Nuno reabilitou para jovens o edifício em que cresceu, em Paço de Arcos
Arquitecto e antigo residente do centenário edifício Villa Longa, Nuno Couto liderou o projecto de reabilitação. Câmara de Oeiras espera colocar 200 fogos num programa de Habitação Jovem.
À medida que se sobe, a paisagem vai-se revelando pouco a pouco. Mas só ao cimo das escadas, lá no piso mais alto, é que se percebe a posição do edifício. Em seu redor não há outro que se assemelhe em altura e, não fosse o nevoeiro, via-se toda a barra do Tejo entre Oeiras e a Ponte 25 de Abril.
Nestas águas-furtadas concentra-se um invulgar número de pessoas. Os futuros inquilinos, que receberão as chaves daí a pouco, fazem-se fotografar com a vista. A comitiva, que fez questão de vir ao último andar, solta comentários risonhos de inveja. Este é um dos 32 fogos do edifício Villa Longa que vai ser arrendado a custos controlados no Programa de Habitação Jovem da Câmara de Oeiras.
“Isto dava um bom hotel de charme”, comenta Isaltino Morais depois da visita. O autarca revela que as negociações para comprar o histórico imóvel em Paço de Arcos começaram há 12 anos. “Num determinado momento ainda pensámos em vender, mas demos preferência ao alojamento de jovens.”
O Villa Longa, a meio caminho entre a estação de comboios e o bairro J. Pimenta, foi construído há 100 anos. “Eram 12 apartamentos”, explica o arquitecto Nuno Couto, autor da reabilitação que agora foi feita. Exceptuando os do piso superior, mais pequenos, todos tinham 160 metros quadrados em que cabiam quatro quartos, uma sala, despensa, uma sala de jantar, cozinha e WC. Com o avançar do século, as duas casas por piso passaram a albergar mais do que duas famílias. E agora em cada andar há seis apartamentos T0 e T1 entre os 44 e os 75 metros quadrados.
As raquetes perdidas
Nuno Couto nasceu ali e ali morou até aos 30 anos. Lembra-se do estado de degradação em que o edifício se encontrava quando os donos propuseram demoli-lo para construir uma coisa nova. Foi então que a Câmara de Oeiras se envolveu no processo e comprou o imóvel.
“Quando saímos de casa dos pais deixamos sempre qualquer coisa. Eu deixei aí umas raquetes de pingue-pongue, apareceram no primeiro dia das demolições”, conta o arquitecto. “Caiu uma lágrima”, assume.
Quase todo o miolo do edifício foi deitado abaixo devido à degradação. A zona central, onde existe uma escadaria em madeira e ferro e onde se acede aos apartamentos, permaneceu. Nos patamares estão rasgadas grandes janelas arqueadas com varanda para a rua. “O edifício é todo ele muito formal, em estilo neoclássico, mas tem estas decorações art déco só nesta zona”, sublinha Nuno Couto. Já dizia a memória descritiva de 1918: “A architectura da casa é simples, mas cuidada, havendo harmonia entre as suas linhas.”
Quando foi construído pelo empresário José Villalonga, o edifício era para ter sido o primeiro de um conjunto de prédios de rendimento. Mas o plano de uma “Nova Paço de Arcos” não foi por diante. “O prédio acabou por ficar dissonante”, diz o arquitecto.
“Há mais de 15 anos que a câmara anda a recuperar edifícios históricos degradados”, afirma Isaltino Morais. Cerca de 80 apartamentos foram já entregues a pessoas com um máximo de 35 anos e o objectivo é chegar às 200 casas. Diz o autarca que o objectivo do Programa Habitação Jovem é “recuperar os centros históricos” e “levar vida” para esses lugares. “Sabemos que não respondemos a todos os jovens. Portugal tem de investir muito mais em habitação. Somos dos países mais pobres da Europa e aquele em que há mais proprietários de casas”, critica.