Global Ethics Day: Para celebrar a importância de se falar de ética
As verdadeiras decisões éticas são complexas e, pior que isso, muitas vezes invisíveis aos nossos olhos. Muitas vezes agimos sem nos darmos conta.
Dan Ariely, professor de Psicologia e Economia Comportamental, tem dedicado a sua vida a tentar perceber o que nos faz pessoas mais ou menos honestas. Para isso realizou experiências que já envolveram dezenas de milhares de pessoas em universidades como o MIT, Harvard, Princeton ou Duke, nos EUA. Em todas, colocou alunos em situações em que lhes era fácil “fazer batota” e obter benefícios pessoais sem serem apanhados, registou a média de alunos que se aproveitavam da situação e, a partir dai, começou a introduzir variantes para analisar as que tinham efeito no comportamento.
Verificou então que quando, imediatamente antes da experiência, pedia aos alunos que assinassem uma declaração com o compromisso de responder de acordo com os valores expressos no código de ética da instituição, o número de “batotas” diminuíam drasticamente... Mesmo quando a organização não tinha código.
Esses resultados levaram-no a concluir que “lembrar padrões de moral no momento da tentação pode ser muito eficaz para a diminuição do comportamento desonesto e até evitá-los completamente”. A dificuldade está no facto de que, na vida real, ao contrário das experiências programadas é muito difícil saber qual é o momento da tentação, por isso, a única coisa que podemos fazer é lembrar “padrões morais” falar de ética tendencialmente todos os dias. E é esse o objectivo do Global Ethics Day, que se celebra em todo o mundo desde 2014 por iniciativa do Carnegie Council: relembrar a importância de se falar de ética.
Falar de ética não é necessariamente falar de algo com esse nome, pode ser falar sobre decisões difíceis, sobre o que as torna difíceis, falar do que se considera ou não aceitável na organização, avaliar o clima ético. Esta avaliação é fundamental porque muitas vezes as más práticas não são o resultado do comportamento de uma pessoa (bad apple), mas sim fruto de um meio que as incentiva (bad basket) e que pode ser visível, por exemplo, em chefias que premeiam bons resultados ainda que tenham sido conseguidos de forma menos correcta.
Outro aspecto que torna muito importante o falar de ética e que dá relevância a dias como este é o mito de que é fácil ser ético.
De facto, muitos de nós, e com razão, consideramos que os valores que nos foram transmitidos pelos nossos pais ou pelo nosso meio são a base da nossa actuação e que se os seguirmos tomaremos sempre a decisão certa. Mas as verdadeiras decisões éticas são complexas e, pior que isso, muitas vezes invisíveis aos nossos olhos. Muitas vezes agimos sem nos darmos conta.
Agir eticamente implica, em primeiro lugar, ser capaz de “ver” e esse é um aspecto em que podemos ser ajudados, onde falar sobre ética nos pode ajudar a colocarmo-nos nos sapatos do outro e ver aspectos que antes não tínhamos reparado, onde vemos um seis outro vê um nove e que o número que vemos desenhado pode ser um ou o outro, ou os dois.
Ser ético, para além de “ver”, implica ser capaz de tomar a decisão, de olhar para cada questão sobre vários aspectos e tomar decisões que podem ser incómodas a curto, médio ou às vezes a longo prazo; implica gerir valores e interesses conflituantes: ser leal a uma organização ou ser leal a uma pessoa. Também aqui na tomada de decisão, usufruir de espaços de reflexão é muito importante, é a possibilidade de expressar medos, dúvidas vulnerabilidades.
E é para lembrar tudo isso que existe o Global Ethics Day.
É muito importante criarmos organizações em que estes espaços possam existir, a todos os níveis. Diversas empresas multinacionais estão a estimular, por exemplo, a criação de grupos informais entre gestores de topo essencialmente para permitir a partilha de dúvidas em termos de tomada de decisão em aspectos que de alguma forma tenham carácter ético.
É um passo muito importante: assumir que a dúvida ultrapassa o “doing the things right” da eficácia e da qualidade, passa pelo “doing the right things” do cumprir um código e agir de acordo com o nosso propósito e os nossos valores, e pode chegar à questão perturbadora que surge nas grandes decisões e que é “what are the right things”, para a qual falar pode ser fundamental.
Como é referido pelos promotores, “o Global Ethics Day oferece uma oportunidade de explorar o significado da ética na vida diária”. Concretizando mais, é uma oportunidade para as organizações falarem de ética, para a assumirem como um tema complexo, nem sempre com resposta seguras de “certo” ou “errado” e abrirem as portas à reflexão de forma mais permanente.