ONU ignorou pedido de imagens de satélite feito pelas vítimas da explosão no porto de Beirute

Ordem dos Advogados de Beirute, que representa quase 2000 famílias, escreveu três vezes ao secretário-geral, António Guterres, e continua à espera de resposta. Informações pedidas seriam determinantes na investigação à explosão.

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A explosão que destruiu parte de Beirute foi uma das mais potentes explosões não nucleares EPA/WAEL HAMZEH

As Nações Unidas ignoraram repetidamente pedidos de informações para ajudar na investigação oficial à explosão do porto de Beirute por parte de familiares de vítimas, denuncia a BBC. A explosão de 4 de Agosto do ano passado provocou 218 mortos, mais de 6500 feridos, 300 mil deslocados e a destruição generalizada da capital libanesa.

A investigação tem enfrentado atrasos, conflitos e recriminações, enquanto as famílias e os sobreviventes continuam à espera de saber se a culpa tem rosto, descreve Anna Foster, correspondente da emissora pública britânica para o Médio Oriente. O inquérito foi suspenso várias vezes por causa das queixas de dirigentes políticos chamados a testemunhas e de um protesto contra o juiz que encabeça a investigação, Tareq Bitar, provocou confronto violentos e terminou com sete mortos.

A disputa dividiu o novo Governo, que está há um mês sem se reunir, enquanto a crise económica e social só se torna mais aguda, e a falta de progressos no inquérito tem gerado muitas críticas internacionais. Mas uma entidade vital que poderia ter ajudado a fazer avançar a investigação ignorou os pedidos nesse sentido: as Nações Unidas. Uma semana depois da explosão, a própria ONU pediu “uma investigação rápida e independente que permita justiça e responsabilização”.

Só que segundo a BBC, confrontada com pedidos de informações para ajudar nessa investigação, a ONU não respondeu.

O presidente da Ordem dos Advogados de Beirute, que representa quase 2000 famílias de vítimas e sobreviventes na investigação, enviou três cartas diferentes directamente ao secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, com dois pedidos: em primeiro lugar, a associação pedia todas as imagens de satélite tiradas no dia da explosão pelos países membros; em segundo, perguntava se a UNIFIL (a missão da ONU no país) tinha verificado o navio de carga MV Rhosus, que carregava o material que provocou a gigantesca explosão, em 2013, antes de este chegar ao porto de Beirute com a sua carga de nitrato de amónio.

“Até hoje não sabemos o que causou a explosão, não sabemos se foi intencional, não sabemos se foi por negligência, não temos ideia”, diz à BBC Aya Majzoub, investigadora libanesa da organização Human Rights Watch. “Por isso, as imagens de satélite do porto naquele dia seriam muito importantes para tentar responder a várias perguntas”, explica.

A primeira das cartas enviadas em nome das famílias tem data de 26 de Outubro de 2020. Três semanas depois, seguiu um novo pedido, onde se notava que “passaram mais de 100 dias desde a explosão e até agora nenhum estado membro nem a UNIFIL enviou quaisquer fotografias ou informação”. Na terceira carta, de 17 de Março de 2021, lê-se: “Sete meses passaram desde a explosão e cinco desde a nossa carta, infelizmente as nossas cartas continuam sem resposta e sem sequer serem reconhecidas. O Líbano é um membro fundador da ONU e está a pedir ajuda”.

Questionado pela BBC, o gabinete do secretário-geral disse que a ONU está empenhada em apoiar o Líbano e mobilizada para ajudar as vítimas, mas não explicou por que é que estas cartas e estes pedidos ficaram sem resposta.

Segundo Aya Majzoub, é provável que “o secretário-geral esteja inundado de cartaz e pedidos, mas é uma desilusão ver a falta de cooperação com as autoridades libanesas”. A investigadora considera igualmente desapontante “a ausência de uma investigação internacional à explosão”, defendendo que “há muito que a comunidade internacional podia estar a fazer”.

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