G7 e UE denunciam “erosão” da democracia em Hong Kong, China critica “interferências”
As autoridades de Pequim e Hong Kong “sabem melhor como garantir a prosperidade e a estabilidade” do território, afirma o regime chinês em resposta às críticas, depois de uma eleição com abstenção recorde.
A China respondeu esta terça-feira às críticas de vários países sobre as eleições de domingo em Hong Kong, as primeiras realizadas depois da aprovação de uma lei que limita as candidaturas a “patriotas” pró-Pequim, acusando-os de interferirem nos seus assuntos. Na votação para o Conselho Legislativo, com uma abstenção recorde – a participação ficou-se pelos 30,2% –, mais de 90% dos lugares disponíveis foram naturalmente ocupados por candidatos próximos da China.
As primeiras reacções vieram dos responsáveis dos Negócios Estrangeiros dos Estados Unidos, Reino Unido, Nova Zelândia, Austrália e Canadá, que consideraram que estas eleições “reverteram a tendência” que existia desde a transferência de soberania do território para a China, em 1997, de haver “candidatos com vários pontos de vista”. No comunicado, estes países dizem-se “preocupados com a erosão dos elementos democráticos do sistema eleitoral da Região Administrativa Especial”, considerando que “acções que comprometem os direitos, liberdades e o grande grau de autonomia de Hong Kong estão a ameaçar o desejo comum de ver Hong Kong ser bem-sucedida”.
Seguiram-se o G7 e a União Europeia, denunciando uma “erosão” da democracia. Numa reacção conjunta, os ministros dos Negócios Estrangeiros da França, Alemanha, Canadá, EUA, Itália, Japão e Reino Unido apelaram à China para “respeitar os direitos e as liberdades fundamentais em Kong Kong”. Já o Alto Representante da UE para a Política Externa, Josep Borrell, estimou que a votação constitui “uma nova etapa no desmantelamento do princípio ‘um país, dois sistemas’”.
Na terça-feira de manhã, a embaixada da China na Austrália reagiu acusando o grupo dos “Five Eyes” (o mecanismo de cooperação e troca de informações entre os EUA, Reino Unido, Nova Zelândia, Austrália e Canadá) de “inverterem a verdade” e tentarem “imiscuir-se na política de Hong Kong, interferirem nos assuntos internos da China e obstruírem os desenvolvimentos na China”.
“Hong Kong é da China”, diz a embaixada, acrescentando que as autoridades de Pequim e Hong Kong “sabem melhor como garantir a prosperidade e a estabilidade de Hong Kong”. As eleições, assegura ainda, foram “justas, equilibradas e abertas” a todos os eleitores e “apoiadas por todas as comunidades da sociedade de Hong Kong”.
Na véspera, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China, Zhao Lijuan, justificara a alta abstenção com a pandemia, a acção de “elementos anti-chineses decididos a destruir Hong Kong e a interferência de forças externas”. Já a chefe do executivo de Hong Kong, Carrie Lam, recusara analisar a participação, saudando que o território esteja “de regresso ao bom caminho, o de ‘um país, dois sistemas’”, falando do princípio que deveria ter garantido uma autonomia ao território e que os críticos dizem que está a ser posto em causa nos últimos anos através de medidas como a lei de segurança nacional.
O novo sistema eleitoral reserva a candidatura a quem dê provas de “patriotismo” político, ou lealdade a Pequim, e de que não tem intenções de pôr em causa a “segurança nacional”: com centenas de candidaturas chumbadas, apresentaram-se aos 90 lugares 153 candidatos, e os “moderados” ou “neutros” eram menos de uma dezena. Só um candidato descrito como moderado foi eleito.
As eleições realizaram-se após um adiamento de 15 meses, justificado com a luta contra a pandemia de covid-19, mas anunciado depois de 600 mil pessoas terem participado nas primárias não-oficiais do movimento pró-democracia para escolher os candidatos que queriam ver nos boletins a 6 de Setembro de 2020. Entretanto, a maioria dos dirigentes da oposição estão detidos ou no exílio.
Horas depois do encerramento das urnas, o Governo chinês publicava um Livro Branco onde descreve como “brilhantes” as perspectivas para a democracia em Hong Kong, agora que a China conseguiu “restabelecer a ordem” na antiga colónia britânica, graças à imposição da lei da segurança nacional, em 2020, e da nova reforma eleitoral.