Juíza do Supremo recusa-se a arquivar investigação a Bolsonaro sobre compra de vacina da covid

Ao contrário da posição da procuradoria e do Ministério Público brasileiros, Rosa Weber considera que ao Presidente “não assiste a prerrogativa da inércia” e que deveria ter comunicado as suspeitas da existência de um crime de fraude.

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O Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro ADRIANO MACHADO/Reuters

Uma juíza do Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil recusou um pedido da Procuradoria-Geral da União para arquivar uma investigação sobre o alegado conhecimento do Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, em esquemas ilícitos na compra da vacina indiana Covaxin contra a covid-19.

A decisão da juíza Rosa Weber do STF, que contradiz a avaliação do Ministério Público e do procurador-geral, destaca que após ter sido informado de um possível crime Bolsonaro teria a obrigação de accionar os órgãos de controlo.

“Ao ser directamente notificado sobre a prática de crimes funcionais (consumados ou em andamento) nas dependências da administração federal directa, ao Presidente da República não assiste a prerrogativa da inércia nem o direito à letargia, senão o poder-dever de accionar os mecanismos de controlo interno legalmente previstos, a fim de buscar interromper a acção criminosa”, avaliou Weber.

Em causa estão suspeitas levantadas na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia de covid-19 criada pelo Senado brasileiro no ano passado para investigar acções e omissões do Governo no combate à crise sanitária provocada pelo coronavírus.

A investigação sobre a compra de 20 milhões de doses da Covaxin, que acabou anulada ainda no ano passado, começou quando o funcionário do Ministério da Saúde Luís Ricardo Miranda e o seu irmão, o deputado federal Luis Miranda, prestaram depoimento na CPI da câmara alta do Congresso brasileiro.

Na ocasião, o funcionário e o irmão relataram que houve pressão de outros funcionários do Ministério da Saúde e de membros de uma empresa local, a Precisa Medicamentos, que actuava como intermediária, para pagamento antecipado de valores referentes à compra das doses da Covaxin, o que não estava previsto no contrato.

Ambos disseram que transmitiram pessoalmente a Bolsonaro esta e outras supostas irregularidades e ouviram do chefe de Estado que a polícia seria informada para investigar o caso, mas este nada fez.

O código penal do Brasil classifica de crime de prevaricação um acto contra a administração pública que ocorre quando um funcionário público, tomando conhecimento de supostas irregularidades, deixa de comunicar a suspeita às autoridades.

Após a CPI, a Polícia Federal brasileira enviou um relatório ao STF avaliando que a comunicação de crimes a órgãos de controlo não seria uma atribuição do Presidente da República e, portanto, este não pode ser responsabilizado.

Em Fevereiro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, seguiu a mesma linha de argumentação num parecer enviado ao STF, em que afirmou que o arquivamento do caso seria uma medida correcta porque a conduta de Bolsonaro, na sua avaliação, não pode ser enquadrada como prevaricação.

Aras também argumentou que Bolsonaro não tinha o dever funcional de tomar nenhuma medida após ter sido informado de eventuais irregularidades na compra das vacinas.