Primeiro comic de sempre da Marvel, com notas dos pagamentos aos artistas, vendido por 2,4 milhões
A “pay copy” foi à praça na semana passada e permitiu ao vendedor comprar uma casa. O comprador ficou com um pedaço da história dos comics nas mãos.
As primeiras edições de livros de banda-desenhada são há muito cobiçadas no mundo dos leilões, valendo milhões para os coleccionadores — mas a venda de uma raríssima primeira edição do primeiro comic de sempre da hoje poderosa editora e estúdio de cinema Marvel é especial porque se trata de um exemplar anotado. O Marvel Comics N.º1 vendido em leilão na semana passada contém os valores a pagar aos ilustradores do importante título de BD, que o editor assentou a lápis na chamada “pay copy” do precioso livro.
O Marvel Comics N.º1 é a génese de todo o universo Marvel, que hoje vale milhares de milhões de euros graças a personagens que povoam a cultura popular como o Homem de Ferro ou o Capitão América. Mas neste exemplar, não há ainda vestígios destas personagens. Publicado em Novembro de 1939, contém sim histórias sobre o Tocha Humana ou o menos conhecido Namor; em Março, uma editora rival lançara a primeira história de outro omnipresente herói da BD actual, Batman.
Este exemplar é especial por ser um dos livros sobreviventes do dealbar da era de ouro dos comics, mas também então por se tratar da “cópia de pagamento” da editora. É por tudo isso que pode ser visto como “um dos três comics mais importantes no mundo dos coleccionadores de comics”, segundo disse há dias à agência de notícias Associated Press Vincent Zurzolo, director da leiloeira online especializada ComicConnect, que vendeu o livro na quinta-feira por 2,4 milhões de dólares (2,1 milhões de euros).
Trata-se de um pedaço raro da história da Marvel e dos comics em geral, comprado por um coleccionador de fora dos EUA e que está na casa dos 40 anos. Foi vendido por um proprietário que também não quis ser identificado e que o vendeu para poder comprar uma casa, diz Stephen Fishler, presidente da mesma leiloeira, desta feita ao diário New York Times.
O exemplar está em excelentes condições, garantem todos os envolvidos, e dele constam então notas que permitem saber que a Marvel (ou mais precisamente a empresa Timely Comics, antecessora da editora que se baptizaria depois como Marvel) pagou 25 dólares ao ilustrador responsável pela capa, Frank R. Paul. Na altura, o preço de capa eram dez cêntimos.
O estado do livro é particularmente digno de nota pelo tipo de papel em que eram impressos estes primeiros comics, um papel com base em polpa de celulose barata cuja durabilidade é limitada. Mas a história do objecto explica o milagre da sua sobrevivência — estava escondido num armário que servia de arquivo e que pertencera, detalha o New York Times, ao fundador da empresa Funnies Inc. (“funnies” era um dos nomes pelos quais eram conhecidas as páginas com cartoons e tiras de BD nos jornais) que vendia histórias e ilustrações às editoras. Lloyd Jacquet, o dono da Funnies e que morreu em 1970, foi o responsável pelas anotações em oito das páginas do livro que o tornaram tão valioso.
Nos últimos anos, os valores atingidos por exemplares de BD norte-americana que vão a leilão são cada vez mais elevados. Apesar dos 2,4 milhões de dólares que vale agora este exemplar iniciático da Marvel, outros em que personagens de topo fazem as suas primeiras aparições foram arrematados por valores ainda mais impressionantes. Nos últimos meses, e sempre acima dos três milhões de dólares, foram vendidos exemplares do Amazing Fantasy No. 15, de 1962 e em que se estreia o Homem-Aranha (3,6 milhões de dólares), o Action Comics No. 1, de 1938 e onde surge pela primeira vez o Super-Homem (3,1 milhões) e até uma única página com a ilustração original de 1984 em que surge pela primeira vez o fato negro que dá origem ao anti-herói Venom foi vendida em Janeiro (3,3 milhões).
Os especialistas apontam que a exploração cinematográfica do filão dos heróis e vilões dos comics, forjados como uma espécie de mitologia da jovem América no século XX, tem contribuído e muito para a valorização crescente dos exemplares vintage dos livros desta BD. Os filmes Marvel tiveram receitas brutas de bilheteira de 22,7 mil milhões de euros em todo o mundo.