Pedro Strecht vai liderar comissão para o estudo dos abusos de menores na Igreja

O pedopsiquiatra foi o escolhido pelos bispos portugueses para coordenar o levantamento dos abusos sexuais de menores cometidos nas últimas décadas por membros do clero. A restante equipa vai ser apresentada quinta-feira.

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Pedro Strecht é pedopsiquiatra D.R.

O médico de psiquiatria da infância e da adolescência Pedro Strecht foi o escolhido para coordenar a comissão independente que vai fazer o levantamento retrospectivo dos abusos sexuais cometidos no seio da Igreja portuguesa.

O anúncio foi feito esta terça-feira pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), devendo os restantes membros da comissão ser apresentados publicamente na próxima quinta-feira, em conferência de imprensa. Nessa altura, deverão ser igualmente conhecidas as metodologias de um trabalho que, segundo os bispos portugueses, vai arrancar já a partir do início de Janeiro. 

Com 55 anos, Pedro Strecht especializou-se no trabalho com crianças e menores em risco e integrava já a comissão diocesana de protecção de menores e adultos vulneráveis do patriarcado de Lisboa, juntamente com o antigo procurador-geral da República Souto de Moura, o ex-director nacional da PSP Francisco Oliveira Pereira, a psicóloga Rute Agulhas e o psiquiatra Vítor Cotovio, entre outros.

Integrara, antes disso, a comissão de apoio psicológico às vítimas da Casa Pia, cargo do qual viria a demitir-se, em 2005, por discordar da decisão judicial de realizar novas perícias às vítimas, cujos depoimentos foram postos em causa.

Esta Comissão Independente para o Estudo de Menores na Igreja, como se vai chamar, deverá, à partida, replicar o modo de funcionamento destas comissões diocesanas. E, apesar do pouco que se sabe ainda sobre os detalhes e o funcionamento do grupo que ficará responsável pelo levantamento histórico dos casos de abuso sexual cometidos por clérigos, o presidente da CEP, D. José Ornelas, deixou, no passado dia 11 de Novembro, em Fátima, várias garantias, nomeadamente a de que os membros da comissão gozarão de total independência

“Não vai ser a Conferência Episcopal a controlar essa comissão. Queremos que tenha credibilidade e a sua própria independência”, garantiu na altura D. José Ornelas, garantindo que a Igreja portuguesa “não tem medo, bem pelo contrário” de se confrontar com a verdade histórica, estando, aliás, “preparada para tudo” o que vier a ser encontrado, nomeadamente para a eventual descoberta de tentativas de encobrimento de tais crimes por parte dos responsáveis eclesiásticos, bispos incluídos. 

“Se houve atitudes de encobrimento no passado, vamos tratá-las também. Isso faz parte da honestidade com que temos de enfrentar isto”, acrescentou D. José Ornelas, deixando para a comissão e respectivos membros, a definição dos prazos, metodologias e do arco temporal da investigação.

O trabalho desta comissão não se resumirá à missão de apresentar à sociedade uma análise da forma como a igreja Católica em Portugal tem lidado com os abusos sexuais em ambiente eclesial. O grupo assumirá igualmente a coordenação das 21 comissões diocesanas criadas entre 2019 e 2020 por imposição do Papa Francisco para acolher eventuais denúncias bem como as respectivas vítimas. 

A criação desta Comissão Independente para o Estudo de Menores na Igreja foi anunciada pouco depois de uma investigação em França ter estimado em mais de 300 mil as vítimas de abuso sexual no seio da Igreja francesa nos últimos 70 anos, o que levou, aliás, a Igreja daquele país a admitir alienar património e contrair empréstimos para ressarcir as vítimas e de um grupo de cerca de 280 católicos portugueses ter exortado a Igreja portuguesa, cujos responsáveis sempre reduziram a dimensão do problema em Portugal a “meia dúzia de casos”, a seguir-lhe o exemplo.

"Apelamos veementemente à CEP que se alinhe com as orientações do Papa Francisco e tome, com carácter de urgência, a decisão de lançar uma investigação nacional rigorosa, abrangente e verdadeiramente independente, com o arco temporal de 50 anos”, lia-se na carta aberta endereçada no início de Novembro ao presidente da CEP.

No documento, figuras como a escritora Alice Vieira, o magistrado do Ministério Público Rui Cardoso, a escritora Margarida Pereira Müller, o jornalista Jorge Wemans, André Folque, membro da Comissão de Liberdade Religiosa, e André Lamas Leite, advogado e colaborador da pastoral penitenciária, entre outros, diziam-se preocupados com o “quadro de intranquilidade pública” instalado em Portugal, que consideravam potenciador de “sentimentos anti-eclesiais” e capaz de “acelerar o afastamento das pessoas da vida religiosa e de degradar a relação da sociedade com a Igreja”. 

Posteriormente, e apesar de satisfeitos com a anuência dos bispos ao pedido, alguns dos signatários da carta disseram recear que a sua independência não esteja assegurada, nomeadamente pelo facto de esta comissão vir a funcionar no seio da Igreja, arriscando-se assim a não passar de um mero “sucedâneo organizativo das comissões diocesanas”. 

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