Desafios actuais e futuros do vírus sincicial respiratório em debate

A conferência “Os desafios emergentes na prevenção do vírus sincicial respiratório” realizou-se na Culturgest, em Lisboa, no passado dia 20 de Novembro. Organizado pelo Público, em parceria com a Astrazeneca e a Nascer Prematuro – Associação Portuguesa de Pais de Bebés Prematuros – e com a participação de um painel composto por representantes de sociedades científicas, especialistas e associações de pais de crianças prematuras, o debate foi transmitido em directo no site, no Facebook e no Youtube do Público.

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Conferência "Desafios emergentes na prevenção do Vírus Sincicial Respiratório" António Saraiva
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Sérgio Alves, presidente da Astrazeneca Portugal
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Elsa Silva, secretária da presidência da Associação Nascer Prematuro
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Ana Paula Rodrigues, Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge
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Manuel Sánchez Luna, presidente da Sociedade Espanhola de Neonatologia
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Mesa Redonda: "O presente e o futuro do combate ao Vírus Sincicial Respiratório"
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Hugo Martinho, responsável da área médica biofarmacêutica da Astrazeneca

Apesar de ser muito comum e constituir uma das principais causas de infecções respiratórias em várias faixas etárias, o vírus sincicial respiratório (VSR) não é muito divulgado e conhecido por parte da população. Mas, particularmente nas crianças, é o responsável pela bronquiolite e a pneumonia constituindo uma das principais causas de internamento hospitalar abaixo dos dois anos de idade.

Na sessão de abertura, o presidente da Astrazeneca em Portugal, Sérgio Alves, começou por referir o objectivo da farmacêutica em “criar parcerias com a sociedade em geral, com profissionais de saúde, associações de doentes e cuidadores para gerar discussão e encontrar as melhores soluções de como evoluir na gestão da doença e na definição conjunta de prioridades e estratégias efectivas que permitam melhorar os cuidados de saúde”. Particularmente nesta fase de incerteza em que todos vivemos, Sérgio Alves reforçou a importância de apostar na prevenção e na protecção das crianças “evitando o desenvolvimento de doença grave, de internamentos e de sofrimento”.

Elsa Silva, secretária da presidência da Associação Nascer Prematuro e enfermeira em cuidados intensivos neonatais há 23 anos, também esteve na sessão de abertura aproveitando para apresentar esta associação de pais de bebés prematuros em que colaboram também profissionais de saúde e abordou um projecto de serviços domiciliários em que se observou neste último ano “um acréscimo de desafios, não só por todas as restrições que a pandemia tem trazido mas também, sobretudo, porque estes pais estão receosos, pelo facto de os filhos poderem contrair o vírus SARS-CoV-2 mas também esta entidade, o VSR, para o qual, a maioria dos pais não está alertado”. É essencial prevenir e perceber os sinais e os sintomas das complicações associadas a este vírus. “Espero que depois deste debate, consigamos sair daqui com ideias e estratégias para prevenir o VSR”, sublinhou.

A realidade nacional do VSR

Ana Paula Rodrigues, médica de Saúde Pública do Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) fez uma apresentação onde abordou a realidade actual e o impacto da pandemia no aumento de casos associados ao VSR. “Esta realidade, não sendo desconhecida, tem sido alvo de muita atenção por parte dos meios de comunicação social”, começou por afirmar. “Não é um vírus novo apesar de muitos dos pais não terem conhecimento do mesmo.” Com recurso a gráficos, a oradora explicou que, entre 2010 e 2017, com maior ou menor intensidade, tem existido um pico de VSR em Portugal, tal como acontece com outros vírus respiratórios.

Citando um estudo apresentado pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC), no qual também Portugal participou com os dados que tem, Ana Paula Rodrigues explicou que a epidemia de VSR surge sobretudo no final de cada ano, entre o fim de Dezembro e o início de Janeiro, atingindo o seu pico em meados do primeiro mês do ano com uma duração, em média, de dez semanas. “Nós, que trabalhamos em vigilância, costumamos dizer que o VSR antecipa a epidemia de gripe em algumas semanas.” Com a pandemia tudo mudou e devido às medidas de higiene e segurança que todos passámos a ter, além dos confinamentos a que fomos sujeitos, não houve praticamente circulação de VSR em Portugal no ano passado. “Houve 60 detecções por semana, o que comparado com um inverno normal, foi um número muito reduzido e isto foi o que aconteceu entre Outubro e Maio deste ano”, explicou a epidemiologista. “Este ano, e como havia VSR a circular em outros países do mundo, nomeadamente, na Europa, estendemos a vigilância e detectámos que houve um surgimento de surto do VSR em Julho, notando-se uma redução em Agosto – fruto do encerramento das escolas e decorrente do período de férias – e tem havido um crescimento das detecções em Setembro, Outubro e Novembro.”

