Leão saúda consenso na UE sobre reequacionar regresso das regras orçamentais

“Em Maio, vai mesmo voltar a estar em cima da mesa a questão de se manter ou não a cláusula de escape que mantém as regras suspensas por mais um ano”, disse o ministro das Finanças à saída de uma reunião do Ecofin, em Bruxelas.

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João Leão participou na reunião dos ministros da Finanças da UE Daniel Rocha

O ministro das Finanças disse que houve esta terça-feira um “consenso” entre os 27 sobre reavaliar, em Maio, a reactivação das regras de disciplina orçamental em 2023, e adiantou que Portugal considera que a sua suspensão por mais um ano seria “prudente”.

“É importante, neste contexto, manter a política orçamental ágil e flexível e, portanto, a nota que ficou é que, tal como o Governo português pretendia, em Maio vai mesmo voltar a estar em cima da mesa a questão de se manter ou não a cláusula de escape que mantém as regras suspensas por mais um ano”, disse, à saída de uma reunião de ministros das Finanças da União Europeia (Conselho Ecofin), em Bruxelas.

Recordando que “as regras orçamentais têm estado suspensas há já três anos, entre 2020 e 2022”, e “era suposto voltarem a estar em vigor em 2023”, Leão disse que “há um consenso de que se deve chegar a Maio e, na altura, ponderar para perceber se vale a pena ou não manter mais um ano as regras suspensas”.

O ministro especificou que houve “consenso no sentido em que ninguém se opôs a que em Maio se voltasse a colocar a questão em cima da mesa e se ponderasse manter as regras orçamentais suspensas por mais um ano”.

“Vários países mostraram-se favoráveis, muitos disseram que havia ainda uma grande incerteza e que era preciso esperar pelo pacote da Primavera [do semestre europeu de coordenação de políticas económicas] e da avaliação da situação macroeconómica para perceber” se se justifica ou não manter as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento suspensas até 2024.

Leão classificou como “prudente” fazer “essa ponderação, porque os efeitos da crise são muito incertos”, e adiantou que a posição de partida de Portugal é de concordar com a manutenção da suspensão das regras por mais um ano.

“Portugal chamou a atenção de que, da nossa parte, nos parece prudente que se repondere o fim da suspensão das regras, pois estamos num contexto de grande incerteza e é suposto a economia europeia ter capacidade de reagir a esta crise e não colocarmos em causa a recuperação económica por causa de uma decisão de retomar de forma demasiado cedo as regras”, disse.

Concordando que essa avaliação seja feita em Maio, o ministro revelou então que a “inclinação de partida é de abertura para a suspensão por mais um ano quando chegar essa avaliação”.

“Portanto, Portugal mantém-se com uma posição favorável. Achamos que, nesta fase, em que não só estamos ainda a recuperar da crise pandémica, [como] temos o impacto da crise na Ucrânia, ao mesmo tempo temos uma situação do ponto de vista da política do Banco Central Europeu [BCE] bastante exigente, porque, com uma inflação tão alta, o BCE pode ter menos margem para ajudar a economia nesta fase, e é, portanto, mais uma razão para haver margem para os países terem capacidade de resposta aos efeitos da crise”, disse.

Questionado sobre se o prolongamento da cláusula de escape por mais um ano não poderá conhecer resistência por parte dos «falcões do norte» - os Estados-membros com posições mais rígidas e conservadores em termos de políticas económicas e orçamentais –, João Leão disse que “nesta fase há uma abertura de todos para que isso seja voltado a ser posto em cima da mesa, e ninguém se opôs”, mas admitiu que “em Maio esta discussão já seja mais difícil ou mais exigente”.

No início de Março, por ocasião da apresentação das orientações de política orçamental para o próximo ano, a Comissão Europeia admitiu que a invasão militar da Ucrânia pela Rússia terá consequências económicas na Europa difíceis de quantificar nesta fase e poderá colocar em questão o anunciado regresso às regras de disciplina orçamental em 2023.

À espera do efeito “ricochete"

Depois de, ao longo dos últimos meses, o executivo comunitário ter afastado a possibilidade de prolongar além de 2022 a suspensão temporária das regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), activada há dois anos devido à pandemia da covid-19, em 2 de Março admitiu pela primeira vez que, “face à actual incerteza” provocada pela guerra na Ucrânia, será necessário “reavaliar a esperada desactivação da cláusula de escape” no próximo ano.

Bruxelas admite designadamente que a guerra e possíveis retaliações da Rússia às sanções impostas pela UE, assim como o efeito “ricochete” destas, tenham “um impacto negativo no crescimento, com repercussões nos mercados financeiros, novas pressões sobre os preços da energia, estrangulamentos mais persistentes da cadeia de abastecimento e efeitos na confiança”.

A Comissão reservará assim para Maio, e com base em previsões macroeconómicas actualizadas, uma reavaliação da desactivação da cláusula de escape, ou de salvaguarda, que suspende temporariamente as regras do PEC que exigem que a dívida pública dos Estados-membros não supere os 60% do Produto Interno Bruto (PIB) e impõem um défice abaixo da fasquia dos 3%.

Esta cláusula foi activada há precisamente dois anos, em Março de 2020, para permitir aos Estados-membros reagirem rapidamente e adoptarem medidas de urgência para mitigar o impacto económico e social sem precedentes da crise da covid-19, e a sua desactivação estava prevista para 2023, face à gradual recuperação económica, agora de novo posta em causa pela guerra lançada pela Rússia.

O ministro admitiu também que “há a expectativa de que a Rússia possa entrar em default nas próximas semanas”, mas disse que “não se antecipa um grande impacto ao nível europeu” desse eventual incumprimento. Na reunião do Ecofin foi analisada “a exposição do sector financeiro europeu à Rússia”, tendo Leão sublinhado que esta “é mais limitada do que era antes, porque desde a crise da Crimeia [em 2014] que a Europa tem estado a reduzir a exposição a esse nível à Rússia” e antecipou que Moscovo é que sentirá um “efeito muito negativo” de uma eventual bancarrota, sobretudo a nível reputacional.