Dois anos de covid-19: o que se sabe (e ainda não se sabe) sobre a pandemia?

A OMS declarou a covid-19 uma pandemia a 11 de Março de 2020 e “está longe de acabar”, diz o director-geral. Actualmente, em Portugal, contabilizam-se mais de 21 mil mortes e mais de três milhões de infectados.

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Dois anos depois da declaração da covid-19 como uma pandemia, o número de mortos no mundo ultrapassa os seis milhões Nuno Ferreira Santos

A doença respiratória covid-19, causada por um novo coronavírus, o SARS-CoV-2, detectado em Dezembro de 2019 na China, foi declarada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma pandemia a 11 de Março de 2020.

Justificando a declaração de pandemia, o director-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, falou em “níveis alarmantes de propagação e inacção”, prevendo o aumento do número de infecções, mortes e países afectados. Na altura, o balanço saldava-se em mais de 118 mil casos de infecção em 114 países e 4291 mortes. Portugal tinha 59 infectados. “Os países podem ainda mudar o curso desta pandemia se detectarem, testarem, tratarem, isolarem, rastrearem e mobilizarem as pessoas na resposta”, instava o dirigente da OMS.

Dois anos depois da declaração da covid-19 como uma pandemia, o número de mortos no mundo ultrapassa os seis milhões. Em Portugal contabilizam-se mais de 21 mil mortes e mais de três milhões de infectados.

Esta semana, a OMS advertiu que, apesar de as mortes e infecções estarem a diminuir à escala global, há muitos países na Ásia e no Pacífico com “surtos de casos e óbitos”. Segundo Tedros Adhanom Ghebreyesus, a pandemia da covid-19 “está longe de acabar” e “não acabará em nenhum lugar até que acabe em todos os lugares”.

Passados dois anos, eis o que se sabe e o que ainda não se sabe sobre esta pandemia. As respostas têm por base informação da OMS.

O que é uma pandemia?

É uma doença infecciosa que se propagou pelo mundo. A OMS declarou a covid-19 uma pandemia a 11 de Março de 2020.

Além de ser uma pandemia, a covid-19 é, desde 30 de Janeiro de 2020, uma emergência de saúde pública internacional.

O que é a covid-19?

É a doença infecciosa respiratória causada pelo SARS-CoV-2, um coronavírus que nunca tinha sido identificado em humanos. Covid-19 significa doença provocada por um coronavírus descoberto em 2019, o coronavírus-2 da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS-CoV-2).

A nova doença infecto-contagiosa apresenta sintomas semelhantes à gripe sazonal e a duas outras doenças respiratórias causadas por coronavírus: a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS-CoV), que apareceu pela primeira vez na China em 2002, e a Síndrome Respiratória do Médio Oriente (MERS-CoV), identificada em 2012 na Arábia Saudita.

A OMS tomou conhecimento do novo coronavírus a 31 de Dezembro de 2019, após o relato de uma série de casos de “pneumonia viral” em Wuhan, na China.

O que é um coronavírus?

É uma família de vírus que circula entre os animais (como morcegos, camelos e aves), sendo que alguns infectam pessoas. Têm a designação de coronavírus devido aos “picos” em volta da sua superfície, que formam uma espécie de coroa (corona é um termo que vem do latim e que significa coroa em português). Normalmente, estes vírus afectam o sistema respiratório, podendo a infecção ser semelhante a uma constipação ou evoluir para uma doença grave como a pneumonia.

Os morcegos são considerados os reservatórios naturais destes vírus, transmitidos habitualmente aos humanos através de outro animal. O coronavírus que causou a MERS foi transmitido por camelos às pessoas, enquanto o coronavírus que provocou a SARS passou de gatos-de-algália (civetas) para os humanos. No caso do coronavírus que provoca a covid-19 não se sabe ao certo qual o animal que serviu de hospedeiro ao vírus e o transmitiu às pessoas.

Quando foi detectado o novo coronavírus?

Em Dezembro de 2019, na cidade chinesa de Wuhan, tendo-se espalhado rapidamente pelo resto do mundo. Os primeiros casos de covid-19 foram localmente associados a um mercado de venda de animais vivos, que foi encerrado a 1 de Janeiro de 2020. A 11 de Janeiro do mesmo ano, cientistas chineses divulgaram a sequenciação genética do SARS-CoV-2, uma informação que foi importante para o avanço do estudo do novo coronavírus e da nova doença infecciosa.

