Ucrânia pede a empresas de satélite imagens actuais das movimentações russas

Têm sido divulgadas muitas imagens remotas da zona de conflito, mas não são as mais úteis para o Governo de Kiev.

Foto
Imagem divulgada pela Maxar mostra parte de um comboio militar na região de Ivankiv, a 28 de Fevereiro EPA/MAXAR TECHNOLOGIES

Esta é a primeira guerra em que estão disponíveis para o público bastantes imagens de satélite comerciais. Mas estas normalmente não são as mais actuais. Por isso, o Governo ucraniano está a pedir às empresas de satélites que lhe forneçam imagens actualizadas que permitam ver como avança o invasor no seu território. “Precisamos muito da oportunidade de observar o movimento das tropas russas, especialmente de noite, quando as nossas tecnologias são de facto cegas”, escreveu no Twitter o vice-primeiro-ministro e ministro da Transformação Digital da Ucrânia, Mikhailo Fedorov.

O ministro pediu em especial imagens obtidas por satélites com sensores de radar de abertura sintética (SAR, na sigla em inglês), que é uma forma de radar usada para criar imagens bidimensionais ou reconstruções a três dimensões de paisagens. O SAR consegue obter imagens de noite e penetrar através das nuvens – e “as nuvens cobrem 80% da Ucrânia durante o dia”, escreveu o ministro.

Empresas de satélites, como a Maxar, Planet, BlackSky e outras, têm divulgado imagens de satélite da zona onde se concentram as tropas russas, e da área de conflito. Mas são os seus clientes governamentais que têm prioridade no acesso às imagens mais actuais. O Governo dos Estados Unidos, por exemplo, é o principal cliente da Maxar e, segundo o site Spacenews, paga 300 milhões de dólares anualmente para aceder às imagens dos quatro satélites da empresa.

“A principal fonte de financiamento para quase todas as empresas das imagens por satélite é a comunidade de segurança nacional”, disse ao site Axios Brian Weeden, da Fundação Mundo Seguro. Nos EUA, destaca-se a Agência Nacional Geoespacial, ou o National Reconnaissance Office, ambas do Departamento de Defesa.

Isso não quer dizer que as imagens fiquem no segredo dos deuses para sempre: a maioria acaba por ser divulgada, disse à Spacenews Chris Quilty, da empresa de pesquisa de mercado Quilty Analytics. O Governo dos EUA apenas tem prioridade no acesso a elas. E pode até ter bastante interesse em que as imagens sejam divulgadas.

As imagens comerciais podem ajudar a confirmar uma narrativa num conflito. Por exemplo, ainda antes da invasão russa da Ucrânia, quando Moscovo anunciou que estava a retirar alguns soldados da fronteira, imagens da Maxar ajudaram a confirmar que as tropas apenas tinham sido redistribuídas, como dizia a Administração de Joe Biden, salienta o site Axios.

Foto
Base de helicópteros de ataque em Tomarovka, na Rússia, a 22 de Fevereiro, numa imagem de satélite da Maxar Maxar Technologies/Handout via REUTERS

Só que quando são divulgadas, as imagens podem ter três dias, por exemplo – o que não é útil quando se está a tentar saber onde está o inimigo naquele momento, como quer o Governo ucraniano, ao apelar às empresas de satélites. “Esta divulgação tem servido mais como relações públicas do que sido útil para o exército ucraniano. Não precisamos de saber onde os tanques russos estiveram há dois dias”, disse o empresário Max Polyakov ao site Ars Technica. A sua empresa, EOS Data Analytics, está a oferecer-se para analisar os dados de satélite para serem usados pelos militares ucranianos – se estes forem fornecidos pelas empresas.

“O conflito na Ucrânia cria uma oportunidade para as empresas de observação da Terra demonstrarem as suas capacidades”, disse à Spacenews Scott Herman, especialista em dados geoespaciais. Mas as empresas mais pequenas não dispensam clientes que paguem pelos seus dados, sublinhou Herman.

Todos estes factores serão considerados na eventual resposta das empresas de satélites ao pedido do Governo ucraniano. Outra questão é a possibilidade de as empresas sofrerem retaliações por parte da Rússia. Esse alerta foi dado pelo director do National Reconnaissance Office, Christopher Scolese: “Estamos a ver que a Rússia está empenhada na Ucrânia, e quer ganhar. Portanto, se puder, e se achar que isso não a fará perder o controlo do conflito, irá prolongá-lo para o espaço”, afirmou.

De que forma, Scolese não disse. Mas sublinhou que os russos já fazem interferência no sinal de GPS. “O importante é garantir que os vossos sistemas estão seguros, e bem vigiados, porque sabemos que no palco ciber os russos são actores eficazes”, sublinhou, como aviso às empresas de satélites.

Sugerir correcção
Ler 4 comentários