Morreu Olavo de Carvalho, o guru intelectual do “bolsonarismo”

Nos últimos tempos, o escritor tornou-se um crítico de Bolsonaro, que acusava de ter cedido aos interesses da classe política tradicional.

Foto
Olavo de Carvalho tornou-se uma das principais inspirações de Bolsonaro JOSHUA ROBERTS / Reuters

O escritor brasileiro Olavo de Carvalho morreu na madrugada desta terça-feira, aos 74 anos. Era considerado o ideólogo do “bolsonarismo”, frequentemente citado pelo Presidente Jair Bolsonaro, embora nos últimos tempos se tenha tornado um crítico do chefe de Estado.

Carvalho tinha sido diagnosticado com covid-19 e encontrava-se hospitalizado em Richmond, na Virgínia (EUA), onde vivia há mais de uma década, mas a causa da morte não foi revelada. O escritor era crítico das medidas de combate à propagação do vírus SARS-CoV-2, como a utilização da máscara, e tinha objecções à vacinação.

Bolsonaro assinalou a morte de Carvalho, definindo-o como “um dos maiores pensadores da história” do Brasil. “Olavo foi um gigante na luta pela liberdade e um farol para milhões de brasileiros”, escreveu numa publicação nas redes sociais. Também os filhos do Presidente lamentaram a morte do escritor.

No mês passado, Olavo de Carvalho fez as suas críticas mais fortes a Bolsonaro, acusando-o de ter falhado na “luta anticomunista”. Apesar de afirmar que iria votar no actual Presidente nas eleições de Outubro, disse que o faria apenas “por falta de alternativas”.

Durante anos, Olavo de Carvalho foi um obscuro autor de livros e teses que se situavam na fronteira entre o pensamento político, o catastrofismo e um ódio brutal à esquerda, conceito em que abarcava praticamente todas as instituições do Brasil pós-democrático. A falta de rigor e uma certa aproximação ao mundo das teorias da conspiração levaram-no à ostracização pelo meio académico, que o próprio também criticava como sendo dominado pela omnipresente “esquerda”.

Ainda antes da generalização das redes sociais, Carvalho, que chegou também a ser astrólogo, fundou um canal no YouTube para difundir o seu “curso de filosofia”, em que discorria durante horas sobre o “domínio comunista” sobre a generalidade das democracias ocidentais, com um discurso que tanto mobilizava conceitos da teoria política como o calão mais básico.

Quando a onda conservadora varre o Brasil, entre 2015 e 2018, um período marcado pela forte contestação ao Governo do Partido dos Trabalhadores que culmina com o impeachment de Dilma Rousseff, Olavo de Carvalho estava já na linha da frente para se tornar uma inspiração para quem melhor corporizasse o espírito do tempo.

Alguns dos seus livros, como O Imbecil Coletivo ou O Mínimo Que Você Precisa Saber para não Ser Um Idiota, tornaram-se sucessos de venda durante esse período, ajudando a formar o pensamento político de muitos daqueles que ajudaram Jair Bolsonaro a chegar ao Palácio do Planalto, em 2018.

Bolsonaro nunca escondeu que o escritor era uma das suas principais influências – quando foi eleito, tinha consigo um dos livros de Carvalho. Na sua configuração inicial, o “olavismo” era um dos pilares do Governo, com vários ministros nomeados por sugestão do autor.

Esta era a ala mais radical, defensora de um conservadorismo extremo e que rejeitava negociações até com outros sectores da direita, incompatibilizando-se igualmente com os militares. Nesta luta por influência, acabaram por ser os “aprendizes” de Olavo a cair, restando hoje apenas a ministra da Mulher e da Família, Damares Alves, como única representante dessa ala.

Sugerir correcção
Ler 32 comentários