Estudos sugerem que a pandemia terá começado em algum momento entre 6 de Outubro e 11 de Dezembro de 2019.

Análises aos esgotos de Milão e Turim, cidades italianas, o primeiro país europeu a reportar casos de covid-19, revelaram que o vírus já estava presente no norte do país a 18 de Dezembro de 2019. Investigadores espanhóis concluíram, usando a mesma metodologia, que o vírus já circulava também no Brasil, um dos países mais afectados, em Novembro de 2019. Estudos consideram improvável que o SARS-CoV-2 seja um produto de manipulação em laboratório, numa cultura de células, ou seja de origem sintética.

O que são variantes do SARS-CoV-2?

Desde que o SARS-CoV-2 se espalhou no mundo surgiram variantes do vírus original, cinco de preocupação, segundo a classificação da OMS. A mais recente das quais, a Ómicron, é mais transmissível, mas menos letal.

De cada vez que um vírus se replica (faz cópias de si mesmo) quando circula entre as pessoas, existe a possibilidade de haver alterações na sua estrutura. Isso é normal, faz parte da sua evolução. Essas alterações, no material genético, chamam-se mutações. Um vírus com uma ou mais mutações designa-se como variante. Quanto mais vírus circulam, mais podem mudar.

Às vezes, variantes aparecem e desaparecem sem se dar por isso. Outras vezes, persistem e têm consequências para a saúde humana. O processo de mudança e selecção de variantes bem-sucedidas é chamado “evolução do vírus”. Algumas mutações podem levar a alterações nas características de um vírus que o tornam mais transmissível, mais resistente a vacinas e a medicamentos, ou mais maligno e letal (causar mais doença grave e morte).

O SARS-CoV-2 tende a mutar mais lentamente do que outros vírus, como os da gripe e do VIH/sida. De acordo com a OMS, isso pode ser explicado, em parte, pelo “mecanismo de revisão” interno do coronavírus, que pode corrigir “erros” ao fazer cópias de si mesmo.

Como se transmite a infecção?

O SARS-CoV-2 transmite-se fundamentalmente entre pessoas que estão em contacto próximo, através de pequenas partículas líquidas que são expelidas do nariz ou da boca quando uma pessoa infectada tosse, espirra, fala ou canta. Uma pessoa pode apanhar o vírus quando partículas infecciosas que circulam no ar (aerossóis) são inaladas a curto alcance ou quando entram em contacto directo com olhos, nariz ou boca (gotículas).

O novo coronavírus também pode espalhar-se em ambientes fechados, mal ventilados ou lotados, uma vez que os aerossóis podem ficar suspensos no ar ou “viajar” mais longe do que a distância de uma conversa entre pessoas. As pessoas podem ficar igualmente infectadas quando tocam nos olhos, nariz ou boca depois de colocarem as mãos em superfícies ou objectos contaminados.

Apesar de o SARS-CoV-2 se transmitir principalmente entre pessoas, vários animais, como martas, cães, gatos, leões e tigres, testaram positivo após contacto com humanos infectados.

Como é que o SARS-CoV-2 entra no corpo e causa infecção?

O novo coronavírus entra nas células humanas usando como “chave” as proteínas das espículas, os “picos” que existem à sua superfície e que se ligam às proteínas, também à superfície, das células respiratórias. O SARS-CoV-2 desregula o maquinismo das células humanas, pondo-as a funcionar como uma “fábrica” do vírus.

Como se manifesta a covid-19?

Na maioria dos casos, a infecção apresenta sintomas ligeiros a moderados ou é assintomática (sem sintomas).

Os sintomas mais comuns são tosse seca, febre e fadiga. Os menos frequentes são perda de paladar ou olfacto, congestão nasal, conjuntivite, dor de garganta ou cabeça, dores musculares ou articulares, erupções cutâneas, náuseas ou vómitos, diarreia, calafrios ou tonturas. Os sintomas da doença grave incluem falta de ar, perda de apetite, confusão, dor ou pressão persistente no peito e febre (acima dos 38ºC).

Menos comuns são irritabilidade, consciência reduzida, ansiedade, depressão, distúrbios do sono, complicações neurológicas mais graves e raras (como derrames, inflamação cerebral, delírio e lesões nervosas).