Nesta rede de vigilância, neste momento [à data de realização desta conferência], o VSR é o vírus mais frequente nos hospitais portugueses que colaboram com o INSA. “Temos uma epidemia antecipada no tempo, o que levou a Direcção Geral da Saúde (DGS) a emitir uma recomendação de antecipação da profilaxia para as crianças de maior risco.” A oradora referiu ainda que não se sabe se vamos continuar a ter essas detecções no Inverno – e que considerou como provável – mas não é possível prever como cursará a epidemia nesta fase. A grande maioria de crianças a quem foi detectado VSR tem menos de quatro anos (71%) e verificou-se ainda que o grupo dos idosos é aquele que mais preocupa os especialistas, ao nível da saúde no adulto, pelas consequências associadas, o que é demonstrativo da maior mobilidade das pessoas e do contágio por este vírus.

O que pode ser melhorado no futuro e como se pode conhecer com mais detalhe as características das crianças infectadas? “Temos um projecto conjunto com a Sociedade Portuguesa de Pediatria que pretende implementar um sistema de vigilância de VSR em pediatria, em crianças até aos dois anos, porque é o grupo que mais nos preocupa, de maneira a conseguirmos ter mais informação sobre as características destes meninos em relação à infecção”, explicou Ana Paula Rodrigues.

Como notas finais, adiantou que a epidemia teve um início precoce porque não existiu no Inverno passado, o que antecipou as medidas profilácticas (específicas e genéricas); as crianças menores de cinco anos constituem o grupo mais afectado e isso é comum aos anos anteriores e tem-se verificado um progressivo aumento de infecções nos idosos. “Estamos de olhos postos num futuro próximo com a implementação deste sistema de vigilância de VSR aos serviços de pediatria a crianças menores de 24 meses”, rematou.

Incidência de VSR, a experiência de Espanha

Manuel Sánchez Luna, presidente da Sociedade Espanhola de Neonatologia (SEN) participou de forma remota no evento com a apresentação “Antecipação do período de imunização” que consistiu na divulgação de estudos do Sistema Público de Saúde espanhol com dados de crianças internadas nos hospitais do País. Entre 2004 e 2012, foi analisado mais de um milhão de altas hospitalares de crianças com menos de um ano. “Confirmámos que a causa mais frequente dos internamentos foi a bronquiolite, com 9,2% dos casos e que a causa mais frequente da bronquiolite aguda foi a infecção por VSR, responsável por 64 mil hospitalizações no nosso País em bebés com menos de um ano.” Verificou-se ainda que esta quantidade de infecções por VSR foi aumentando ao longo dos anos. “Sabe-se ainda que alguns bebés têm maior risco de serem hospitalizados quando infectados por este vírus, como os bebés prematuros, os bebés com malformações congénitas, com doença respiratória crónica e outras doenças, como a síndrome de Down e doenças auto-imunes”.

Ao comparar o grupo de crianças mais vulneráveis com outras sem estes factores de risco, os resultados revelaram-se surpreendentes. “Ser prematuro em Espanha é algo que protege contra o VSR grave porque os nossos prematuros têm menos risco de hospitalização do que os restantes bebés [de termo] e isto é válido também para os bebés com malformações congénitas e para os que têm doenças respiratórias crónicas”, afirmou o Professor Sánchez Luna. “Estas crianças estão especialmente protegidas. Insistimos muito na importância de manter o aleitamento materno nos primeiros seis meses e, se possível, prolongar até ao primeiro ano, recomendamos que os bebés estejam em ambientes de pouco risco para a infecção [livres de tabaco, por exemplo], manter medidas de higiene e evitar que os adultos com sintomas de infecções respiratórias contactem com as crianças.”

