Amanhã de manhã é conhecida a sentença de Francisco Pedro, o activista pelo clima de 35 anos acusado de desobediência qualificada. Em Abril de 2019, enquanto outros membros da campanha Aterra lançavam aviões de papel da plateia, Francisco subiu ao palco e interrompeu brevemente António Costa, que discursava enquanto secretário-geral do PS, durante o 46.º aniversário do partido. Queria denunciar “o crime da expansão do aeroporto de Lisboa”, no Montijo. 

A Aterra acredita na absolvição do activista e disse, desde a acusação, que o processo “apenas pretendia intimidar quem age perante o ecocídio em curso” — e que deveria ser o governo e a multinacional Vinci a sentarem-se em tribunal. 

Cada vez mais activistas estão a ser detidos durante demonstrações pacíficas e levados a tribunal, alerta a Global Witness, que em sentido contrário alerta que se revela difícil responsabilizar aqueles que destroem o ambiente. Criminalizar o ecocídio, defende a organização, “é uma parte fundamental da luta contra as alterações climáticas”.

Um movimento crescente de organizações, activistas e advogados pelo clima tentam acrescentar o ecocídio à muito reduzida lista de crimes internacionais. O Tribunal Penal Internacional julga actualmente os mais graves crimes internacionais: genocídio, crimes contra a Humanidade, crimes de guerra e agressão. O ecocídio chegou a estar em cima da mesa, mas caiu durante a votação final dos crimes que integrariam a jurisdição do tribunal, no final da década de 1990 — mesmo depois de a proposta incluir a condição de ameaça à saúde ou sobrevivência de uma população. 

Graças ao trabalho dos juristas da campanha Stop Ecocide, em 2021, o ecocídio ganhou uma definição jurídica e, à medida que os impactos da crise climática são cada vez mais uma ameaça aos direitos humanos básicos, ficou novamente mais perto de ser incorporado como um quinto crime no Estatuto de Roma, o tratado que orienta o funcionamento do tribunal. Os acidentes nucleares transfronteiriços, os derrames de petróleo e a desflorestação em massa da Amazónia são algumas das actividades humanas que integrariam o crime de ecocídio: actos ilícitos ou negligentes cometidos com o conhecimento que existe uma probabilidade substancial de danos graves, generalizados ou a longo prazo causados no meio ambiente”.

Mais do que processar e multar empresas, que já orçamentam estas penalizações, a inclusão do crime faria com que “os indivíduos que são responsáveis por actos ou decisões que causam danos ambientais graves pudessem ser sujeitos a procedimentos criminais”. Como lembram os fundadores da campanha, ecocídio vem do grego oikos (casa) e do latim cadere (matar): significa, literalmente, matar a nossa casa.

Desde aí que muitos países, maioritariamente impulsionados pela ala verde do parlamento, têm discutido e votado o reconhecimento do crime de ecocídio, tanto no código penal do país como a nível internacional. Recentemente, França aprovou a criação do delito de ecocídio para casos de poluição ambiental praticados de forma intencional, uma das recomendações da Convenção de Cidadãos pelo Clima, o grupo criado pelo Presidente Emmanuel Macron para incentivar a participação dos cidadãos nas políticas relativas às alterações climáticas. 

Poderá demorar anos até um dos 123 países membros do TPI propor a inclusão do crime, que terá de ser aceite e apoiada por uma maioria de dois terços dos Estados Partes. Esta delonga é uma das principais críticas feitas à eficiência das acções que judiciais que irrompem em nome do clima e dos direitos humanos, umas atrás das outras, com novos e criativos argumentos legais para sentar empresas e estados nos tribunais por todo o mundo. Uma base de dados do Sabin Center for Climate Change Law da Columbia Law School arquiva documentos de mais de mil casos relacionados com as alterações climáticas por todo o mundo. Serão cada vez mais.

Durante a última semana, que mereceu vários apelos à poupança de água, o PÚBLICO escreveu sobre como a eficiência hídrica das habitações, ao contrário da muito falada eficiência térmica, ainda não é uma prioridade em Portugal. Os pedidos de apoio a obras que permitam poupar água em casa são “residuais”, escreve hoje Abel Coentrão, depois de ter explicado como as soluções para reutilizar as chamadas “águas cinzentas” carecem de incentivos e ainda são caras face à alternativa: deixar a água correr.

Regressamos para a semana, com os Pés na Terra. Se tiver comentários ou ideias pode enviá-las para acoentrao@publico.pt ou renata.monteiro@publico.pt. Até lá, fica uma mão cheia de sugestões de leitura: