não vejo como a Suíça poderá recusar a entrada a mulheres e crianças que chegam à sua fronteira”.
Até esse momento pelos canais do Estado já haviam sido registados 28 mil ucranianos, sendo que 23.300 tinham recebido autorizações de residência S, um estatuto especial que lhes permite ficar por um ano no país e aceder ao mercado de trabalho.
Mas a governante reconhecia que a chegada diária de 700 a 1400 refugiados desde meados de Março estava a provocar problemas, porque receber tantas pessoas é “muito complexo”.
Gaby Szoelloesy, coordenadora dos departamentos de segurança social do cantão de Zurique, pediu esta semana desculpa às famílias de acolhimento dos refugiados por estarem a ser menosprezadas neste esforço para receber os refugiados que fogem do conflito na Ucrânia.
“Mas é mesmo muito, muito difícil, se nem quer sabemos do compromisso da família de acolhimento porque não passou através dos canais oficiais”, disse em conferência de imprensa.
Anna, uma ucraniana de 38 anos que chegou a Winterthur, nos subúrbios de Zurique, no final de Fevereiro, com a mãe e dois filhos, e está agora a viver no apartamento dos pais de um amigo, reclama das condições nos centros de acolhimento.
“Dormimos num centro para refugiados quando chegámos, mas não era um bom lugar para crianças – sem privacidade, comida má. Éramos sempre revistados cada vez que vínhamos à rua”, explica.
Karin Keller-Sutter reconhece que a situação não é das melhores e que as autoridades precisam de encontrar “soluções rápidas e desburocratrizadas” para lidar com a questão do influxo de refugiados e, para isso, os cantões têm de trabalhar em conjunto para evitar o mar de críticas.
“Não causa boa impressão e não é do interesse da população que espera que façamos o nosso trabalho de maneira serena”, afirmou a ministra.