Além de todas estas recomendações, o presidente da SEN afirmou que “é administrada imunoprofilaxia para proteger estas crianças contra o VSR. Quando um bebé prematuro é infectado por VSR tem quatro vezes mais probabilidade de ser reinfectado e de voltar a ser internado depois da alta. Isto acontece também com bebés com doença respiratória crónica (displasia broncopulmonar) e com doenças neuromusculares.” Confirma-se então que estas populações são de grande risco. Manuel Sánchez Luna referiu ainda o impacto dos prematuros tardios em Espanha onde existe maior dificuldade de aplicar a imunoprofilaxia. Um outro estudo que analisou 95 mil altas hospitalares onde se incluiu o Sistema Nacional de Saúde espanhol, mas também o sistema privado, entre 2012 e 2013, veio demonstrar que um bebé que nasce entre as 34 e as 36 semanas, em comparação com bebés que nascem de termo tem, “de forma significativa, mais risco de reinternamento hospitalar. Nos primeiros 30 dias após a alta, há uma grande probabilidade de voltarem a ter bronquiolite” e, esta realidade sucede também no primeiro ano de vida, pela mesma causa, ou seja, “por bronquiolite causada por VSR”.

Um outro estudo realizado durante um ano, na Escócia, que acompanhou mais de 600 mil crianças até dois anos de idade veio demonstrar que “qualquer prematuro de qualquer idade gestacional tem um risco acrescido e significativo de internamento hospitalar ao ser infectado por VSR e o mesmo acontece com os doentes com cardiopatias congénitas ou com doenças respiratórias crónicas.” Com estas conclusões, um grupo de especialistas europeus elaborou um conjunto de recomendações que mantêm os grupos de risco devidamente protegidos e onde se alerta para “a pressão economicista das companhias de seguros dos EUA, com base em evidência científica”. A Sociedade Espanhola de Neonatologia actualizou as recomendações, em Outubro de 2019 com a inclusão desses grupos mais vulneráveis no acesso à imunoprofilaxia.

O presidente da SEN referiu ainda o impacto da pandemia de Covid-19 neste último ano indicando que a última epidemia de VSR aconteceu no inverno de 2019, tal como aconteceu em Portugal e em outros países europeus. Neste momento, a covid-19 está a ser um problema pois desde o início da Primavera, com o aumento da taxa de vacinação, o levantamento das medidas e a mobilidade normal que havia antes da pandemia, o VSR tem surgido fora do período habitual de infecção. “Dados do Instituto de Saúde Carlos IIII, em Espanha, vieram reforçar um alerta para que todos os hospitais ponderem antecipar a protecção de bebés de alto risco durante o Verão”, concluiu. “Estamos preocupados pois já temos, neste momento, uma taxa muito importante de infecções graves devido ao VSR em algumas comunidades e antecipamos que este inverno seja especialmente problemático”, concluiu, alertando ainda para as crianças que até aos dois anos estiveram confinadas em casa e as mães que tiveram bebés durante a pandemia não contactaram com o vírus e não desenvolveram anticorpos naturais durante o ano passado. “Iremos ter casos mais graves este ano.”

“O presente e o futuro do combate ao vírus sincicial respiratório”

A mesa redonda desta conferência juntou Inês Azevedo, presidente da Sociedade Portuguesa de Pediatria (SPP), Cármen Carvalho, presidente da Sociedade Portuguesa de Neonatologia (SPN), Maria João Batista, presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia Pediátrica (SPCP), António Morais, presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP), Elsa Silva - secretária da presidência da Associação Nascer Prematuro e Paula Guerra, membro da direção da XXS - Associação Portuguesa de Apoio ao Bebé Prematuro. Durante hora e meia, os vários players traçaram os desafios actuais e futuros do VSR e de outras infecções respiratórias. António Morais começou por explicar que a incidência de todos os vírus respiratórios baixou no ano passado devido às medidas de etiqueta respiratória e dos sucessivos confinamentos. “Este ano, para além do aumento da frequência – que já se verifica – também haverá um aumento provável da intensidade e morbilidade destas infecções”, referiu.