Entre as pessoas sintomáticas, a maioria recupera da doença sem precisar de tratamento hospitalar. Cerca de 15% fica gravemente doente e necessita de oxigénio e 5% fica gravemente doente e precisa de cuidados intensivos, de acordo com a OMS. As complicações que levam à morte podem ser insuficiência respiratória, síndrome da dificuldade respiratória aguda, sépsis e choque séptico, tromboembolismo e/ou falência de múltiplos órgãos, incluindo lesão do coração, fígado ou rins. Em raras situações, as crianças podem desenvolver uma síndrome inflamatória grave algumas semanas após a infecção.

O que é a covid longa?

O termo aplica-se às pessoas que continuam, a médio e longo prazo, com sintomas depois de terem tido covid-19. Estes sintomas incluem fadiga, falta de ar, confusão, esquecimento, falta de clareza, perda de olfacto ou paladar, depressão, ansiedade e perturbações do sono.

Estes sintomas podem persistir desde a doença inicial ou desenvolver-se após a recuperação, desaparecer ou recair ao longo do tempo. A condição pós-covid pode afectar a capacidade de uma pessoa realizar actividades diárias, como trabalhar.

Como se diagnostica a covid-19?

Através de uma análise a uma amostra de saliva ou secreções do nariz e da garganta, que confirmará ou não a presença do vírus no organismo. Uma análise a uma amostra de sangue permitirá, ao detectar anticorpos para o SARS-CoV-2, confirmar se uma pessoa já esteve infectada.

Quem fica infectado e doente?

O SARS-CoV-2 infeta desde crianças a idosos. Pessoas com 60 ou mais anos e com outras doenças, como cancro, diabetes, obesidade, hipertensão, doenças cardíacas e pulmonares, correm risco acrescido de ter covid-19 grave. Mas qualquer pessoa pode ter covid-19, ficar gravemente doente ou morrer.

Quem foi infectado fica protegido contra uma nova infecção?

Nem sempre. A mais recente variante de preocupação do SARS-CoV-2, a Ómicron, representa um risco acrescido de reinfecção. Por norma, uma pessoa que recupera de uma doença infecciosa não necessita de ser vacinada porque adquiriu, de forma natural, imunidade contra essa doença.

No caso da covid-19, mesmo as pessoas que estiveram infectadas ou doentes são vacinadas. A vacina funciona, nestes casos, como um reforço da imunidade adquirida naturalmente, sendo considerado necessário quando há risco de reinfecção.

A duração da imunidade contra a covid-19 continua a ser uma incógnita.

Que vacinas há?

Segundo a OMS, pelo menos 13 vacinas contra a covid-19 foram administradas no mundo, quatro delas em Portugal. Porém nenhuma delas, como qualquer vacina, é 100% eficaz. Embora as vacinas para a covid-19 sejam eficazes contra a doença grave e morte, algumas pessoas podem ficar doentes após a vacinação.

Por outro lado, as vacinas não impedem totalmente a infecção e a transmissão do vírus. As vacinas que estão em circulação, assentes em várias tecnologias, fornecem diferentes níveis de protecção contra a infecção, doença ligeira e grave, hospitalização e morte e foram administradas em unidose, dose dupla e doses de reforço.

Por definição, uma vacina treina o sistema imunitário para gerar proteínas (anticorpos) que eliminam proteínas dos agentes infecciosos (antigénios) sem que a pessoa tenha de ficar doente. As vacinas contra a covid-19 têm como alvo a proteína da espícula do SARS-CoV-2, uma proteína à superfície do vírus que se liga à superfície das células humanas.

Que medicamentos existem?

Existem novos antivirais (com actuação no SARS-CoV-2) e “cocktails” de anticorpos monoclonais (anticorpos sintéticos) e corticóides com acção anti-inflamatória (inicialmente usados noutras doenças) que são recomendados no tratamento de doentes graves ou em maior risco de hospitalização.

Como evitar a covid-19?

Com a vacinação, a par de medidas de protecção individual, como o uso de máscaras, a higienização das mãos, a desinfecção de superfícies, o distanciamento, o arejamento de espaços fechados, o tossir e espirrar para o antebraço ou um lenço descartável.