Investigação liderada por português descobre que proteína cerebral atrasa “origem” de Alzheimer
Para os autores do estudo, a descoberta tem implicações na doença de Alzheimer, uma vez que “o aparecimento de sintomas cognitivos e demência estão associados aos danos causados pelos agregados da proteína tau e à disseminação da patologia para múltiplas regiões do cérebro”.
Uma equipa internacional de cientistas liderada pelo português Cláudio Gomes descobriu que uma proteína abundante no cérebro humano atrasa a formação de depósitos tóxicos que estão associados à doença de Alzheimer.
A descoberta, publicada esta segunda-feira na revista científica Nature Communications, revela que a proteína S100B actua sobre a proteína tau, “cuja deposição tóxica no cérebro está associada a várias demências e à fase de agravamento da doença de Alzheimer”, refere em comunicado a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), onde lecciona Cláudio Gomes, coordenador do trabalho feito com culturas de células de bactérias que foram modificadas geneticamente para expressar ambas as proteínas humanas produzidas em laboratório.
“Investigámos a formação de agregados da proteína tau ao longo do tempo e observámos que a mesma é atrasada na presença da proteína S100B”, acrescenta na mesma nota o primeiro autor do estudo, Guilherme Moreira, estudante de doutoramento em Bioquímica na FCUL, sob orientação de Cláudio Gomes.
Para os autores do estudo, a descoberta tem implicações na doença de Alzheimer, uma vez que “o aparecimento de sintomas cognitivos e demência estão associados aos danos causados pelos agregados da proteína tau e à disseminação da patologia para múltiplas regiões do cérebro”.
“Este estudo desvenda um novo mecanismo biológico de protecção, relevante nas fases iniciais da doença, e que se torna ineficiente ao longo do tempo com o crescente acumular de agregados tóxicos no cérebro”, assinala Cláudio Gomes.
À Lusa, o investigador do Instituto de Biossistemas e Ciências Integrativas da FCUL adiantou que “a hipótese” em que a equipa tem “vindo a trabalhar” é de que a proteína S100B terá funções protectoras contra a agregação de proteínas na fase que antecede o aparecimento de sintomas da doença, mas na qual “ocorrem já alterações nas células” cerebrais (neurónios) e “acumulação de depósitos” de proteínas “como parte da resposta inflamatória precoce”.
A função protectora da S100B será inactivada “na fase sintomática, tardia” da doença, quando aumenta a acumulação tóxica de proteínas, passando a função da S100B como “mediador pró-inflamatório” a ser preponderante. “A S100B é uma proteína multifuncional, que se sabe desempenhar funções protectoras e agravantes, sobretudo na resposta neuro-inflamatória”, sublinhou Cláudio Gomes.
Os autores do trabalho esperam que a compreensão do funcionamento, e do efeito protector, de proteínas como a S100B possa servir de base ao desenvolvimento de medicamentos com “potencial terapêutico”, que actuem de forma semelhante.
A doença de Alzheimer é a forma mais comum de demência que causa danos progressivos e irreversíveis em diversas funções cognitivas, como memória, atenção, concentração, linguagem e pensamento.
Segundo Cláudio Gomes, nesta doença há “alterações bioquímicas” que “promovem a libertação da proteína tau nos microtúbulos, estruturas que mantêm a arquitectura dos neurónios”, desencadeando a agregação. “Estes depósitos de proteína tau são tóxicos e matam os neurónios, sendo também libertados para o exterior das células, disseminando a patologia às células vizinhas”, frisou o investigador.
Na investigação estiveram ainda envolvidos cientistas do I3S - Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto, da Universidade de Lille, em França, da Universidade de Hohenheim, na Alemanha, e da Universidade do Texas, nos Estados Unidos.