Relativamente ao VSR em específico, Inês Azevedo começou por contextualizar que este “é um vírus que tem imenso impacto em termos pediátricos. Todos os pediatras em geral sabem que existe um pico muito elevado pelo VSR que é antecipado por nós pois já sabemos que os serviços de urgência começam a ficar muito pressionados em finais de Outubro, início de Novembro, tais como, as consultas e os internamentos”. No ano passado, apesar de não ter havido praticamente infecções, “o encerramento das escolas foi o problema major para a pediatria nacional porque não podemos falar apenas de saúde respiratória. O maior impacto – que decorrerá durante muitos anos – que a pandemia teve no ano passado foi a falta de socialização de crianças e adolescentes”, alertou, referindo o grave problema de saúde mental verificado em 2020, em particular, na adolescência. É preciso então “encontrar o equilíbrio perfeito entre proteger as crianças que são de risco e mais susceptíveis a contrair este vírus nos primeiros meses de vida, mas não podemos continuar a protegê-los a vida toda porque elas têm de entrar no mundo”.

A Sociedade Portuguesa de Pediatria, em conjunto com outras sociedades científicas, colaborou com a DGS para antecipar a profilaxia das crianças mais frágeis e de risco durante o verão, de forma a protegê-las contra o VSR logo desde Setembro. Cármen Carvalho salientou que no verão, os vários serviços hospitalares começaram a receber casos de infecções por VSR antecipadamente, o que gerou uma grande preocupação entre os profissionais de saúde “e rapidamente se criou uma sinergia muito positiva permitindo reunir em tempo ultra-recorde uma série de peritos e de recolha de dados a nível nacional. Isto foi essencial para criar um grupo de trabalho com a chancela da DGS, a neonatologia, os cuidados intensivos pediátricos, a cardiologia pediátrica, a pneumologia pediátrica e o INSA (que nos deu apoio ao nível de dados epidemiológicos) para se ponderar todos os aspectos e, obviamente, que a parte económica não pode ser negligenciada”. A presidente da SPN adiantou ainda que “é fundamental manter as medidas de prevenção gerais”.

Paula Guerra contou a sua experiência enquanto mãe de uma bebé prematura que nasceu em 2001, às 26 semanas, com 615 gramas e 28 centímetros. “A Beatriz teve muitas intercorrências, foi operada ao coração e ao pulmão ainda na unidade e, sete anos depois, teve de fazer uma nova cirurgia cardíaca. Um dos maiores problemas dela era a questão respiratória, esteve ventilada cerca de dois meses e quando estava em berço para ter alta, eu assisti a uma conversa com um grupo de médicos sobre a elegibilidade para um medicamento que eu não fazia a mínima ideia que existia e questionei do que se estava a falar.”

Paula sempre foi uma mãe muito atenta e, na altura, não existiam associações de pais para ajudar nestas e outras dúvidas. Por isso, tentou perceber o que seria isto de “estar elegível”. “Existem normas emitidas pela DGS e a Beatriz cumpria todos os requisitos para poder tomar este medicamento. É fundamental a literacia na saúde e a capacitação dos pais para que tenham toda a informação desde o primeiro momento e até antes – durante uma gravidez de risco – que garanta a confiança nas unidades de saúde e também nas políticas implementadas.” Acrescentou ainda que é importante que tenhamos “todos a consciência tranquila de que as medidas são tomadas independentemente dos custos financeiros que acatam no Estado. Temos de proteger os mais vulneráveis, as crianças, os idosos e as pessoas que estão em situação de doença”.

Elsa Silva referiu os cuidados prestados na família que podem levar a que os profissionais de saúde considerem os pais como verdadeiros parceiros. “Nesse sentido, eles saem das unidades a saber como se faz a prevenção de uma infecção.” Relativamente ao VSR, a representante da Nascer Prematuro referiu que muitos bebés já saem da neonatologia com a primeira imunização administrada e os pais estão alertados para isso. “No caso das visitas domiciliárias que temos feito, os pais não sabem desta possibilidade e quando são chamados ficam muito alarmados.” A Nascer Prematuro utiliza as redes sociais e dinamiza grupos de pais prematuros além de participar na elaboração de materiais em articulação com a Fundação Europeia para os Cuidados do Recém-Nascido (EFCNI – European Foundation for the Care of Newborn Infants) e com a XXS, em Portugal. Paula Guerra acrescentou que vai ser lançada uma campanha mundial de pais de bebés prematuros em conjunto com a EFCNI sobre o VSR.

