Terra: a nossa última fronteira

É sempre útil identificarmos os desafios que temos rumo à sustentabilidade. Partilham-se os cinco desafios eleitos à escala global, em Portugal e a nível individual.

Em tempos de guerra e de recuperação de pandemia, percebemos mais facilmente que só poderemos ter melhores dias para o planeta se houver uma mudança de paradigma no que respeita às necessidades e expectativas, pelas pessoas, pela prosperidade, pelo planeta, pela paz e através de parcerias. Até agora temos vivido numa sociedade em que impera o consumo como base da felicidade e da qualidade de vida. Mudarmos a bússola mental de objetivos de crescimento para metas de suficiência não é de forma alguma fácil, porque está enraizado em nós um modelo de sociedade predador de recursos. Continuamos sem assumir que a natureza sobrevive sem nós, enquanto o contrário não é válido. Mesmo assim, é difícil fazermos a mudança profunda individual e coletiva imprescindível quando estamos a ultrapassar os pontos de rutura de várias partes do sistema terrestre.

Os cidadãos procuram o bem-estar social, económico e ambiental. O bem-estar económico, na forma de prosperidade para todos, começa nomeadamente na redistribuição dos cuidados de saúde. O bem-estar social, sinónimo de qualidade, traduz-se em serviços públicos inclusivos e a preços adequados, apostando na promoção da diversidade cultural e no cuidar da própria sociedade. O bem-estar ambiental reside em proporcionarmos um ambiente natural saudável que suporte a vida, proteja os solos, águas e ar, assegurando uma alimentação saudável e onde o impacte nas alterações climáticas seja minimizado. É fundamental aumentar a confiança das pessoas nas instituições e nas empresas, assegurando que os interesses comerciais e corporativos não ultrapassam o interesse público. É crucial não deixar ninguém para trás, vivendo tanto quanto possível dos recursos renováveis que geramos. Temos também de eliminar progressivamente subsídios públicos perversos, especialmente para produção de alimentos insustentáveis e combustíveis fósseis.

A economia circular deve ser uma das prioridades. No fundo, não é nada mais do que conseguirmos garantir recursos suficientes para todos, num planeta que está sobre-explorado, reintroduzindo os materiais o mais possível na cadeia de consumo sem irmos buscar novos recursos, evitando também o desperdício. Para tal, é crucial que seja dada verdadeira prioridade à redução de consumo, à reutilização, e depois à reciclagem, contrariando uma sociedade em que o importante, para cada um, é o ter — e não o ser. É fundamental a prevenção da utilização de recursos, a possibilidade de reparação, reutilização, atualização, a facilidade de reciclagem dos diferentes recursos, o uso de fontes sustentáveis dos materiais ou ainda a remoção de substâncias perigosas.

No quadro do Acordo de Paris, assegurar um balanço neutro de carbono entre os sumidouros e as emissões de gases resultantes das atividades humanas implicará pôr em causa todo o nosso paradigma económico e trará profundas modificações sociais e ambientais. Esse será um mundo com perto de 100% da energia proveniente de fontes renováveis, onde o uso dos recursos deverá ser 100% suficiente. Tal merece um profundo planeamento, que deve ser flexível ao longo do tempo, e que deve merecer um grande consenso político e institucional, para além de uma participação empenhada de todos os setores da sociedade.

É sempre útil identificarmos os desafios que temos rumo à sustentabilidade. Entre os cinco eleitos, destacaria: exigir transparência e rigor da informação de suporte à decisão; prevenir conflitos e promover uma abordagem dialogante em linha com a sustentabilidade; não efetuar investimentos ociosos; antecipar decisões que condicionem objetivos; e envolver os agentes principais de decisão, mas também a população.

No caso de Portugal, as cinco prioridades são: apostar na qualidade de vida e bem-estar, principalmente nas cidades; aumentar a ambição climática; assegurar a adaptação às alterações climáticas; preservar a biodiversidade única que tem, valorizando os serviços dos ecossistemas e desenvolver uma agricultura e floresta sustentáveis; e implementar verdadeiramente os princípios de uma economia circular. À escala individual, deveremos: mudar o paradigma de consumo apostando na suficiência e na redução do desperdício; assumir uma mobilidade mais sustentável; investir na eficiência energética dos edifícios; mudar os nossos hábitos alimentares reduzindo o consumo de carne e peixe; e fazer um esforço para participarmos nos processos de decisão e aumentar a pressão sobre os governos e empresas rumo à sustentabilidade.

Se o monólogo da série e filme O Caminho das Estrelas (Star Trek) nos parece inspirador, adaptemos o texto para aquilo que é uma necessidade absoluta de salvaguardarmos este planeta único em que nos encontramos numa viagem pela sua preservação. Encaremos esta missão contínua de protegermos o nosso mundo, as nossas vidas e a nossa civilização. Para ir corajosamente onde nenhum Homem foi antes. Terra: a nossa última fronteira é o maior desafio que temos pela frente.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico