Economia russa já vacila perante pressão das sanções

Queda abrupta da divisa e filas às portas dos bancos surgem na Rússia, no dia em que o banco central foi forçado a colocar as taxas de juro a 20% para travar a depreciação da moeda e a escalada da inflação.

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Reuters/ANTON VAGANOV

A economia russa deu esta segunda-feira sinais claros de poder estar a entrar num círculo vicioso de queda da divisa e escalada da inflação, com o banco central a revelar sérias dificuldades em contrariar uma crise com características semelhantes às que ocorreram em economias emergentes no passado, mas que desta vez é provocada pelas sanções económicas e financeiras com que o Ocidente respondeu ao ataque da Rússia à Ucrânia.

As medidas decididas durante o fim-de-semana pelos EUA, União Europeia e Reino Unido parecem ter sido o golpe capaz de fazer vacilar a economia russa. O bloqueio do acesso de parte dos bancos russos ao sistema de mensagens para transacções internacionais Swift e, principalmente, o congelamento das reservas de divisas estrangeiras detidas pelo banco central russo na Europa e nos Estados Unidos, acentuou a quebra de confiança dos mercados no sistema financeiro da Rússia e na sua divisa. Logo ao início do dia, a queda do rublo face ao dólar superou os 30%, com a divisa a bater sucessivamente novos mínimos históricos.

O banco central russo não demorou a responder, mas, em vez de, como fez na última quinta-feira, intervir directamente no mercado comprando rublos com as divisas estrangeiras que acumulou ao longo dos últimos anos, o que fez foi anunciar um aumento drástico das suas taxas de juro de referência de 9,5% para 20% e decretar a obrigação das principais empresas exportadoras russas, que incluem as produtoras de petróleo e gás natural, de trocarem 80% das suas receitas em divisas estrangeiras por rublos.

O anúncio das medidas fez reverter parte das perdas do rublo face ao dólar, mas mesmo assim, ao fim do dia a tendência já era outra vez de descida e depreciação ao dia anterior cifrava-se acima dos 20%.

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“Tem-se dado muita importância ao Swift, mas parece-me que o congelamento das reservas do banco central é a sanção mais importante. Impede que a autoridade monetária russa consiga intervir de forma significativa no mercado cambial para defender a sua moeda, já que não tem à sua disposição as divisas estrangeiras que precisa para comprar rublos. Isto abre a porta a ataques especulativos à moeda e cria o risco de entrada num círculo vicioso de queda da divisa e subida da inflação”, explica Miguel Faria e Castro, economista na Reserva Federal de St. Louis, nos Estados Unidos.

Esta quebra abrupta do valor da divisa, para além de levar a uma subida imediata da inflação, faz com que as pessoas optem por gastar imediatamente o seu dinheiro para comprar bens que não percam o seu valor e tentem ficar na sua mão com o máximo de divisas estrangeiras, como o dólar ou o euro. Esses passos já começam a ser evidentes na Rússia, com relatos de aumentos das compras de jóias e com o surgimento de filas maiores que o normal junto aos bancos e às caixas de levantamento automático.

“Em economias emergentes, como a da Rússia, é comum as pessoas terem contas bancárias em divisas estrangeiras. Mas agora, o facto de o banco central ter perdido o acesso a parte das suas divisas, faz essas pessoas terem dúvidas de que o seu banco terá os dólares ou os euros suficientes no caso de quererem levantar o dinheiro. É por isso que começam as corridas aos bancos”, diz o economista.

A arma económica que falta

Com o aumento das taxas de juro que agora realizou, o banco central tenta dar um incentivo aos aforradores para manterem os seus depósitos (já que os bancos comerciais irão também subir os juros oferecidos), limitar a subida da inflação e, principalmente, tentar contrariar a queda da divisa nos mercados internacionais. É, como explica Miguel Faria e Castro, “uma das únicas coisas que conseguem fazer, mas tem um custo, que é encaminhar ainda mais a economia para uma recessão”.

Uma subida das taxas de juro, ainda para mais da dimensão agora decidida na Rússia, constitui um obstáculo ao acesso ao crédito e, por isso, tem como resultado uma contracção do consumo e do investimento ainda maior do que a que já aconteceria tendo em conta o efeito negativo na confiança que a actual conjuntura está a gerar.

A outra medida tomada esta segunda-feira pelo banco central – a de obrigar as empresas a venderem as divisas estrangeiras que obtém com as suas exportações – também pode constituir uma ajuda para a evolução do rublo nos mercados internacionais.

No entanto, isso apenas acontecerá enquanto for possível às empresas russas continuarem a vender petróleo e gás natural. Até agora, para evitarem a imposição de custos mais severos para as suas economias, EUA e Europa têm tido a preocupação de poupar o comércio de produtos energéticos com a Rússia. Por exemplo, existem isenções no bloqueio do acesso ao Swift para as transacções deste tipo de bens.

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“É a última grande medida que falta tomar: acabar com as exportações de petróleo e gás natural. Mas face à grande dependência que ainda existe na Europa relativamente às exportações destes bens por parte da Rússia, a verdade é que é bastante prejudicial para os dois lados. Aliás, qualquer um dos lados pode usar esta arma”, afirma o investigador da Reserva Rederal de St. Louis.

A possibilidade de não ser apenas a Rússia a registar perdas nesta guerra económica está a ser colocada pelos próprios mercados, tendo-se registado esta segunda-feira perdas significativas nos principais índices em Wall Street e nas bolsas europeias, principalmente no que diz respeito ao sector financeiro.

No mercado petrolífero, a tendência continua a ser a manutenção do nível muito elevado de preços, acima de 100 dólares por barril, algo que se irá repercutir junto dos consumidores de todo o mundo. Mas também aqui, as empresas petrolíferas russas começam a ter mais dificuldades em saírem beneficiadas. O preço do petróleo vendido pela Rússia já está, nos mercados internacionais, a registar um desconto face ao petróleo vendido no mercado do mar do Norte ou no mercado norte-americano. Isto é, certamente receosos do risco que constitui actualmente estar à espera de produtos provenientes da Rússia, os compradores estão a tentar encontrar petróleo noutros mercados e isso faz com que o preço do barril recebido pelas empresas russas fique mais baixo do que o registado noutros mercados.

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