Projectos e obras de ateliers de arquitectura europeus em suspenso na Rússia

Arquitectos europeus interrompem projectos na Rússia para mostrarem a sua indignação ao regime de Putin, mas “a arquitectura não é inocente”, lembra ao Le Monde o arquitecto suíço Jacques Herzog.

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A Casa da Cultura GES-2 , projecto do arquitecto italiano Renzo Piano iStock / Getty Images Plus

A Rússia, juntamente com a China e as Monarquias do Golfo Pérsico, são alguns dos países onde a arquitectura espectacular ainda não entrou em crise, nem económica nem climática, pois nos últimos anos, tanto em Moscovo como em São Petersburgo, multiplicaram-se as obras arquitectónicas feitas por arquitectos estrela e ateliers mundialmente famosos, escreve o Le Monde.

O diário francês, num artigo assinado por Isabelle Regnier, recorda o projecto de reabilitação que o arquitecto italiano Renzo Piano fez de uma antiga central eléctrica que tinha sido projectada em 1907 pelo arquitecto russo Vasili Bashkirov e que foi transformada na GES 2 - Casa da Cultura, um centro de arte contemporânea da Fundação VAC do oligarca russo Leonid Mikhelson. O novo edifício foi inaugurado em Moscovo, em Dezembro do ano passado, pelo presidente Putin.

Também em 2015, abriu o Museu de Arte Contemporânea Garage, no parque Gorki, em Moscovo, do oligarca russo Roman Abramovitch e da sua mulher na altura, Daria Zhukova, um projecto feito pelo arquitecto holandês Rem Koolhaas, autor do projecto da Casa da Música, no Porto.

Por causa da invasão da Ucrânia pela Rússia a 24 de Fevereiro e das sanções europeias por causa da guerra vários dos importantes ateliers de arquitectura internacionais, como o dos suíços Herzog & de Meuron, dos britânicos Foster + Partners, de David Chipperfield, o Zaha Hadid Architects ​ e do atelier norueguês Snohetta, pararam as suas actividades na Rússia. À Dezeen, os arquitectos do atelier Zaha Hadid Architects estão chocados com o conflito e, nas redes sociais, o atelier de David Chipperfield, que tem escritórios em Londres, Berlim, Milão e Xangai anunciou que os seus clientes compreenderam a decisão. Uma das obras que ficará em suspenso é a recuperação do edifício da central telegráfica de Moscovo. O atelier holandês MVRDV em solidariedade com todas as pessoas que estão a sofrer com a guerra na Ucrânia também parou os cinco projectos que tinha em curso na Rússia.

Também em França, noticia o Le Monde, a agência Valode & Pistre decidiu fechar o seu escritório em Moscovo e interromper os três projectos que tinham na Rússia mas que estavam ainda em fase de estudo.

O arquitecto francês Jean-Michel Wilmotte , que foi o responsável pela recuperação de uma antiga chocolataria em Moscovo e pelo centro espiritual e cultural ortodoxo russo, em Paris, disse a este diário francês que os seus projectos na Rússia estão suspensos (cinco torres para alojamento em Moscovo, um complexo de torres de habitação mas também de escritórios, lojas, hotelaria e um complexo desportivo em Krasnoïarsk, na Sibéria Oriental, e ainda um projecto para uma universidade em Vladivostok).

Por sua vez, o arquitecto suíço Jacques Herzog disse ao Le Monde que concorda com o boicote que está a ser feito mas lembra que quer sejam oligarcas russos ou promotores privados, todas na Rússia precisam de ter o aval do Kremlin para financiar este tipo de operações. “A arquitectura não é inocente. As suspeitas existiam antes da guerra - sobre os oligarcas, o dinheiro, a natureza do poder… Claro que é com horror que assistimos ao que se está passa, mas a realidade é que ninguém pode continuar a trabalhar num país em guerra, é demasiado instável”, afirmou o Prémio Pritzker 2001.

O Conselho de Arquitectura Europeu publicou um comunicado em que pede a criação de “uma onda de solidariedade” com os arquitectos ucranianos.

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