Estará Portugal preparado para ser um líder mundial na proteção do oceano?

É fundamental que Portugal assuma uma postura progressista, ao implementar uma moratória à mineração marinha em território nacional.

Lisboa acolhe, na última semana de junho, a II Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, coorganizada pelos Governos de Portugal e do Quénia. Sob o lema “Salvar o oceano, proteger o futuro”, a conferência dedica-se ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14 – “Proteger a vida debaixo de água” –, tendo por isso os olhos dos 193 Estados que compõem a ONU postos em Lisboa.

Esta conferência afigura-se como determinante, numa altura em que são exigidos aos nossos líderes compromissos ambiciosos, corajosos e que respondam com eficácia à crise provocada pela emergência climática e da biodiversidade. Portugal tem-se posicionado publicamente nos últimos anos como um dos países na linha da frente da conservação marinha e é agora necessário, mais do que nunca, que as palavras deem lugar aos atos.

No final de março, após alguns rumores sobre a possível extinção do Ministério do Mar – que investigadores e ONG consideraram dramática –, a nomeação do novo Governo trouxe algumas surpresas, entre as quais a fusão dos Ministérios da Economia e do Mar e a nomeação de António Costa e Silva como ministro destas áreas governativas. É agora esperado, de Costa e Silva e do restante Governo, enquanto anfitriões da conferência, que liderem os esforços internacionais no que toca à conservação do meio marinho e que inspirem os restantes membros da ONU a intensificar os seus próprios esforços.

Todos dependemos do bom estado ambiental do oceano e dos serviços (tantas vezes invisíveis) que este nos presta: fonte de oxigénio, sumidouro de carbono, regulador da temperatura global, fonte de alimento e ainda de bem-estar e inspiração. O papel do oceano enquanto regulador do clima é cada vez mais evidente para todos aqueles que se preocupam com a crise climática e com as desigualdades sociais e económicas que ela gera. Sabemos que a estabilidade do sistema climático depende grandemente de um ambiente marinho saudável e, enquanto principais agressores do meio, é nossa função fazer mais. Não é necessário viver perto do mar para exigir dos nossos governantes mais e melhor, mas torna-se imperativo fazê-lo quando 97% do nosso território é mar.

Uma das múltiplas formas de fazer esse caminho passa por discutir pontos fulcrais que devem ser definidos como fora de limites para exploração comercial. Um exemplo paradigmático é o da mineração em mar profundo, que várias ONG por todo o mundo, apoiadas pela sociedade civil e por evidência científica, têm trazido para a discussão.

Existe atualmente consenso entre os investigadores dos ecossistemas de profundidade e alguns dos mais proeminentes comunicadores de ciência quanto à necessidade de implementar uma moratória de dez a 20 anos a esta atividade. As Fiji e o Território do Norte da Austrália, por exemplo, já implementaram uma moratória ou proibiram definitivamente esta atividade. Mais perto de nós, os parlamentos regionais das ilhas Canárias e da Galiza adotaram resoluções que pedem uma moratória nacional à mineração em mar profundo e, no passado mês de março, um novo decreto real definiu que a atividade de mineração em mar profundo fica sujeita à compatibilização com o princípio da precaução, o que, na prática, se traduz também numa moratória.

Em setembro, o congresso da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) votou de forma estrondosa a favor da moção que visa a proteção de ecossistemas oceânicos profundos e da sua biodiversidade através de uma moratória à mineração em mar profundo, tendo também tido o apoio do ICNF. A própria Comissão Europeia, na Estratégia da Biodiversidade para 2030, definiu que a mineração não deverá avançar “antes que os efeitos da mineração marinha no meio, na biodiversidade e nas atividades humanas sejam suficientemente investigados, os riscos sejam compreendidos e as tecnologias e práticas operacionais sejam capazes de demonstrar que não há nenhum dano sério no meio ambiente”.

É fundamental que Portugal se junte às vozes que apelam à precaução e à proteção de um dos ecossistemas mais frágeis e menos conhecidos do nosso planeta e assuma uma postura progressista, ao implementar uma moratória à mineração marinha em território nacional.

A Conferência dos Oceanos proporcionará ao nosso país a oportunidade perfeita para que se posicione de forma inequívoca do lado da proteção e da conservação dos ecossistemas marinhos. Anunciar a implementação de uma moratória à atividade de mineração será um muito necessário primeiro passo para inspirar outros países e dar ouvidos à sociedade contemporânea, e, sobretudo, à do futuro.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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