A participação de Maria João Batista nesta mesa-redonda versou sobre as crianças com patologia cardíaca. “O VSR tem um impacto em termos pulmonares muito marcado, o que faz com que haja uma interacção entre o coração e o pulmão que piora uma situação que já em si é frágil nestes lactentes e pequenos bebés. São grupos que estão particularmente em risco”, adiantou. Os pais de crianças com cardiopatia congénita estão, por si só, mais alertados. A cardiologista pediátrica referiu também a diminuição da infecção por VSR no ano passado e o seu reaparecimento no decorrer de 2021, tal como foi sendo debatido em toda a conferência, mas realçou o facto de “começarmos a ter nos serviços de urgência de todo o País e também no ambulatório, mais crianças com infecções respiratórias e isso fez com que os profissionais de saúde em Portugal e um pouco por todo o mundo, tivessem de tomar decisões para a publicação de uma norma da DGS “em tempo recorde para antecipar a profilaxia do VSR em grupos bem definidos”. Por esse motivo, não se tem notado um aumento de casos de crianças infectadas com VSR internadas nem em cuidados intensivos ao contrário do que acontece com outras crianças sem factores de risco. “As medidas que estão a ser tomadas estão a ser eficazes na evicção dos casos graves de infecções víricas e, nomeadamente, do VSR.”

Na maioria das pessoas, num ano normal, cerca de 70% já tiveram uma infecção por este vírus e, nos dois primeiros anos, praticamente 100% das crianças também. As percentagens foram adiantadas por Inês Azevedo. “Em regra, a partir dos dois anos, a infecção é comum e banal, embora em pessoas mais susceptíveis, possa causar agudizações e exacerbações de doença importantes.” Quando os pais notam que o bebé se cansa e tem dificuldade respiratória, sobretudo ao segundo, terceiro dia de infecção, devem recorrer ao médico assistente ou a um serviço de urgência. “Um fenómeno a que assistimos no ano passado foi o facto de as mães e os adultos em geral terem medo de se dirigir aos hospitais [devido à pandemia de Covid-19] e há que lembrar que estes são sítios seguros e, em situação de doença aguda, não devem atrasar a procura destes serviços”, chamou a atenção.

No final da mesa-redonda, foram comentados os dados apresentados no início da manhã por Manuel Sánchez Luna e, a esse respeito, Cármen Carvalho referiu que “Espanha tem dados nacionais que nós ainda não temos, mas já começámos a trabalhar nisso. É fundamental sabermos o nosso ponto da situação para fazer uma análise de uma forma mais global”. Relativamente às guidelines da DGS sobre as crianças que são elegíveis para a imunoprofilaxia, afirmou que as mesmas foram elaboradas por “grupos de peritos especializados na área e com níveis de evidência bem definidos, o que não significa que não se possam rever, mas essas são decisões que competem à DGS”.

Em Portugal, já existem bastantes estudos sobre este tema com análises das bases de dados através dos códigos de alta dos hospitais, avançou Inês Azevedo. “Fizemos a análise de 2000 a 2015, num espaço temporal muito vasto, que nos permitiu perceber que, em Portugal, com bronquiolite aguda e em crianças abaixo dos dois anos, em anos normais, foram internadas cerca de 5000 crianças por ano. É um número muito elevado e significativo, não só no que respeita ao impacto emocional para a criança e para a família, mas também em termos económicos. Estamos a falar de muitos milhões de euros que são gastos por ano e isto se abordarmos apenas os custos directos relacionados com a hospitalização.” Mais de 90% das crianças que são internadas no hospital não tem qualquer factor de risco, sublinhou.

Inês Azevedo fez ainda uma distinção entre vacina e profilaxia indicando que existe “uma luz ao fundo do túnel” no que respeita a investigação e a ensaios clínicos que podem vir a desenvolver novas vacinas contra este vírus, tanto nas grávidas como para os idosos. “As normas da DGS sobre a prevenção tardia baseiam-se nas guidelines americanas. Quando olhamos globalmente, às vezes, os prematuros mais tardios ficam um pouco esvanecidos porque são poucos em termos percentuais, mas existem estudos mais recentes que mostram que poderá haver a vantagem económica de fazer a profilaxia contra esses grupos e as normas têm de ser sempre revistas à luz da evidência que vai surgindo. Seguramente haverá a necessidade de reavaliar estas normas face às novas evidências que vão saindo na literatura e haverá um tempo em que poderão eventualmente ser modificadas.”

