EUA põem empresa israelita do programa Pegasus em lista negra comercial

Venda de programa de espionagem pela NSO a governos que o utilizaram contra activistas pró-democracia, jornalistas e outros é “contrária à política externa e interesse nacional dos EUA”.

Foto
Logotipo da empresa israelita NSO AMIR COHEN/Reuters

Os EUA decidiram esta quarta-feira incluir a empresa israelita NSO, do programa de espionagem Pegasus, numa lista negra de comércio, dizendo que a empresa tem tido acções “contrárias à política externa e ao interesse nacional dos EUA”, cita o jornal britânico The Guardian.

O programa Pegasus foi usado por governos para espiar activistas pró-democracia, jornalistas, e num caso até para espiar a ex-mulher do xeque do Dubai, segundo a investigação de um consórcio de jornalistas com apoio da Amnistia Internacional que fez a verificação de rasto de uso do programa em alguns telefones encontrados numa lista da NSO. A NSO nega que os telefones na lista estivessem a ser vigiados, e tem defendido que apenas permite o uso do software para operações antiterrorismo ou de luta contra criminalidade grave organizada.

A inclusão numa lista negra dos EUA é um duro golpe. Primeiro, porque quer dizer que as exportações de congéneres norte-americanas estão restritas, dificultando, por exemplo, a venda de informação sobre vulnerabilidades de computadores. Poderá ainda impedir a empresa de usar sistemas de cloud das americanas Amazon ou Microsoft.

Os fornecedores precisarão de uma licença para fazer a venda, e esta será, provavelmente, negada, diz a Reuters.

Segundo, “o impacto é mais alargado do que a proibição legal”, afirmou ao Washington Post Kevin Wolf, advogado de comércio internacional da empresa Akin Gump. É um enorme sinal de alerta sobre a empresa, sublinhou.

O antigo relator especial da ONU David Kaye, que tem defendido mais restrições a vendas de tecnologia de espionagem, também nota efeitos práticos e simbólicos nesta decisão. “Quem é que vai querer trabalhar com uma empresa que foi sancionada de modo tão publico pelo governo americano?”, perguntou. “Quem investiria numa empresa com uma marca destas?”

O Departamento do Comércio afirmou, em comunicado, que a acção faz parte do esforço da Administração do Presidente, Joe Biden, “de pôr os direitos humanos no centro da política externa dos EUA, incluindo trabalhar para impedir a proliferação de ferramentas digitais usadas para repressão”.

Kaye elogia este esforço, e diz ainda que este pode ter alguma influência na relação entre os EUA e Israel. Nnas últimas semanas os EUA adiaram, aparentemente, uma decisão que poderia ser prejudiciais ao Governo de Naftali Bennett – a abertura de um consulado em Jerusalém para as questões palestinianas – mas criticaram mais duramente um anúncio de construção de colonatos judaicos em território ocupado feito pelo Executivo israelita.

“O grupo NSO não poderia ter operado sem o conhecimento, e tolerância, do Governo israelita, ou até o seu encorajamento”, nota o responsável. Por isso, isto não pode ser visto só como uma afirmação do governo americano a uma empresa particular, é também uma declaração sobre o governo israelita, e a sua participação em repressão transnacional.”

O jornal hebraico Haaretz, que também fez parte do consórcio, notava como números de telefone húngaros e indianos apareceram nas listas depois de avanços diplomáticos entre os dois países e Israel. A empresa – que como produzia tecnologia considerada militar era sujeita a controlos especiais do ministério israelita dos Negócios Estrangeiros  tinha, no entanto, um limite: não permitia nunca espiar números americanos.

Além de jornalistas e activistas em países como a Hungria e a Índia, o software foi encontrado em telefones de políticos, como o de um antigo ministro francês do Ambiente. Suspeita-se que até o Presidente francês, Emmanuel Macron, possa ter sido espiado.

Um porta-voz da NSO disse que a empresa estava “consternada” com a decisão, já que as suas tecnologias “apoiam os interesses e políticas de segurança nacional dos EUA através da prevenção do terrorismo e do crime”, e por isso iria defender que a decisão fosse “revertida”.

Sugerir correcção
Comentar