Rússia anuncia novo cessar-fogo humanitário após primeiras evacuações de Sumi

Militares russos acusados de bombardear coluna de ajuda a caminho de Mariupol, cidade que está há dez dias cercada e onde “a situação é apocalíptica”, segundo a Cruz Vermelha.

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A maior parte dos civis resgatados esta terça-feira saiu de Sumi Reuters/DEPUTY HEAD FOR PRESIDENT'S OFFI

A Rússia anunciou um novo cessar-fogo para esta quarta-feira a partir das 9h em Kiev (7h00 em Portugal continental), garantindo que as suas forças estão prontas a abrir passagens seguras a partir da capital ucraniana, de Chernihiv, de Sumi, de Kharkiv e de Mariupol, para além de outras localidades negociadas com os ucranianos. A confirmar-se, esta notícia pode permitir resgatar centenas de milhares de pessoas sitiadas há vários dias em cidades onde já falta um pouco de tudo. O problema é que para esta terça-feira esteve previsto mais ou menos o mesmo e praticamente só foi possível retirar pessoas de Sumi, no Nordeste da Ucrânia, e de Irpin, nos arredores da capital.

A maioria das operações acordadas para abrir “corredores humanitários” que permitissem levar ajuda e retirar pessoas destas mesmas cidades não chegou a acontecer. Apesar de tudo, mais ou menos a conta-gotas, ao quarto dia de tentativas frustradas, pela primeira vez nesta guerra foi possível retirar alguns milhares de civis das cidades cercadas, essencialmente de Sumi.

“As pessoas com deficiência, as grávidas e as crianças dos orfanatos terão prioridade”, explicara o governador de Sumi, Dmitro Zhistski, numa declaração vídeo a antecipar as operações de evacuação. “Peço-vos – nem armas, nem homens de uniforme”, acrescentara. Segundo as autoridades ucranianas, mais de 5000 pessoas foram retiradas de Sumi em direcção a Lokhvitsia, na província de Poltava.

A coluna de autocarros organizada pela Cruz Vermelha chegou cedo a Sumi, sendo acompanhada por autocarros enviados por embaixadas e agências não-governamentais que tinham por missão retirar da cidade os muitos estudantes de várias nacionalidades que ainda ali se encontravam – mais de mil estudantes, incluindo uns 700 indianos e mais de 350 nigerianos estavam no primeiro grupo a sair.

O som de disparos provocou por várias vezes o pânico entre quem se preparava para abandonar a cidade, esperando pacientemente no chão coberto de neve com as suas malas e muitas crianças ao colo e pela mão. Mas a caravana humanitária não foi alvo de qualquer ataque. As primeiras viaturas cruzaram-se com uma coluna de mais de 160 veículos militares russos que vinham na direcção oposta, contou mais tarde o governador em declarações à televisão ucraniana. “A nossa coluna parou à beira da estrada e deixou os veículos passar, depois continuámos o nosso caminho.”

Horas antes da chegada dos autocarros, um bombardeamento descrito por vários residentes como o pior de todos até ao momento atingiu uma rua residencial e matou 21 pessoas, incluindo duas crianças, segundo as autoridades locais.

De Irpin, a 25 quilómetros de Kiev, também foi possível fazer sair um número indeterminado de pessoas – algumas centenas, de acordo com a maioria das fontes, incluindo idosos de um lar, doentes e médicos. Os socorristas usaram carrinhos de mão e de compras para transportar os mais vulneráveis até aos autocarros, descreveu a AFP.

“A cidade está praticamente em ruínas e no meu bairro não há casas que não tenham sido bombardeadas”, disse à Reuters uma mãe que carregava a sua bebé nos braços, embrulhada numa manta, com outra filha ao lado.

São de Irpin as imagens dos últimos dias de civis que percorrem com dificuldades um caminho cheio de destroços por baixo de uma ponte destruída pelas forças ucranianas para travar os avanços russos. E foi nesse percurso que no domingo um ataque de artilharia russo matou várias pessoas que tentavam fugir, incluindo uma família com uma adolescente e uma menina pequena.

Ao fim da manhã, o Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano acusava a Rússia de atacar o corredor humanitário que deveria permitir levar ajuda para Mariupol a partir de Zaporizhzhia, quebrando assim o cessar-fogo que deveria estar em vigor para permitir a saída de civis e a entrada de mantimentos na cidade sitiada.

Alguns camiões e dezenas de autocarros partiram em direcção a esta cidade portuária estratégica, carregados de alimentos, remédios e outros bens essenciais, prevendo-se que depois fizessem o caminho inverso com civis a bordo. “Mas pouco depois de os responsáveis anunciarem que os autocarros estavam a caminho, o gabinete do Presidente ucraniano disse ter sido informado de um bombardeamento na rota definida”, descreve a Associated Press. Ouvido pela BBC, o presidente da câmara da cidade, Vadim Boichenko, denunciou que os russos estavam ainda a bombardear a área onde as pessoas se estavam a reunir para serem retiradas.

Mariupol, sob cerco há dez dias, é talvez a cidade de onde a evacuação é mais urgente. “A situação em Mariupol é apocalíptica”, afirmou o porta-voz do Comité Internacional da Cruz Vermelha Ewan Watson, explicando que os 430 mil residentes estão a ficar sem electricidade, aquecimento, comida ou água potável. O presidente da câmara contou aos jornalistas que o corpo de uma menina de seis anos chamada Tania foi retirado dos escombros de um edifício. A mãe morreu no bombardeamento, a menina de desidratação.

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