Como mensagem final, a presidente da Sociedade Portuguesa de Pediatria referiu que Portugal é um dos dez melhores países em saúde infantil a nível mundial. “Somos um case study os outros países não percebem como é que nós somos tão bons a vacinar e esse é um motivo de orgulho para a nossa nação.” Paula Guerra acrescentou que “nós não somos um país rico e não nos podemos dar ao luxo de errar. Temos de ter indicadores” e lançou as seguintes questões: “Quantos bebés ficam internados nas unidades de cuidados intensivos, quanto custa um bebé internado, que impacto tem ao nível social” defendendo que é fácil medir estas situações. “Houve um trabalho, o Every Newborn Action Plan, apoiado pela OMS e que defende o envolvimento dos pais nos cuidados, mas junto de quem regula, quer na DGS, nos vários grupos de trabalho, não só relativamente ao VSR mas também no que respeita a outros problemas e temas muito ligados à área da neonatologia. Um trabalho em parceria pode ajudar a definir a definição de normas e deve ser garantida a literacia.” Sublinhou ainda que é preciso confiar pois “só com uma boa comunicação e transparência a todos os níveis é que as famílias e os pais e a sociedade confiam nas decisões que são tomadas e que impactam na vida do dia-a-dia destes bebés e destas famílias”, explicou a representante da XXS.

Elsa Silva referiu a preocupação com a situação difícil vivida actualmente e que se prende com a falta de profissionais de saúde e aconselhou os pais e os pacientes a procurarem as associações. “Procurem-nos porque nós conseguimos dar apoio e dar-lhes voz. É importante trazer para estas discussões as preocupações dos pais relativamente a estas questões.” António Morais mostrou-se satisfeito por ter participado num debate de uma realidade diferente da que vive diariamente. “Aprendi bastante hoje e este debate também serve para nós termos mais atenção a este agente na SPP para o qual não estamos tão sensibilizados embora saibamos da acção que tem nesta altura do ano.” Cármen Carvalho deixou uma mensagem de esperança para os pais e para as famílias reiterando a importância da equipa, de médicos e de enfermeiros, no lema “saber mais para melhor cuidar”. Sublinhando ainda a importância da prevenção, defendeu que “o conhecimento é a base de tudo o resto e temos que confiar que a ciência está a evoluir e que Portugal tem sido bastante inovador em incluir tudo o que sejam terapêuticas relevantes”.

Para Maria João Batista, em primeiro lugar, é preciso garantir “rigor na informação que é muito baseada naquilo que conhecemos e que definimos. Portanto, o papel da DGS é essencial para definir as normas que devem ser seguidas.” Por outro lado, os pais estão muito ávidos de informação e a mesma deve ser rigorosa, coesa, clara e muito objectiva. “Os pais das nossas crianças, os nossos utentes, ouvem muito aquilo que nós transmitimos e, nós, enquanto grupo de profissionais, temos de dar muito valor à clareza da informação que partilhamos com os pais porque eles são muito receptivos e atentos.” Reforçou ainda que “mais do que grupos de risco há comportamentos de risco que têm de ser evitados. É essa a nossa obrigação para com os pais dos nossos doentes e de todas as crianças do nosso País.”

Hugo Martinho, responsável da área médica biofarmacêutica da Astrazeneca teve a seu cargo o encerramento do evento e resumiu as conclusões desta conferência. “Em suma, talvez a frase de ordem seja ‘prevenir é o melhor remédio’. Falámos muito hoje sobre aquilo que são as medidas não farmacológicas e o impacto que têm do ponto de vista do controlo, mas também as medidas farmacológicas, nomeadamente, com a imunoprofilaxia. Se prevenirmos vamos conseguir ter maiores ganhos em saúde e isso é relevante para a sociedade, para os cuidadores e, sobretudo, para os bebés”.

Se não teve oportunidade de assistir a esta conferência em directo, veja aqui: