Guerra na Ucrânia abala confiança dos consumidores portugueses
Indicador de confiança dos consumidores regista maior queda desde o início da pandemia. Portugueses estão à espera de cenário mais negativo na economia e de muito mais inflação.
Com muito mais receio sobre a evolução futura da actividade económica e a antecipar uma escalada rápida da inflação, os consumidores portugueses registaram, no mês de Março, uma das maiores descidas de sempre nos seus índices de confiança.
De acordo com os dados dos inquéritos de conjuntura publicados nesta quarta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), o índice de confiança dos consumidores caiu de -14,5 pontos em Fevereiro para -34,1 pontos em Março. A queda de 19,7 pontos é a segunda maior desde que este indicador começou a ser calculado, em Setembro de 1997, apenas superada pela diminuição de 27,9 pontos registada em Abril de 2020, quando a pandemia de covid-19 atingiu em força o país.
A expectativa de que a guerra na Ucrânia irá ter impactos significativos na evolução da economia nacional e internacional é o que explica o forte aumento do pessimismo entre os consumidores.
Nas respostas ao inquérito do INE, os consumidores portugueses passaram, em particular, a ter uma visão mais negativa daquilo que irá acontecer durante o próximo ano. O indicador sobre a situação económica do país durante os próximos doze meses caiu abruptamente de -12 pontos para -60 pontos, o valor mais baixo desde Abril de 2020.
Relevante é também o facto de a avaliação da situação financeira do próprio agregado familiar ter caído de -14,6 pontos para -20 pontos, um valor mais negativo do que o atingido no início da pandemia e que é o mais baixo desde 2015.
Este número pode estar também relacionado com a deterioração ainda mais significativa que se verifica no indicador relativo à evolução dos preços nos próximos doze meses, que já se encontrava em Fevereiro perto dos máximos e que disparou em Março para o valor mais alto desde que existe a série, passando de 41,3 pontos para 80,8 pontos.
A subida dos preços dos combustíveis e dos alimentos que já foi possível verificar nas primeiras semanas a seguir ao início da guerra na Ucrânia e a expectativa de que este fenómeno se alargue à maioria dos outros bens e serviços são os motivos para que as expectativas de inflação tenham subido tanto.
Também significativa foi a subida registada no indicador que mede as expectativas de evolução do desemprego, que passou de 4,6 para 26,7 pontos, e a descida no indicador que mostra a vontade de realizar compras importantes nos próximos doze meses, que passou de -29,6 para -35,1 pontos.
Ainda assim, nestes dois casos, a distância em relação aos mínimos registados no início da pandemia e mesmo em relação aos valores atingidos na crise de 2011 e 2012 ainda é considerável, o que pode ser um sinal menos negativo para a evolução do consumo nos próximos meses.
Empresas mais moderadas
O aumento do pessimismo foi, por seu turno, relativamente moderado entre as empresas. O indicador de clima económico, que agrega as respostas dadas pelos empresários dos sectores da indústria transformadora, comércio, construção e serviços, registou em Março uma ligeira diminuição da sua taxa de variação face ao mesmo mês do ano passado, de 2,5% para 2,1%.
Em todos os sectores, os indicadores de confiança são, para já, melhores do que eram há um ano (e bastante melhores do que eram há dois anos, no início da pandemia).
De qualquer modo, as expectativas deterioraram-se de forma significativa face a Fevereiro na indústria transformadora e na construção. No comércio e nos serviços, pelo contrário, a evolução foi ainda positiva.
Nas últimas semanas, diversas entidades têm vindo a rever em baixa as suas previsões para a economia portuguesa. O Banco de Portugal passou a antecipar um crescimento este ano de 4,9%, em vez dos 5,8% antes projectados, apontando igualmente para uma taxa de inflação bastante mais elevada, de 4% em vez de 1,8%.
O Governo, por seu lado, passou a prever um crescimento de 5% e uma taxa de inflação (harmonizada) de 3,3% durante este ano.
Tanto o banco central como o executivo traçam, no entanto, cenário alternativos, mais severos do que estes cenários-base, em que a taxa de crescimento se situa em 3,6%, no caso do Banco de Portugal, e de 3,8% no caso do Governo. Estes são números consistentes com uma situação de estagnação da actividade económica, em que a variação em cadeia do PIB em cada um dos trimestres deste ano ficaria próxima de zero.