Guerra na Ucrânia desvia aviação da rota de recuperação
Encerramento dos espaços aéreos russos e ucranianos obriga a mais tempo de voo e consumo nas ligações entre Europa e Ásia. Além de fazer disparar os preços do petróleo e derivados, guerra provoca também sentimentos de insegurança.
Esta quinta-feira, a companhia aérea japonesa ANA anunciou o cancelamento de diversos voos para a Europa que estavam programados entre sexta-feira e sábado. Apesar das suas rotas não passarem perto do espaço aéreo ucraniano, a transportadora afirmou em comunicado que, “à luz da actual situação na Rússia e na Ucrânia”, os voos de e para a Europa vão percorrer uma rota alternativa, evitando o espaço aéreo russo. Isto, alertou a ANA, “vai ter como resultado um aumento das horas voo”, além de alterações nos horários e atrasos. “A segurança dos nossos passageiros e tripulações é a nossa principal prioridade”, frisou a companhia aérea.
O anúncio da transportadora japonesa é a evidência mais recente dos impactos que a invasão russa está a provocar em várias companhias do sector, principalmente europeias (mas não só), afectadas pelas sanções que implicam o fim do acesso a uma vasta área de espaço aéreo: obrigação de mudar de rotas em muitos casos de ligações com a Ásia, evitando as áreas russas e ucranianas, o que leva a mais horas voos e de consumo de combustível; maior sentimento de incerteza e insegurança na região da Eurásia; e uma enorme subida dos custos devido à subida do petróleo e derivados que, essa sim, abrange todo o sector.
O caso mais agudo é o da finlandesa Finnair, que esta terça-feira anunciou que ia começar a negociar um novo período de layoff devido à interrupção das rotas com a Rússia. Neste caso, o modelo de negócio da companhia aérea estava assente no espaço aéreo russo, procurando agora reagir ao seu encerramento. Várias rotas foram canceladas, e outras foram redireccionadas, mas, conforme referiu esta quinta-feira a empresa, as mudanças nos percursos de modo a evitar a Rússia podem acrescentar “várias horas ao tempo de voo”.
Isso, associado ao aumento do preço do jet fuel, diminui a possibilidade de as rotas serem rentáveis. Entre o dia 22 de Fevereiro e esta quinta-feira, as acções da companhia estavam com uma desvalorização de 27%, isto numa altura em que a pandemia dava sinais de acalmia e a retoma ganhava corpo. A companhia, controlada pelo Estado finlandês, tem sido alvo de apoios públicos nos últimos dois anos, e assim deve continuar, uma vez que é vista como sendo um activo estratégico para o país.
A Finnair é uma das companhias que compõe o índice STOXX Europe Total Market Airlines, e que já perdeu 22% desde 22 de Fevereiro (comparando com o pré-pandemia, está ainda com uma perda da ordem dos 40%). Aqui, estão também companhias como a IAG, Lufthansa, Air France-KLM, Easyjet, Wizzair, SAS e Ryanair. Várias companhias usavam o espaço aéreo russo que, de acordo com dados do sector, abrange cerca de 600 voos diários que atravessavam esta zona.
Outro sinal de dificuldades foi dado esta quarta-feira pela Ryanair, com o presidente do grupo, Michael O’Leary, a alertar, citado pelo Financial Times (FT), que a maioria das companhias vai atravessar um período “muito difícil” nos próximos doze meses.
Mesmo assim, o gestor considera que a Ryanair será pouco afectada – desde o dia 22 de Fevereiro, as acções perderam 14%. Os seus voos para a Ucrânia foram cancelados, mas os aviões ficaram fora do território e podem ser usados em outros países. “Creio que não haverá um efeito dramático nas reservas, se a guerra não escalar e se alargar para outro lado qualquer”, acrescentou.
A companhia tem grande parte das compras de combustível protegida contra este tipo de alterações nos preços, mas, mesmo assim, espera uma subida da factura da ordem dos 50 milhões de dólares (cerca de 45,5 milhões de euros) no espaço de um ano. “Não é muito dinheiro, mas obviamente torna a recuperação pós-covid muito mais difícil”, afirmou o responsável daquela que é uma das companhias aéreas com melhor capacidade financeira.
No caso da TAP, a companhia tinha uma rota para Moscovo antes da pandemia, mas esta foi interrompida há dois anos sem ter sido ainda retomada, e não voa para a Ásia. Mesmo assim, a subida acentuada do custo do combustível não é uma boa notícia para a transportadora portuguesa e para o seu plano de recuperação.